27 março 2011

“Los hermanos”, 20 anos depois

Vinte anos depois daquilo que se considera a certidão de nascimento do Mercosul (o Tratado de Assunção, de 26 de março de 1991), a integração regional promovida pelo bloco mostrou-se benéfica. O principal saldo não é apenas econômico, mas político, social e cultural.

Artigo de Antonio Lassance, pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e professor de Ciência Política. 
As opiniões expressas neste artigo não refletem necessariamente opiniões do Instituto.
Publicado também na Carta Maior, 27/03/2011.

Vinte anos depois daquilo que se considera a certidão de nascimento do Mercosul (o Tratado de Assunção, de 26 de março de 1991), a integração regional promovida pelo bloco mostrou-se benéfica. O principal saldo não é apenas econômico, mas político, social e cultural.

Mesmo sujeito a idas e vindas, o Mercosul atravessou turbulências e manteve-se como um caso de sucesso. Resistiu a crises internacionais graves, como as de 1999 a 2002 (quando o comércio entre os países do bloco reduziu-se à metade, em relação a seus valores de 1997) e a mais recente e maior delas, de 2008. Foi abalado por situações de profunda instabilidade. A principal atingiu o governo de Fernando de la Rúa, na Argentina, como efeito retardado do desmonte do Estado, privatização e desindustrialização provocados pelo governo de Carlos Ménem, combinados à atrapalhada saída brasileira do regime de paridade do dólar e câmbio fixo, no governo FHC.

Surgido na esteira de um processo de aproximação entre Brasil e Argentina, seus dois maiores países, o Mercosul era também uma resposta à União Europeia, ao Nafta (bloco que reúne Estados Unidos, Canadá e México) e à APEC (“Asia-Pacific Economic Cooperation” ou Cooperação Econômica da Ásia e do Pacífico).

A arquitetura da amizade impulsionada com o Mercosul é tratada como um caso exemplar pelo especialista em relações internacionais, Charles Kupchan (da Universidade de Georgetown), em seu recente livro “Como inimigos se tornam amigos” (1). Ele dedica parte do quarto capítulo de seu livro (págs. 122 a 130) a mostrar como se deu a reaproximação entre Brasil e Argentina, nos anos 1980, e que atraiu, nos anos 1990, Paraguai e Uruguai .

Kupchan enquadra o exemplo sulamericano em algumas lições essenciais. Por exemplo, a de que o mundo hobbesiano da competição interestatal, onde impera o dedo no olho e os golpes abaixo da linha de cintura, pode até ser um ponto de partida para a análise das relações internacionais, mas não precisa ser necessariamente seu ponto de chegada. A competição pode ser superada por arranjos sustentáveis cooperativos, em que antigos inimigos passam a se tratar como atores confiáveis.

A segunda lição é a de que a mão invisível do liberalismo é incapaz de produzir tal arquitetura por geração espontânea. Ela deve ser induzida por projetos nacionais e tudo deve começar com um dos atores, em geral o de maior peso, dispondo-se a fazer concessões. É a diplomacia que impulsiona a economia, e não o contrário. Ela constrói o ambiente que produz saldos comerciais e financeiros positivos no longo prazo, facilita a inserção de empresas e enraíza a interdependência econômica.

Uma terceira lição é a de que as ordens sociais entre os países devem se tornar cada vez mais compatíveis, harmônicas. Ordens instáveis e incompatíveis entre si são um fator inibidor do entendimento.

Kupchan destaca ainda, no caso sulamericano e em outros, que o fundamental nos processos de integração é o surgimento de uma identidade entre os países que supere as rivalidades reinantes. O trânsito de pessoas, o entrosamento cultural, a familiaridade com a paisagem dos vizinhos são um ingrediente dos avanços.

Neste sentido, os sinais do Mercosul são muito promissores. O volume do comércio entre os países do bloco (hoje em torno de US$ 30 bilhões por ano) tem crescido , embora percentualmente ao PIB tenha ocorrido uma estagnação momentânea. A situação se explica, estruturalmente, pela assimetria entre os países e, conjunturalmente, pela estratégia de seus países no sentido de diversificarem seus parceiros e não se atrelarem exclusivamente a alguns poucos(2).

Certos números são surpreendentes. Em quatro anos (2006 a 2009), o número de brasileiros que estudam a língua espanhola saltou de um para mais de cinco milhões (dados do Instituto Cervantes). A razão foi a lei sancionada pelo então presidente Luiz Inácio Lula da Silva, em 2005, que obrigou a oferta do Espanhol no ensino médio.

Praticamente um em cada cinco turistas que visitam o Brasil é argentino. Em contrapartida, em 2010 quase dobrou a quantidade de brasileiros que visitaram a capital portenha.

Os turistas vindos do Mercosul representam 70% do fluxo receptivo do Uruguai, 30% do fluxo receptivo da Argentina, mesmo patamar do Brasil, sendo baixo apenas no Paraguai (pouco mais de 10%) (3).

O projeto de integração é um desafio de grande envergadura e tem obstáculos consideráveis. Grande parte deles é resultante de seus pecados originais. A vertente comercial tornou-se hipertrofiada ao longo de 20 anos, enquanto persiste um déficit de participação democrática e representação política, com um Parlasul que ainda está por se estruturar plenamente. O Brasil, infelizmente, tem negligenciado e protelado esse passo.

Por outro lado, a entrada da Venezuela, que significaria a expansão do mercado comum, tem sido sistematicamente adiada pelo Paraguai, com argumentos que não convencem sequer os opositores venezuelanos do presidente Hugo Chávez, que defendem a entrada de seu país no bloco.

Nos últimos anos, uma agenda intensa de políticas públicas tem se construído setorialmente, nas áreas da agricultura familiar, desenvolvimento social, educação, saúde, infraestrutura, turismo, segurança e defesa, dentre outras. Isso permite vislumbrar ações que contribuam para eliminar a pobreza, reduzir as assimetrias existentes, construir uma infraestrutura que permita ampliar o comércio na região e aprofundar a democracia, desafios destacados recentemente pelo embaixador Samuel Pinheiro Guimarães, Alto Representante-Geral do Mercosul (Agência Senado, 24/3/2011).

No momento atual, o Mercosul reúne mais razões de otimismo que os demais blocos. A União Europeia, sob crise aguda, vive um de seus piores momentos. O Nafta acentou os problemas da economia mexicana (o comércio que mais cresce com seu vizinho, do outro lado do Rio Grande, é o de drogas), e os Estados Unidos patinam para superar a recessão. A APEC, além de muito heterogênea e pouco institucionalizada, pouco avançou diante da competição entre seus países, que disputam muitas vezes o mesmo espaço. A China, por exemplo, tem crescido, além de seus méritos próprios, sobre um declínio relativo do Japão.

Há 20 anos, quem seria capaz de dizer que se chegaria tão longe?

Referências:

(1) ”KUPCHAN, Charles A. How Enemies Become Friends. Princeton: Princeton University, march 2010)

(2) SOUZA, André de Mello e Souza, OLIVEIRA, Ivan Tiago Machado e GONÇALVES, Samo Sérgio. Integrando desiguais: assimetrias estruturais e políticas de integração no Mercosul. Rio de Janeiro: IPEA, março de 2010. Texto de Discussão no. 1477.

(3) TOMAZONI, Edegar Luis. Turismo como Desafio do Desenvolvimento Econômico do Mercosul na Era da Globalização. Caxias do Sul: Universidade de Caxias do Sul, 2008.




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21 março 2011

As eleições de 2010 e o novo quadro partidário

"A presidência é o ponto mais importante do sistema político brasileiro". "O entendimento da evolução do quadro partidário nacional deve partir desta constatação. As eleições presidenciais organizam e estruturam as demais disputas. É o prêmio principal; os demais são subsidiários".
(Fernando Limongi e Rafael Cortez).

"O quadro partidário nacional é bem mais simples e inteligível do que as análises centradas nas disputas proporcionais deixam entrever".
"As eleições presidenciais têm se resumido a uma disputa entre PT e PSDB. Nenhuma candidatura alternativa foi capaz de ameaçar o controle desses partidos sobre a maioria dos
eleitores. A estruturação das eleições presidenciais repercute sobre as disputas pelos governos estaduais, fazendo com que estas obedeçam à mesma clivagem básica. A estratégia dos partidos, negociando o lançamento e a retirada de candidaturas, é a chave para se entender a dinâmica da competição eleitoral no Brasil".


Leia o artigo completo dos professores Fernando Limongi e Rafael Cortez.


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18 março 2011

Parlasul pode inovar em regras de reforma política

Projeto que tramita no Congresso prevê voto em lista partidária e alternância por região e gênero.
Se encabeçada por um homem, de uma região do País, o segundo da lista será mulher, de uma outra região.

Projeto (PL 5279/09) determina que eleição direta para o Parlasul, em 2014, seja feita por lista fechada. O pleito deve ocorrer simultaneamente com a escolha de presidente, governadores, senadores e deputados federais, estaduais e distritais.

Pelo projeto, do deputado Carlos Zarattini, do PT paulista, cada partido ou coligação vai registrar uma lista de candidaturas no Tribunal Superior Eleitoral.

No horário eleitoral gratuito, no rádio e na TV, serão acrescentados mais cinco minutos para a divulgação das propostas dos candidatos ao Parlasul. Pelo texto, quem se candidatar ao Parlamento do Mercosul não poderá concorrer ou exercer cargos no Executivo ou no Legislativo brasileiro.

O relator, deputado Dr. Rosinha, do PT do Paraná, explica que as listas de candidatos levariam em conta critérios de gênero e de região.

"Nós propusemos que a eleição seja de caráter nacional. Seja em lista partidária e que, nos dez primeiros da lista, seja alternado um de cada região do país. E alternado na questão de gênero. Se encabeçada por um homem, o segundo da lista será uma mulher e de uma outra região do país. Eu vejo que isso é importante porque nós vamos garantir a representação de ambos os sexos. E vamos garantir a representação de todas as regiões brasileiras. Porque se é Mercosul, é o Brasil todo. E o Brasil todo tem de tomar conhecimento do que ocorre no Mercosul."

Dr. Rosinha ressaltou, no entanto, que antes da eleição direta, o Congresso Nacional terá de escolher indiretamente 37 representantes brasileiros do Parlasul. Ele lembra que, desde o final de dezembro, o Brasil não tem nenhum representante no Parlamento do Mercosul.

Otimista, Dr. Rosinha acredita que a escolha de 27 deputados e 10 senadores será feita até abril. Para tanto, o Congresso Nacional precisa aprovar um projeto de resolução, já referendado pela Mesa da Câmara, e que deve passar também pela Mesa do Senado.

Fonte: Rádio Senado.
Repórter: Paulo Roberto Miranda.
Ouça o áudio da entrevista do relator do Projeto, Dr. Rosinha.


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17 março 2011

América do Sul, espaço estratégico da atuação do Brasil

Processo de integração regional impulsiona transição do conceito de América Latina para a noção estratégica de América do Sul, uma vez que esta consolidou-se como espaço prioritário da política externa brasileira.

O artigo é dos pesquisadores do IPEA André Calixtre e Pedro Barros, Integração sul-americana, além da circunstância: do Mercosul à Unasul
Além de uma análise do momento atual da política externa brasileira em relação à América do Sul, avalia as chances da Unasul significar um avanço no processo de integração regional, para além do paradigma livre-cambista dos anos 1990. 


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15 março 2011

Brasil em Desenvolvimento: Estado, Planejamento e Políticas Públicas (vol. 2)

O volume 2 da obra Brasil em Desenvolvimento: Estado, Planejamento e Políticas Públicas, volume 2 (versão 2010) traz análises da inserção do Brasil no mundo e balanços de políticas setoriais.


PARTE II
REDEFININDO ESTRATÉGIAS SETORIAIS PARA O DESENVOLVIMENTO
 
SEÇÃO III
Implementação e Resultados Recentes de Políticas Setoriais
 
Capítulo 8Políticas de Desenvolvimento Econômico no Brasil: impactos de políticas selecionadas de incentivo à inovação e exportação
 
Capítulo 9Políticas de Ciência, Tecnologia e Inovação no Brasil: uma análise com base nos indicadores agregados
 
Capítulo 10Política de Comercialização Agrícola no Brasil
 
Capítulo 11A Ocupação no Setor Turismo e sua Evolução: um panorama do Brasil e regiões
 
SEÇÃO IVInfraestrutura para o Desenvolvimento
 
Capítulo 12Qualidade Regulatória e Fortalecimento do Estado e das Instituições: o papel da análise de impacto
 
Capítulo 13Uma Análise do Transporte Terrestre de cargas Brasileiro
 
Capítulo 14Transposição do Rio São Francisco: Análise de oportunidade do projeto
 
Capítulo 15Acessibilidade no Transporte de Passageiros: um panorama da política pública federal
 
PARTE III
O BRASIL NO MUNDO: ECONOMIA E RELAÇÕES INTERNACIONAIS
 
SEÇÃO V
Cooperação para o Desenvolvimento e Comércio: o multilateralismo em ação
 
Capítulo 16A Integração Sul-americana, Além da Circunstâcia: do Mercosul à Unasul
 
Capítulo 17As Negociações Internacionais sobre as Mudanças Climáticas: avanços recentes e o papel brasileiro
 
Capítulo 18Aspectos da Presença Brasileira no Haiti após a Minustah: a paz por meio do desenvolvimento
 
Capítulo 19Desempenho das Exportações e Política Comercial

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13 março 2011

A política da fome e da miséria

Em tempos de desordem financeira, os EUA assistiram a um grande aumento de sua desigualdade social. Enquanto isso, o touro de Wall Street guarda as portas de seu moinho satânico não só com seus chifres, mas sobretudo com mão de vaca. Muitos americanos não estão comendo sequer o pão que o diabo amassou.  

Artigo de Antonio Lassance, publicado na Carta Maior.

Em tempos de desordem financeira, os Estados Unidos assistiram a um grande aumento de sua desigualdade social, a partir da crise de 2008 e 2009. O reflexo mais dramático dessa queda ladeira abaixo foi o crescimento da miséria, da insegurança alimentar e da própria fome.

Gráfico mostra evolução comparativa
da desigualdade nos EUA, em comparação com outros países. 
Fonte: Economist. Clique na figura para ampliar.

Em 2008, houve um crescimento de 40% no número de pessoas em situação de elevada insegurança alimentar. O contingente de cerca de 6,7 milhões de lares corresponde a algo em torno de 5,7% da população. Pode parecer pequeno, mas o aumento foi o maior dos últimos 15 anos (dados do Census Bureau, 2010). Some-se a este contingente mais 23,5% de lares que vivem em insegurança alimentar em menor escala, mas mesmo assim são afetados. Ao todo, de cada 10 famílias, quase 3 estão em condição de pobreza e correm o risco de não ter o suficiente para se alimentar.

Em 2007, havia 37.3 milhões de americanos pobres. Em 2008, o número saltou para 39,8 milhões (13,2% da população). Em 2009, atingiu 43,6 milhões (14,3%). É mais que um Sudão, mas até agora ninguém apareceu com aquele tipo de ironia tantas vezes usada no Brasil, que já foi apelidado de Belíndia (mistura da Bélgica em que viviam alguns, em contraste com a Índia para a maioria - numa época em que ser Bélgica parecia mais promissor, o que não é mais o caso) ou de Ingana (os ricos viviam numa Inglaterra, mas a maioria, numa Gana). Abrigar um contingente de pobres do tamanho de um Sudão, imagina-se, transformaria os USA num Usadão.

Ainda conforme dados do Census Bureau, uma em cada 5 crianças vive na pobreza, metade delas na miséria.

As faixas de maior incidência de pobreza têm origem hispânica, seguida dos negros, mas a queda mais abrupta verificada após a crise se deu entre os brancos. Eram pessoas da classe média que, repentinamente, viram-se no olho do furacão da crise financeira de 2008-2009, perderam suas casas, seus empregos, seu padrão de vida e passaram a viver sob condições precárias. Gente que nunca esteve em situação tão crítica.

O impacto psicológico e político de tal desgraça social é fermento para pregações que, na melhor das hipóteses, falam em resgatar a classe média. Todavia, tem crescido, e muito, o bombardeio ideológico dos apóstolos do modo de vida tradicional americano. São aqueles que defendem a volta de um país que se foi - na verdade, que nunca existiu, a não ser para uma minoria. Um saudosismo de “E o vento levou”, orgulhoso de suas raízes nativas e de um passado mitificado.

O reacionarismo da ultradireita estadunidense se nutre do escárnio aos imigrantes; do ódio aos que chegaram para realizar trabalhos desprezados e mal remunerados; da repulsa aos que, muitas vezes, fugiram de seus países na tentativa de escapar das consequências de crises sistêmicas do capitalismo, ou de guerras cuja extrema pobreza de seus combatentes sempre contrastou com o exímio poderio armado pago com ouro, diamantes, petróleo.

A crise agravou, mas não criou a decadência do padrão de vida dos americanos. Uma longa transformação estrutural tem levado alguns de seus ícones à bancarrota ou a sérias dificuldades. Foi o caso, em várias ocasiões, das montadoras Chrysler, GM e Ford; e de algumas instituições financeiras tradicionais, como o Bank of America, o Citibank e daquela que se tornou o símbolo da crise, a holding sesquicentenária Lehman Brothers. Uma parte da economia americana desapareceu. Outra parte mudou-se para a China, a Índia, a Malásia. A tão propalada globalização, que afetou tantos países pobres e em desenvolvimento, também fez seu estrago dentro dos EUA.

Mas existe um ingrediente essencialmente político na decadência americana. Há pelo menos 30 anos, o padrão de vida norte-americano vem caindo de maneira consistente. No livro “Democracia desigual: a economia política da nova era dourada” (“Unequal democracy: the political economy of the new gilded age”), o cientista político Larry Bartels, da Universidade de Princeton, mostra que a pobreza tem aumentado mais, e a desigualdade, muito mais, durante os governos republicanos. Com os democratas, o prejuízo é menor, embora insuficiente para reverter a tendência pavimentada por seus adversários.

Bartels atribui às políticas econômicas adotadas um grande peso no aprofundamento do abismo entre os absurdamente ricos e os absolutamente pobres. O professor analisa a velha e reiterada fábula dos republicanos sobre as benesses que adviriam ao se diminuir drasticamente a carga de impostos dos muito ricos e suas empresas. A promessa é que, ao permitir a supercapitalização dos grandes agentes econômicos, estes propiciariam a criação de milhões de novos empregos. Ao contrário, os dados permitem verificar, em diferentes períodos, que os republicanos venderam e não entregaram o que apregoavam.

Outra referência que vai na mesma linha são os professores Jacob Hacker e Paul Pierson, autores de “A política onde o vencedor leva tudo: como Washington tornou os ricos mais ricos e virou as costas para a classe média” (“Winner-take-all politics: how Washington made the rich richer - and turned its back on the middle class”).

Nos últimos 30 anos, a distância entre ricos e pobres aumentou. Normalmente, os acusados são apenas suspeitos externos ou intangíveis - digamos, por exemplo, o senhor Comércio Exterior, a senhora Globalização Financeira, a madrasta Mudança Tecnológica, mais recentemente, uma malvada que atende pelo nome de China. Pois bem, segundo os autores, o responsável direto pelo problema tem nome e endereço. É filiado a um dos dois grandes partidos e pode ser encontrado em Washington. Responde pela política e pelas políticas públicas.

A política não cria ricos e pobres, mas tem defendido com unhas e dentes quem menos precisa, quem tem mais recursos, deixando os pobres e a classe média em desamparo.

Para Hacker e Pierson, o sistema político nos EUA foi "sequestrado" pelas grandes corporações e pelos grandes financistas. Avaliam que a intensificação desses laços pode ser traçada por volta dos anos 1970 (Governo Nixon). Mesmo as administrações do Partido Democrata não foram capazes de reverter a trajetória conservadora consagrada definitivamente por Reagan e continuada pela família Bush.

A influência do “grande negócio” (“big business”) foi embrulhada para presente por ideólogos conservadores. A grande imprensa a eles confere um tratamento ao estilo Poliana, generosamente apelidando-os de “especialistas” ou “técnicos”, omitindo que muitas de suas conclusões vêm de estudos e pesquisas financiados por corporações privadas. Estas pagam seus salários em “think tanks”, instituições que reúnem pesquisadores diretamente orientados a fazer lobby (ou mesmo “guerra”, para justificar a expressão “tank”) em favor de determinadas políticas públicas, ou que financiam suas consultorias.

Acostumados a um arraigado liberalismo e experimentando um conservadorismo rompante, os americanos são aturdidos com a volta de teses desbotadas e teimosas, como a de que as pessoas são pobres por razões individuais ou culturais. São pobres porque querem, acredite se quiser. Ou simplesmente porque não sabem como livrar-se da miséria. Têm uma cultura da pobreza, caem em armadilhas, por conta própria desestruturam suas vidas, pensam da forma errada. Um artigo do New York Times, meses atrás, registrou o retorno dessa velha e carcomida tese com a euforia de um agora-vai, ou tá-na-hora-dos-“perdedores”-acreditarem-nisso. Algo não muito diferente do que se vê aqui em livros como “A cabeça do brasileiro”, do sociólogo Carlos Alberto Almeida.

Nos EUA, os governos estão refazendo sua cartografia da fome. Só na cidade de Nova York, cerca de 20% das famílias passam por algum tipo de privação. A ong Coalizão Novaiorquina Contra a Fome, que distribui sopa (ao estilo do que fazia o Exército da Salvação, nos anos 30), mas que discute o problema também politicamente, apresenta dados segundo os quais o berço de Wall Street é o lugar com as áreas mais famintas dos EUA. A Senadora do Estado de Nova York, Kirsten Gillibrand (democrata progressista, “pero no mucho”), considera que a cidade passa por uma verdadeira “crise alimentar”.

Enquanto isso, o touro que simboliza Wall Street em seu espírito indomável e antirregulatório guarda as portas de seu moinho satânico não só com seus chifres, mas sobretudo com mão de vaca. Assim, muitos americanos não estão comendo sequer o pão que o diabo amassou. E estão prontos para cometer os erros pelos quais serão condenados a sentirem-se culpados.

(*) Antonio Lassance é pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA) e professor de Ciência Política. As opiniões expressas neste artigo não refletem necessariamente opiniões do Instituto.

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Tragédias naturais expõem perda da noção de limite

Nas catástrofes atuais, parece que vivemos um paradoxo: se, por um lado, temos um desenvolvimento vertiginoso dos meios de comunicação, por outro, a qualidade da reflexão sobre tais acontecimentos parece ter se empobrecido, se comparamos com o tipo de debate gerado pelo terremoto de Lisboa, no século XVIII, que envolveu alguns dos principais pensadores da época.
 
Artigo é de Marco Aurélio Weissheimer, publicado na Carta Maior, 12/03/2011.


No dia 1° de novembro de 1775, Lisboa foi devastada por um terremoto seguido de um tsunami. A partir de estudos geológicos e arqueológicos, estima-se hoje que o sismo atingiu 9 graus na escala Richter e as ondas do tsunami chegaram a 20 metros de altura. De uma população de 275 mil habitantes, calcula-se que cerca de 20 mil morreram. Além de atingir grande parte do litoral do Algarve, o terremoto e o tsunami também atingiram o norte da África. Apesar da precariedade dos meios de comunicação de então, a tragédia teve um grande impacto na Europa e foi objeto de reflexão por pensadores como Kant, Rousseau, Goethe e Voltaire. A sociedade europeia vivia então o florescimento do Iluminismo, da Revolução Industrial e do Capitalismo. Havia uma atmosfera de grande confiança nas possibilidades da razão e do progresso científico.

No Poème sur le desastre de Lisbonne, (“Poema sobre o desastre de Lisboa”), Voltaire satiriza a ideia de Leibniz, segundo a qual este seria “o melhor dos mundos possíveis”. “O terremoto de Lisboa foi suficiente para Voltaire refutar a teodiceia de Leibniz”, ironizou Theodor Adorno. “Filósofos iludidos que gritam, ‘Tudo está bem’, apressados, contemplam estas ruínas tremendas” – escreveu Voltaire, acrescentando: “Que crimes cometeram estas crianças, esmagadas e ensanguentadas no colo de suas mães?”

Rousseau não gostou da leitura de Voltaire e responsabilizou a ação do homem que estaria “corrompendo a harmonia da criação”. "Há que convir... que a natureza não reuniu em Lisboa 20.000 casas de seis ou sete andares, e que se os habitantes dessa grande cidade se tivessem dispersado mais uniformemente e construído de modo mais ligeiro, os estragos teriam sido muito menores, talvez nulos", escreveu.

Já Kant procurou entender o fenômeno e suas causas no domínio da ordem natural. O terremoto de Lisboa, entre outras coisas, acabará inspirando seus estudos sobre a ideia do sublime. Para Kant, “o Homem ao tentar compreender a enormidade das grandes catástrofes, confronta-se com a Natureza numa escala de dimensão e força transumanas que embora tome mais evidente a sua fragilidade física, fortifica a consciência da superioridade do seu espírito face à Natureza, mesmo quando esta o ameaça”.

A tragédia que se abateu sobre Lisboa, portanto, para além das perdas humanas, materiais e econômicas, impactou a imaginação do seu tempo e inspirou reflexões sobre a relação do homem com a natureza e sobre o estado do mundo na época. Uma época, cabe lembrar, onde os meios de comunicação resumiam-se basicamente a algumas poucas, e caras, publicações impressas, e à transmissão oral de informações, versões e opiniões sobre os acontecimentos. Nas catástrofes atuais, parece que vivemos um paradoxo: se, por um lado, temos um desenvolvimento vertiginoso dos meios de comunicação, por outro, a qualidade da reflexão sobre tais acontecimentos parece ter empobrecido, se comparamos com o tipo de debate gerado pelo terremoto de Lisboa.

A espetacularização das tragédias e a perda da noção de limite

Em maio de 2010, em uma entrevista à revista Adverso (da Associação dos Docentes da Universidade Federal do Rio Grande do Sul), o geólogo Rualdo Menegat, professor do Departamento de Paleontologia e Estratigrafia do Instituo de Geociências da UFRGS, criticou o modo como a mídia cobre, de modo geral, esse tipo de fenômeno.

“Ela espetaculariza essas tragédias de uma maneira que não ajuda as pessoas entenderem que há uma manifestação das forças naturais aí e que nós precisamos saber nos precaver. A maneira como a grande imprensa trata estes acontecimentos (como vulcões, terremotos e enchentes), ao invés de provocar uma reflexão sobre o nosso lugar na natureza, traz apenas as imagens de algo que veio interromper o que não poderia ser interrompido, a saber, a nossa rotina urbana. Essa percepção de que nosso dia a dia não pode ser interrompido pelas manifestação das forças naturais está ligada à ideia de que somos sobrenaturais, de que estamos para além da natureza”.

Para Menegat, uma das principais lacunas nestas coberturas é a ausência de uma reflexão sobre a ideia de limite. É bem conhecida a imagem medieval de uma Terra plana, cujos mares acabariam em um abismo. Como ficou provado mais tarde, a imagem estava errada, mas ela trazia uma noção de limite que acabou se perdendo. “Embora a imagem estivesse errada na sua forma, ela estava correta no seu conteúdo. Nós temos limites evidentes de ocupação no planeta Terra. Não podemos ocupar o fundo dos mares, não podemos ocupar arcos vulcânicos, não podemos ocupar de forma intensiva bordas de placas tectônicas ativas, como o Japão, o Chile, a borda andina, a borda do oeste americano, como Anatólia, na Turquia”, observa o geólogo.

Não podemos, mas ocupamos, de maneira cada vez mais destemida. O que está acontecendo agora com as usinas nucleares japonesas atingidas pelo grande terremoto do dia 11 de março é mais um alarmante indicativo do tipo de tragédia que pode atingir o mundo globalmente. O que esses eventos nos mostram, enfatiza Menegat, é a progressiva cegueira da civilização humana contemporânea em relação à natureza. A humanidade está bordejando todos os limites perigosos do planeta Terra e se aproxima cada vez mais de áreas de riscos, como bordas de vulcões e regiões altamente sísmicas. “Estamos ocupando locais que, há 50 anos atrás, não ocupávamos. Como as nossas cidades estão ficando gigantes e cegas, elas não enxergam o tamanho do precipício, a proporção do perigo desses locais que elas ocupam”, diz ainda o geólogo, que resume assim a natureza do problema:

"Estamos falando de 6 bilhões e 700 milhões de habitantes, dos quais mais da metade, cerca de 3,7 bilhões, vive em cidades. Isso aumenta a percepção da tragédia como algo assustador. Como as nossas cidades estão ficando muito gigantes e as pessoas estão cegas, elas não se dão conta do tamanho do precipício e do tamanho do perigo desses locais onde estão instaladas. Isso faz também com que tenhamos uma visão dessas catástrofes como algo surpreendente".

A fúria da lógica contra a irracionalidade

Como disse Rousseau, no século XVIII, não foi a natureza que reuniu, em Lisboa, 20.000 casas de seis ou sete andares. Diante de tragédias como a que vemos agora no Japão, não faltam aqueles que falam em “fúria da natureza” ou, pior, “vingança da natureza”. Se há alguma vingança se manifestando neste tipo de evento catastrófico, é a da lógica contra a irracionalidade. Como diz Menegat, a Terra e a natureza não são prioridades para a sociedade contemporânea. Propagandas de bancos, operadoras de cartões de crédito e empresas telefônicas fazem a apologia do mundo sem limites e sem fronteiras, do consumidor que pode tudo.

As reflexões de Kant sobre o terremoto de Lisboa não são, é claro, o carro-chefe de sua obra. A maior contribuição do filósofo alemão ao pensamento humano foi impor uma espécie de regra de finitude ao conhecimento humano: somos seres corporais, cuja possibilidade de conhecimento se dá em limites espaço-temporais. Esses limites estabelecidos por Kant na Crítica da Razão Pura não diminuem em nada a razão humana. Pelo contrário, a engrandecem ao livrá-la de tentações megalomaníacas que sonham em levar o pensamento humano a alturas irrespiráveis. Assim como a razão, o mundo tem limites. Pensar o contrário e conceber um mundo ilimitado, onde podemos tudo, é alimentar uma espécie de metafísica da destruição que parece estar bem assentada no planeta. Feliz ou infelizmente, a natureza está aí sempre pronta a nos despertar deste sono dogmático.


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12 março 2011

Brasil em Desenvolvimento

Brasil em Desenvolvimento: Estado, Planejamento e Políticas Públicas - Volume 01

O projeto Brasil em Desenvolvimento: Estado, Planejamento e Políticas Públicas (Versão 2010), é mais composto por análises de pesquisadores do Ipea, sobre a política, sociedade e economia brasileiras.  O trabalho foi organizado por José Celso Cardoso Jr (pesquisador IPEA). 


Baixe o documento, gratuitamente.

Sumário analítico do volume 1 do Brasil em Desenvolvimento 2010

PARTE I
ALICERCES PARA A PROSPERIDADE ECONÔMICA

SEÇÃO I
Para Além da Crise: um novo padrão de crescimento?

Capítulo 1
Políticas Econômicas para Superação da Crise no Brasil: a ação anticíclica em debate

Capítulo 2
O Regime de Crescimento Econômico Brasileiro: uma apreciação sobre o período 1995-2009

SEÇÃO II
Fundamentos Macroeconômicos: gasto público, câmbio e inflação

Capítulo 3
Governo Gastador ou Transferidor? Um macrodiagnóstico das despesas federais no período 2002 a 2010

Capítulo 4
Retomada do Investimento Público Federal no Brasil e a Política Fiscal: em busca de um novo paradigma

Capítulo 5
Gasto Social Federal: uma análise da execução orçamentária de 2009

Capítulo 6
Considerações sobre Evolução da Taxa de Câmbio no Brasil no período 1995-2009: o desalinhamento cambial

Capítulo 7
Decomposição e Determinantes da Inflação no Brasil no Período 2007-2009

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07 março 2011

Transições democráticas



Lições brasileiras para a transição árabe 


feitas pelo Embaixador Celso Amorim, ex-chanceler do Brasil.
Além de ser uma análise sobre o que há de comum nos processos rebeldes árabes, Celso Amorim traça um paralelo com as condições e a trajetória da transição brasileira, em suas semelhanças e diferenças.

Fonte: a matéria é de Chris Arsenault, da rede Al Jazeera, de 05/03/2011. Seu conteúdo encontra-se publicado também no portal Carta Maior.


Durante duas décadas da ditadura militar seria impensável que uma mulher, ex-revolucionária comandaria o país no século XXI.

Que a transição da ditadura para a democracia possa oferecer algumas lições aos rebeldes no Mundo Árabe, disse o mais duradouro ministro das Relações Exteriores do Brasil, num fórum organizado pelo Centro Al Jazeera de Estudos em Doha, Qatar.

“Quem teria imaginado que um intelectual, um torneiro mecânico e um certo tipo de revolucionária sucederiam uma ditadura militar?”. Celso Amorim, o ex-Ministro das Relações Exteriores e diplomata de carreira falou a uma multidão na quinta-feira, referindo-se aos ex-presidentes e a atual presidente.

“O que quer que ocorra [rebeliões ao redor do Mundo Árabe] criará uma nova situação política no Oriente Médio. Isto é certo”, disse.

E, embora ele tenha se recusado a aconselhar diretamente os egípcios, bahrainis, tunisianos ou líbios, as experiências do Brasil parecem ter alguns paralelos com os acontecimentos em curso na região, hoje.

O passado obscuro do Brasil

Em 1964, os militares brasileiros deram um golpe, afastando do poder uma democracia liderada pelo presidente João Goulart. Os militares fecharam o parlamento em 1968 e os generais criaram uma ‘democracia’ com dois partidos políticos legais – Amorim os descreve como o partido do “sim” e o do “sim, senhor”.

Os militares dissolveram organizações estudantis, atacaram líderes do movimento sindical, censuraram a imprensa e torturaram ou “fizeram desaparecer” seus opositores. Era o tipo de estado cujo comportamento é familiar por demais a muitos árabes.

De 1968 a mais ou menos 1975, a economia brasileira se expandiu, com um crescimento do PIB na casa dos 10%. Como é no entanto comum em governos autoritários, os ganhos não foram amplamente compartilhados. O crescimento não respingou nos pobres e a desigualdade disparou.

“Durante o governo militar, tivemos alto crescimento econômico, mas a desigualdade social aumentou”, disse Amorim. “A coisa mais importante que o o Brasil fez [durante minha gestão nos dois mandatos como ministro das relações exteriores] foi reduzir a desigualdade”.

No Egito de Hosni Mubarak, as privatizações e as assim chamadas reformas pró-mercado, em 2004, “provocaram uma aceleração impressionante do crescimento”, de acordo com uma pesquisa de 2008 do Fundo Monetário Internacional (FMI). Mas 40% da população continuou a viver com menos de 2 dólares por dia, enquanto os preços dos imóveis foram elevados às alturas, tornando-se inacessíveis às famílias de classe média. O bolo pode ter se tornado maior, mas muitos padeiros continuaram com fome.

“Uma sociedade que é muito desigual sempre tem a pressão da instabilidade”, disse Amorim.

O abismo entre “os que têm” – frequentemente aqueles com ligação com o regime – e os que “não têm” é profundo, no Egito. O mesmo é verdadeiro para a Líbia e a maioria dos países árabes.

Para combater a desigualdade, o governo brasileiro, na gestão de Luiz Inácio Lula da Silva, um ex torneiro mecânico e líder sindical, iniciou uma série de programas, incluindo subsídios escolares e de renda para os pobres, disse Amorim. Subsídios são concedidos às famílias pobres sob certas condições: por exemplo, que elas enviem seus filhos para a escola.

O dinheiro é prioritariamente entregue à mulher, chefe de família. “Não ocorre assim no mundo muçulmano, [mas] no Brasil, se você dá dinheiro ao pai, ele gasta tudo”, falou Amorim.

Religião e Revolução

Desde que o Brasil se tornou um país democrático, 30 milhões de brasileiros ascenderam à classe média, e outros 30 milhões saíram da miséria absoluta para a pobreza, o ex ministro disse. Mas o país ainda tem um longo caminho pela frente, se o objetivo é eliminar a vasta disparidade de renda.

A transição para a democracia não aconteceu da noite para o dia; foi um processo lento, que transcorreu ao longo dos anos 80. E as instituições religiosas jogaram um papel chave nessa transição, disse Mathew Flynn, um sociólogo, conferencista e especialista em Brasil na Universidade do Texas. “Eu imaginaria que instituições religiosas vão jogar um belo papel proeminente [em qualquer transição] no Oriente Médio”, disse Flynn.

O Partido dos Trabalhadores (PT), que atualmente detém o poder, foi formado em 1978 por militantes sindicais no coração industrial do país, ativistas religiosos da Igreja Católica e grupos de ativistas pelos direitos humanos. “Eles [o PT] foram bastante ativos no engajamento pela realização de eleições, junto a outros partidos independentes”, Flynn disse.

Dilma Rousseff, atual presidente e primeira presidente mulher do Brasil começou sua carreira política como guerrilheira de esquerda, combatendo a ditadura militar.

Lições a aprender?

Mas os atos revolucionários violentos não derrubaram o regime. “Quando o governo militar caiu, não escrevemos uma nova constituição imediatamente”, disse Amorim.

“Elegemos uma comissão que levou dois anos escrevendo uma nova carta”, num processo que se completou em 1988. Depois das eleições de 1989, o Brasil foi vastamente reconhecido como uma democracia.

Chile, Uruguai e Argentina também sofreram com os grilhões da dominação militar, assim como muitos outros países na região.

Mark Katz, professor na George Mason University, acredita que há uma “muito boa razão para crer que o Oriente Médio seguirá os passos da América Latina”. “As pessoas estavam bastante carentes de esperança quanto a isso [a democracia na América Latina], disse Katz. “Mas no fim deu tudo bem certo para a maioria. O que está se passando no Oriente Médio é incrivelmente positivo”.

Se Katz está correto, e o levante pelo Oriente Médio resultar em governos mais democráticos, é provável que isso implique o estreitamento de laços entre a América Latina e o Mundo Árabe.

Negócios em jogo

A primeira Cúpula América do Sul e Mundo Árabe teve lugar em Brasília, capital do Brasil, em 2005, com uma segunda edição em Doha, Qatar, em 2009. Até agora, o comércio é o que mais impulsiona a relação entre ambos. “O maior superávit comercial que o Brasil teve foi com o Mundo Árabe”, disse Amorim.

Além do Conselho de Cooperação do Golfo [GCC, em sua sigla em inglês] , que abrange países ricos em petróleo no Golfo Árabe, as economias árabes não são particularmente bem integradas. “Este é um campo [a integração regional] em que podemos compartilhar nossas experiências”, disse Amorim.

Fundado em 1991, o Mercosul, um bloco comercial formado entre Brasil, Argentina, Paraguai e Uruguai poderia fornecer um modelo para os países árabes, especialmente na África do Norte, falou o ex embaixador.

E a integração com o Mundo Árabe poderia trazer benefícios para além do incremento ao crescimento econômico, disse Jamie de Melo, professor da Universidade de Genebra, na Suíça, que estuda relações econômicas internacionais. “Países que são vizinhos e têm acordos comerciais, e acordos preferenciais parecem ser menos propícios a entrarem em conflito”, disse de Melo.

Além do comércio, o Brasil deu passos largos em questões mais amplas no Oriente Médio. O maior país da América do Sul reconheceu unilateralmente o estado palestino em dezembro de 2010, sugerindo aos outros países sul-americanos que o seguissem. O país também mantém relações cordiais com Israel.

“Em novembro de 2009 recepcionamos o presidente do Irã, de Israel e da Autoridade Palestina”, disse Amorim. “Quantos países podem dizer isso?”

Tradução: Katarina Peixoto

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04 março 2011

Um balanço do Governo Obama


Watch the full episode. See more The Open Mind.

A cientista política The Skocpol (Universidade de Harvard)faz um balanço da administração Obama e avalia se ele merece ou não ser qualificado como um "new New Dealer", ou seja, um presidente que resgata o legado do Presidente Franklin Delano Roosevelt, que expandiu como ninguém as políticas de promoção social naquele país.

Mais do que responder "sim" ou "não",Skocpol analisa as dificuldades e possibilidades de Obama diante do quadro político norteamericano.

Obs: Entrevista em Inglês. E como outros vídeos que existem por aí,  é preciso aguentar uma propaganda inicial, além da musiquinha deprê do PBS Open Mind, que é um dos programas mais tradicionais de entrevistas existente nos EUA.

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03 março 2011

Pesquisa aponta melhora na educação do Brasil

Sistema de Indicadores de Percepção Social (SIPS) aponta que cerca de 49% dos entrevistados acreditam que a educação pública melhorou no Brasil.

Brazil experiences improvement on public education, according to 49%. 
To 51%, the situation remains the same (27,2%) or worse (24%).

Cerca de 27,2% acham que a educação continua igual, enquanto cerca de 24% consideram que a educação piorou.
O IPEA ouviu 2.770 pessoas, em todas as regiões brasileiras

A percepção de que a educação pública no Brasil melhorou nos últimos anos é maior entre os homens e entre as pessoas mais jovens, assim como entre os cidadãos com menor escolaridade. 

As regiões Norte, Nordeste e Centro-Oeste foram as que mais apresentaram evolução na educação, segundo os entrevistados. A informação pode ser a evidência de que foram ampliados os investimentos em educação nessas regiões, já que é onde se encontram os piores indicadores educacionais do País.

O SIPS também questionou os entrevistados sobre a qualidade da merenda escolar. Os dados apontam uma grande diferença entre as regiões brasileiras. Na região Norte, por exemplo, cerca de 21,7% dos entrevistados consideraram a qualidade da merenda ruim. O índice é alto se comparado com o das regiões Sul e Sudeste, onde a merenda é considerada ruim por 7,5% e 4,1% dos entrevistados, respectivamente. O Nordeste e o Centro-Oeste apresentam números similares: 13,9% dos entrevistados consideraram a merenda ruim.

Quanto ao programa Universidade para Todos, ProUni, o estudo mostra que cerca de 84% dos entrevistados consideraram pequeno o número de vagas do programa e acham que deveria haver ampliação. 

Outro resultado do SIPS foi a constatação do desconhecimento da população de programas como o Programa do Livro Didático e dos Conselhos Escolares.

O Ipea divulgou os resultados do Sistema de Indicadores de Percepção sobre Educação na manhã de segunda-feira, dia 28/2/2011.
O indicador foi apresentado pelo coordenador de Educação do Ipea, Paulo Corbucci.


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01 março 2011

Comunicação institucional do Poder Público

A comunicação é, ao mesmo tempo, uma das áreas mais importantes e sensíveis para a gestão pública e uma das menos institucionalizadas.

A regulamentação é escassa, genérica, pouco associada aos objetivos da República e dominada, em sua publicidade, por “maneirismos” mercadológicos.

Possui uma ampla margem de manobra, o bastante para que ela possa ser bem utilizada em prol das políticas, programas e ações que precisam se tornar conhecidas, mas aberta o suficiente para deixar brechas que podem ser distorcidas, ou cujo bom uso depende não só das virtudes dos governantes, mas da virtude dos que comandam a comunicação.

Tal situação contraria um dos requisitos do funcionamento do Estado, que é justamente o de ter mecanismos que induzam comportamentos republicanos, diminuindo ao máximo o espaço para opções entre usar ou abusar da comunicação.

Um marco institucional para a comunicação do Poder Executivo deve seguir o princípio essencial de que poder público é poder do público sobre o Estado. Deriva daí que a comunicação deva ser prestada como uma modalidade serviço do público.

Um serviço público de comunicação é a forma concreta e sistemática de institucionalização de um tipo próprio e peculiar de comunicação. Próprio porque, em alguma medida, deve ser realizado diretamente pelo Estado, sem prejuízo de eventualmente valer-se de serviços especializados contratados no mercado e, sobretudo, tendo que conectar-se a redes sociais que operam seus próprios canais de transmissão de mensagens. Peculiar porque tem características diferenciadas em relação à comunicação empresarial privada, à autocomunicação de massa ou das organizações civis, e distinta para cada um de seus ramos (Executivo, Legislativo e Judiciário).


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