27 setembro 2018

Em desespero, candidatura Alckmin apela para "vaquinha" de intenções de voto



Nos últimos dias, três mosqueteiros foram vistos lambendo picolé de chuchu apimentado e vertendo lágrimas pelo canto dos olhos. São eles: Roberto Giannetti da Fonseca, José Álvaro Moisés e Rubens Figueiredo. Os três escreveram artigos para o jornal Folha de S. Paulo tendo por mote a pergunta: "A democracia corre risco?"



Artigo de Antonio Lassance (*). 

Chuchu com pimenta

A campanha do insosso Geraldo Alckmin tem feito de tudo para melhorar sua receita. Primeiro, colocou uma pitada de extrema direita em sua chapa, chamando a senadora Ana Amélia para ser vice. Ana Amélia é aquela que não sabe a diferença entre a rede de televisão Al-Jazeera, um oásis de liberdade de imprensa no mundo árabe, e o Estado Islâmico. Ora, bolas! Todos comentem confusões. Talvez por isso Amélia, que era a vice de verdade, não se incomodou quando Alckmin trocou seu nome pelo da senadora Kátia Abreu, em uma entrevista.

Depois, Alckmin pisou em solo nordestino e vestiu chapéu de couro para gravar  vídeo de campanha. Foi a primeira vez que um astronauta de Pindamonhangaba pisou em solo lunar, em busca de um picolé de mandacaru. A missão terminou abortada pelo berro de cabras indignadas que suspeitaram: "não é o Lula!".

Agora, em plena reta final do primeiro turno, resolveram colocar pimenta no picolé de chuchu. Será que vai dar certo?

Os três mosqueteiros

Nos últimos dias, três mosqueteiros foram vistos lambendo picolé de chuchu apimentado e vertendo lágrimas pelo canto dos olhos. São eles: Roberto Giannetti da Fonseca, José Álvaro Moisés e Rubens Figueiredo. Os três escreveram artigos para o jornal Folha de S. Paulo tendo por mote a pergunta: "A democracia corre risco?"

Roberto Giannetti da Fonseca é aquele que, recentemente, pediu afastamento das assessorias que fazia às campanhas de Alckmin e Doria por ter se tornado alvo da 10ª fase da Operação Zelotes, que investiga escândalos de sonegação na casa dos bilhões. Parece que já voltou à ativa - me refiro à campanha ativa, e não, ainda, à dívida ativa.

José Álvaro Moisés, professor de uma ciência política aposentada, pediu ajuda ao consultor marqueteiro de Temer, Rubens Figueiredo, integrante de um tal "grupo de comunicação estratégica" do governo do atual presidente. "Grupo" que, aliás, se notabilizou por também reunir, entre outros, Marco Antonio Villa, que hoje trabalha como radialista revoltado em uma rádio de São Paulo, e José Yunes, amigo pessoal de Temer e advogado em cujo escritório, segundo investigações da PF, recebia dinheiro vivo para campanhas do partido do presidente. Realmente, algo bem estratégico. 

Os três marqueteiros, ou melhor, mosqueteiros, em uníssono, usaram as páginas do jornal Folha de S. Paulo para rogar aos candidatos de centro que se unam para colocar um alguém confiável no segundo turno, evitando a polarização entre o Coiso e o PT. 

Moisés e Figueiredo citam como sendo o centro: Alckmin, Marina, Álvaro Dias, Meirelles e Amoêdo. Pois é, excluíram o Ciro. Talvez Ana Amélia o tenha identificado como membro da Al Qaeda.

Giannetti foi explícito, em um dos apelos mais patéticos já vistos nas páginas de opinião daquele jornal:

"Não deveríamos avaliar como um ato patriótico, neste momento de flagrante risco institucional, alinharmos um apoio condicional ao candidato Geraldo Alckmin, que, apesar de estagnado na faixa de 10% do eleitorado segundo as recentes pesquisas, parece ser o único que reúne condições de virar o jogo para a vitória dos moderados de centro no segundo turno?" 

Esse tipo de pregação está longe de ser análise. É peça de campanha. A candidatura de Alckmin deveria ter pagado a Folha por uso de espaço publicitário.

O espirro dos espada… atchins

O espirro dos esbirros repercutiu mal. O que os espada… atchins de Alckmin fazem é uma desesperada e vergonhosa  tentativa de organizar uma "vaquinha" de intenções de voto, passando o chapéu em candidaturas que, à exceção da de Marina Silva, se esforçam por superar os 3 centavos de margem de erro.

A campanha vai tão mal que o candidato do centrão já se contentaria em se tornar o candidato do centrinho.

A leitura desses artigos citados mostra que, em eleições acirradas, a primeira vítima é o bom senso.

Esse Giannetti que hoje chama o PT de "extremista" é o mesmo que, não faz muito tempo, defendeu Lula e Dilma como autores de uma política de Estado "não ideológica". Disse ele em seminário sobre financiamentos públicos às exportações de serviços de engenharia: 


“Que história é essa de se chegar no Senado e falar mal destes financiamentos por eles terem sido criados pelos presidentes Lula e Dilma? Isso tem que se tornar um projeto de Estado”. 
(O seminário foi promovido pelo jornal Valor Econômico, das organizações Globo, em 15 de junho de 2015). 

Por sua vez, em artigo amorosamente intitulado "O fenômeno Temer", Rubens Figueiredo mostrou habilidades de um trapezista de circo para fazer rápidas piruetas de raciocínio que precisam de um Dramin para não provocar enjoos. Disse ele:

"É simplesmente admirável que Temer, com toda sua limitação para ser um pop star da política e frente a tantas dificuldades, tenha conseguido, até agora, um desempenho espetacular. Nem mesmo Lula, à época tido internacionalmente como "o cara", chegou a ter a base parlamentar que Temer granjeou. A discrição venceu a idolatria, o mérito superou a fanfarronice."

Como se vê, a fanfarronice não é um privilégio dos políticos. Tem contaminado muito cientista político marqueteiro membro de grupo de comunicação estratégica por aí. 

José Álvaro Moisés, igualmente entusiasmado com Michel Temer, foi profético. Em maio de 2016, ainda em plena ressaca da farra do golpe, escreveu um artigo em que respondia à pergunta sobre se "o governo Temer será capaz de unir o país e superar a crise?". 

De forma taxativa e em letras garrafais, disse: "SIM". A profecia de fato foi cumprida. Uma pena que de forma diametralmente contrária à esperada pelo articulista. Atualmente, "Todo mundo odeia o Temer" é uma série de muito mais sucesso do que "Todo mundo odeia o Chris".

Escalar Giannetti da Fonseca, Álvaro Moisés e Rubens Figueiredo para a tarefa de dourar a pílula indigesta do candidato tucano, a essa altura do campeonato, é um sinal não apenas de mau agouro para Alckmin. É um atestado de que sua candidatura realmente está sem gasolina e sem prestígio. 

Mais uma vez, fomos salvos pelo bom senso de uma Maria

Por sorte, apareceu Maria Hermínia Tavares de Almeida, com a elegância, inteligência e espírito democrático que lhe são peculiares, para colocar um pouco de bom senso no debate.

Ex-presidente da Associação Brasileira de Ciência Política (2004-2008) e professora da USP que, antes, passou pela Unicamp e CEBRAP, Maria Hermínia escreveu artigo em que afirma, desde o título: 


a ameaça nas eleições vem da extrema direita, e isso é consequência de o PSDB ter perdido capacidade de reunir a centro-direita em torno de seu candidato.

Mesmo com várias críticas ao PT, a cientista política lembra que Lula, quando foi derrotado em 1989, 1994 e 1998, aceitou os resultados sem contestá-los. Diferentemente do PSDB, em 2014.

Lula também poderia, se quisesse, ter dado asas às pretensões de mudar a Constituição em busca de um terceiro mandato, como vimos acontecer em outros países da América do Sul. Não o fez. 


"Ao ascender ao Planalto, a agremiação consolidou uma liderança moderada de centro-esquerda e governou rigorosamente dentro das regras democráticas. Não procurou calar a imprensa que lhe fazia oposição, nem controlar o Judiciário que exerceu com liberdade sua vocação antimajoritária”.

Nas entrelinhas, Maria Hermínia puxa a orelha de quem brinca com o extremismo para, por razões eleitoreiras, atacar uma candidatura de centro-esquerda que é claramente democrática e moderada.

Pena que Alckmin, Ana Amélia e os três mosqueteiros não estejam preocupados com isso. Estão preocupados com o fato de que sua vaquinha está indo para o brejo.

(*) Antonio Lassance é doutor em ciência política pela Universidade de Brasília.
Artigo publicado na Carta Maior.


Fontes dos artigos citados:
https://www1.folha.uol.com.br/colunas/maria-herminia-tavares-de-almeida/2018/09/ameaca-nas-eleicoes-vem-da-extrema-direita.shtml
https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2018/09/a-democracia-corre-risco.shtml?loggedpaywall
https://www1.folha.uol.com.br/opiniao/2016/05/1771270-governo-temer-sera-capaz-de-unir-o-pais-e-superar-a-crise-sim.shtml
https://www.em.com.br/app/noticia/politica/2016/11/19/interna_politica,825146/temer-realiza-reuniao-com-conselho-de-comunicacao-em-sp.shtml
https://www.viomundo.com.br/politica/seminario-discutido-por-lula-em-grampo-com-executivo-foi-promovido-pelo-valor-economico.html
http://www.vermelho.org.br/noticia/315382-1










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23 setembro 2018

O pato extremista



Uma paródia do Pato Donald retrata o que acontece quando as pessoas transformam frustrações e desespero em inimigos públicos personificados, sejam eles pessoas ou grupos sociais.


Estimuladas por comunicadores extremistas e extremados, as pessoas incorporam essas narrativas paulatinamente e as tornam respostas agressivas e corriqueiras às suas dificuldades diárias. A ideia básica é a de manter o medo vivo dentro delas. Assustadas, tais pessoas aceitam soluções autoritárias como um mal menor diante do pavor que têm dos "inimigos públicos".

O vídeo original foi feito pela Rebellious Pictures e é apresentado pelo próprio Youtube como um exemplo de uso adequado  ("fair use")   de imagens compatíveis com os direitos autorais.

O desenho remixa vários filmetes clássicos do icônico Pato Donald, produzidos pela Walt Disney entre as décadas de 1930 a 1960. Pela lei de direitos autorais, paródias e vídeos de comentários que fazem referência a imagens já produzidas por outros podem ser admitidas legalmente como uso adequado de imagem. Não fere direitos autorais.

A tradução para o português foi adaptada para se referir a personalidades, coletividades e expressões mais habituais ao público brasileiro.

Assim,  Glenn Beck, o âncora raivoso que fez sucesso na Fox News, é traduzido como "Globo". Ao invés do México, país mais estigmatizado como grande ameaça à fronteira dos Estados Unidos, em seu lugar aparece a Venezuela, que se tornou alvo principal de crítica no Brasil. Barack Obama, o presidente que Beck odiava, está traduzido como Lula e Dilma. O Foro de São Paulo, Chico Buarque e Pablo Vittar são outros exemplos de uma tradução não literal, adaptada com referências mais familiares ao público brasileiro.

Fontes:
https://youtu.be/HfuwNU0jsk0
https://www.youtube.com/yt/about/copyright/fair-use/
 www.openculture.com/2010/10/donald_duck_discovers_glenn_beck_a_remix.html



Keywords:
Extremismo
Fascismo
Mídia e política
Comunicação














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19 setembro 2018

"A economia que não se preocupa com a justiça social é uma economia que condena os povos a isso que está ocorrendo no mundo inteiro, uma brutal concentração de renda e de riqueza, o desemprego e a miséria"

Maria da Conceição Tavares







Documentário sobre economista, que chegou em 1954, vinda de Portugal, confunde-se com a história do Brasil e seus projetos, sob a democracia ou não. E mostra a face agregadora e alegre da pensadora 

Conceição Tavares e a procura de uma nação 


Matéria de Vitor Nuzzi, da Rede Brasil Atual.
Publicado 15/09/2018 12h33, última modificação 16/09/2018 13h05


"A economia que não se preocupa com a justiça social é uma economia que condena os povos a isso que está ocorrendo no mundo inteiro, uma brutal concentração de renda e de riqueza, o desemprego e a miséria. (...) Isso é coisa de tecnocrata alucinado, que acha que está tudo ok, e não está nada ok"

"Primeiro estabilizar, depois crescer e depois distribuir é uma falácia. Não estabiliza, cresce aos solavancos e não distribui. Essa é a história da economia brasileira desde o pós-guerra."

"De todos os direitos, (o livre pensar) é o que tem sido mais recorrentemente violado."

As frases são de Maria da Conceição Tavares, portuguesa que chegou ao Brasil em fevereiro de 1954, pouco antes de completar 24 anos. Uma "moça tranquila" que se tornou "brava" aqui, segundo conta, aos risos, em uma das cenas do documentário Livre Pensar, dirigido por José Mariani. Mais do que a trajetória da economista conhecida pela postura enfática, o filme, de 75 minutos, confunde-se com a história de um país em sua busca por identidade e independência.

Fugindo da ditadura salazarista, grávida (de Laura), Conceição Tavares chegou em um momento conturbado no Brasil. Em agosto de 1954, o presidente Getúlio Vargas se suicidou com um tiro, no Palácio do Catete, no Rio de Janeiro, então sede do governo. Mas ela presenciou uma era promissora, um "período de afirmação", como definiu. "É um período alegre, de Bossa Nova, Cinema Novo, o diabo, arte, literatura", diz Conceição, enquanto se exibem imagens da construção de Brasília. "Acreditei que o Brasil ia ser uma democracia e uma civilização original nos trópicos. E eu realmente acreditei."

São muitas as aparições em que se constata a "braveza" de Conceição Tavares no falar. Mas há também cenas em que ela aparece tranquila, feliz. Como na comemoração de seus 80 anos, em 2010, na Casa do Minho, no Rio, em que Conceição dança, inclusive com o economista Luiz Gonzaga Belluzzo, que dá depoimento para o filme. No salão, cantam Grândola, Vila Morena, de Zeca Afonso, canção imortalizada na Revolução dos Cravos. Alguém grita "Viva a democracia!", ela exclama: "Viva 25 de Abril!", a data histórica de 1974. O filme termina com Conceição em trajes típicos portugueses, novamente dançando. 

Tolerância
Mariani chama a atenção para a festa dos 80 anos, para a qual a imprensa não teve acesso. Ali, Conceição protagoniza uma cena praticamente inimaginável nos dias de hoje, ao receber o carinho de dois ex-alunos: Dilma Rousseff e José Serra, concorrentes à Presidência da República naquele ano, em eleição vencida pela petista. "Ela é muito agregadora. Ela tem essa 'fúria', essa veemência, mas é muito querida, tem esse lado carinhoso, de muitos amigos."

O filho Bruno Tavares revê as imagens. E lembra que sua mãe nasceu em um 24 de abril, entre o dia de São Jorge (23) e justamente o da Revolução dos Cravos (25). Em outra cena do documentário, os dois estão assistindo a uma partida de futebol, e ela até comemora um gol, não identificado. Mariani conta que ela sempre gostou de ver jogos – no estádio, inclusive –, e torce pelo Vasco, time originalmente ligado à colônia portuguesa no Rio.

Matemática de formação, Conceição começa, no Brasil, a cursar a Faculdade de Ciências Econômicas da Universidade do Brasil, atual Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), onde depois seria professora. Passa pelo BNDE, ainda sem o S de social, e em 1963 vai para a Comissão Econômica para a América Latina (Cepal). Ali escrevi o ensaio Auge e declínio do processo de substituições de importação no Brasil, que se tornaria clássico.

Conceição foi aluna e assistente de Octavio Bulhões, economista de perfil conservador. Mas sempre manteve "uma perspectiva crítica da sociedade", como nota o também economista Wilson Cano, um dos 13 entrevistados do filme. Ainda em 1958, ela observa: "Que ruim é a distribuição de renda neste país!". No ano seguinte, é lançado Formação Econômica do Brasil, de Celso Furtado, intelectual que Conceição refuta como referência, ao mesmo tempo em que apresenta o chileno Aníbal Pinto como mestre. 

Atualidade
É a terceira incursão de José Mariani no terreno da economia. Em 2005, ele dirigiu O Longo Amanhecer, cinebiografia de Celso Furtado, e em 2014, Um Sonho Intenso, panorama do pensamento brasileiro. Com o filme sobre Conceição Tavares, completa uma trilogia, mesmo que não pensada com essa finalidade. "Na minha cabeça, um filme foi gerando outros", diz o autor. Com uma linha comum: a busca de uma nação, a utopia.

Para o diretor, o filme mostra também algo que parece perdido no Brasil atual, o exercício da tolerância sob a diversidade, como na cena em que Dilma e Serra mostram cordialidade, reunidos para celebrar o aniversário da professora. "É um arco. Esse espírito é atual por ter se perdido na sociedade, não dela. Acho isso fantástico. É possível (a tolerância) dentro desse jogo civilizatório." 

Da mesma forma, as ideias de Conceição Tavares se revelam rigorosamente atuais, como nas críticas ao capital financeiro e à desigualdade. "Existe uma atualização do pensamento dela. Se atualiza porque o Brasil se move desse jeito, anda para frente e para trás. Nosso processo histórico é muito sofrido, muito duro", comenta Mariani. "Certas pessoas têm um pensamento que se atualiza por si só." 

Ao lembrar que não é economista, ele arrisca uma interpretação para o jeito telúrico de Conceição, que pode ser visto em muitas de suas intervenções. "Eu fui percebendo – posso estar um pouco errado, um pouco certo – que esse sentido da veemência, da crítica do nosso processo social, é uma coisa de estrangeiro. Acho que nós, brasileiros, naturalizamos o nosso descalabro."

Depois de uma temporada no Chile, pela Cepal, Conceição retorna ao Brasil em 1973, pouco antes do golpe que derrubou o presidente Salvador Allende. Vai para a Universidade Estadual de Campinas (Unicamp), onde ajudaria a estruturar a pós-graduação. Outro entrevistado, o professor Carlos Gonçalves, se emociona ao lembrar de como ele e Conceição receberam a notícia do golpe no Chile: sentaram-se no pára-choque de um automóvel e choraram. Ela referiu-se ao episódio como "minha derrota", assim como a queda de João Goulart. 

Conceição apresenta-se como de esquerda, desde sempre. Em outra imagem, em sala de aula, conta que aos 18 anos quase foi "em cana", ainda em Portugal, porque estava fazendo um seminário sobre Platão. "Livre pensar não era propriamente muito bem aceito na república portuguesa. De todos os direitos, tem sido o mais recorrentemente violado", afirma.

Em janeiro de 1975, no Brasil do AI-5, que também não era um terreno favorável ao pensar, é sequestrada em pleno Aeroporto do Galeão, no Rio. "Enfiaram um capuz, e aí ela foi para um prisão no Exército", conta Laura, sua filha. Conceição ficou desaparecida quase uma semana. "Foi um horror", lembra, em depoimento. "Rendeu uma certa psicanálise, porque eu fiquei com medo de ser professora." 

Outro pupilo, Aloizio Mercadante, recorda de um dia em que, em vez de concluir uma tese, os dois foram ao cinema, justamente em uma sala que exibia Os Embalos de Sábado à Noite. Filme que ela detestou, reclamando, lá mesmo, do "americanismo chapado" e recebendo reclamações do público por causa do barulho. "Psiu o cacete", respondeu, ao seu estilo. 

Já nos anos 1980, Conceição Tavares se dedica ao estudo da economia política internacional. Tempos de globalização. Ela fala em transição "para um lugar ruim", citando o neoliberalismo, "uma tal instabilidade mundial que é uma crise atrás da outra". Em aula, afirma: "A partir de 90 só duas áreas cresceram, e essas é que dão a geoeconomia mundial: os Estados Unidos e a Ásia do oeste. Europa pasmou, o Japão pasmou, e o Federal Reserve (o banco central norte-americano) faz o que quer com o dólar..." Denuncia a "ditadura do capital financeiro", afirmando que "o neoliberalismo é a doutrina dos grandes grupos financeiros internacionais".

Na Câmara
Nessa fase, entra na política partidária, filiando-se ao PMDB, agora novamente sem a primeira letra. Brinca, referindo-se a Ulysses Guimarães: "Nunca compliquei a vida do velho". Participou da elaboração do programa Esperança e Mudança. No governo José Sarney, seu apoio ao Plano Cruzado ficou famoso – ela chorou na TV ao comentar o pacote. "Colocou a Conceição como figura midiática", lembra no filme a economista Hildete Pereira de Melo.

Deixou o partido em 1989, ano da primeira eleição presidencial pós-ditadura, inconformada com o abandono da legenda à candidatura Ulysses. "Este nosso partido já não é meu", disse Conceição ao velho líder, anunciando que iria para o PT. Segundo ela, a resposta foi: "Faz muito bem. Se eu fosse jovem, eu também entraria". A economista, que achou essa resposta "uma graça", se elegeu deputada federal em 1994.

"A minha experiência como deputada foi meio dramática", conta Conceição, lembrando do governo Fernando Henrique e do início de um extenso processo de privatizações. "Foi o início pesado de uma política neoliberal. (...) Passei todo o mandato votando contra e fui sistematicamente derrotada, nunca votei com a maioria. Foi muito cansativo." Sua filha Laura diz que, nessa fase, além das constantes brigas no Parlamento, a então deputada padeceu com duas hérnias de coluna.

Em entrevista de 1995, ela afirma: "Sou uma reformista convicta. Continuo onde sempre estive". Ela não quis tentar a reeleição, mas continuou na ativa, em outras frentes, como no Fórum Social Mundial. Em 2002, em Porto Alegre, discursou com convicção, em seu estilo, mas falando também da tolerância, como citado por José Mariani.

"Se eu não acreditasse com a cabeça, com o coração, com a barriga, não vinha aqui para Porto Alegre para falar para um auditório destes aos quase 72 anos. Temos uma cultura, uma capacidade de negociação, brigamos como cães, mas depois vamos para a festa, juntos, isto é muito nosso, não tem esta coisa 'não falo mais com fulano', esta ideia de tolerância, da aceitação ao direito da discrepância. Isso é um avanço democrático da sociedade." E se apresentou como uma militante "que não parará até a hora de morrer". Pediu: "Marchem até morrer!".

O filme avança até o governo Lula e o "ajuste convencional" do primeiro ano, em 2003. Ela conversa com o presidente e pede para que fale ao ministro da Fazenda (Antonio Palocci) sobre  juros. Lula autoriza, e a economista vai ao ministro para "parar com essa brincadeira". Não dá em nada, e ela lamenta: "Vai dar desindustrialização, uma desgraceira". 

Conceição destaca a redução da desigualdade no período Lula. Sua filha conta que ela sentiu a deposição de Dilma Rousseff, em 2016. "A coisa do golpe foi muito pesada para ela. O impeachment da Dilma adoeceu minha mãe". 

A primeira exibição do documentário foi em abril, em evento no Salão Nobre da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ), justamente para celebrar os 88 anos de Conceição Tavares. "Foi uma ovação de cinco minutos. Ela ficou muito feliz. Foi muito emocionante", conta Mariani. Segundo relatos, Conceição está bem de saúde e atenta aos acontecimentos no Brasil. O diretor conta que ouviu falar que a economista ameaça retornar a Portugal caso Jair Bolsonaro vença as eleições.

Por enquanto, Livre Pensar percorre circuito universitário. Já foi exibido na UFRJ, na Universidade de Brasília (UnB) e na Unicamp. Confira abaixo as exibições previstas.


Livre Pensar - cinebiografia da Maria da Conceição Tavares 
Direção: José Mariani
Duração: 75 minutos 
Entrevistados: Aloizio Mercadante, Bruno Tavares, Carlos Gonçalves, Carlos Pinkusfeld Bastos, Hildete Pereira de Melo, José Carlos Braga, Laura Tavares, Luiz Gonzaga Belluzzo, Pedro Paulo Zahluth Bastos, Ricardo Bielchowsky, Ricardo Carneiro, Sulamis Dain e Wilson Cano  










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12 setembro 2018

“Quero pedir, de coração, a todos que votariam em mim, que votem no companheiro Fernando Haddad para Presidente da República”

"Fernando Haddad, ministro da Educação em meu governo, foi responsável por uma das mais importantes transformações em nosso país. Juntos, abrimos as portas da Universidade para quase 4 milhões de alunos de escolas públicas, negros, indígenas, filhos de trabalhadores que nunca tiveram antes esta oportunidade. Juntos criamos o Prouni, o novo Fies, as cotas, o Fundeb, o Enem, o Plano Nacional de Educação, o Pronatec e fizemos quatro vezes mais escolas técnicas do que fizeram antes em cem anos. Criamos o futuro."


Carta do presidente Lula ao povo brasileiro


Meus amigos e minhas amigas,

Vocês já devem saber que os tribunais proibiram minha candidatura a presidente da República. Na verdade, proibiram o povo brasileiro de votar livremente para mudar a triste realidade do país.

Nunca aceitei a injustiça nem vou aceitar. Há mais de 40 anos ando junto com o povo, defendendo a igualdade e a transformação do Brasil num país melhor e mais justo. E foi andando pelo nosso país que vi de perto o sofrimento queimando na alma e a esperança brilhando de novo nos olhos da nossa gente. Vi a indignação com as coisas muito erradas que estão acontecendo e a vontade de melhorar de vida outra vez.

Foi para corrigir tantos erros e renovar a esperança no futuro que decidi ser candidato a presidente. E apesar das mentiras e da perseguição, o povo nos abraçou nas ruas e nos levou à liderança disparada em todas as pesquisas.

Há mais de cinco meses estou preso injustamente. Não cometi nenhum crime e fui condenado pela imprensa muito antes de ser julgado. Continuo desafiando os procuradores da Lava Jato, o juiz Sérgio Moro e o TRF-4 a apresentarem uma única prova contra mim, pois não se pode condenar ninguém por crimes que não praticou, por dinheiro que não desviou, por atos indeterminados.

Minha condenação é uma farsa judicial, uma vingança política, sempre usando medidas de exceção contra mim. 


Eles não querem prender e interditar apenas o cidadão Luiz Inácio Lula da Silva. Querem prender e interditar o projeto de Brasil que a maioria aprovou em quatro eleições consecutivas, e que só foi interrompido por um golpe contra uma presidenta legitimamente eleita, que não cometeu crime de responsabilidade, jogando o país no caos.

Vocês me conhecem e sabem que eu jamais desistiria de lutar. Perdi minha companheira Marisa, amargurada com tudo o que aconteceu a nossa família, mas não desisti, até em homenagem a sua memória. Enfrentei as acusações com base na lei e no direito. Denunciei as mentiras e os abusos de autoridade em todos os tribunais, inclusive no Comitê de Direitos Humanos da ONU, que reconheceu meu direito de ser candidato.

A comunidade jurídica, dentro e fora do país, indignou-se com as aberrações cometidas por Sergio Moro e pelo Tribunal de Porto Alegre. Lideranças de todo o mundo denunciaram o atentado à democracia em que meu processo se transformou. A imprensa internacional mostrou ao mundo o que a Globo tentou esconder.

E mesmo assim os tribunais brasileiros me negaram o direito que é garantido pela Constituição a qualquer cidadão, desde que não se chame Luiz Inácio Lula da Silva. Negaram a decisão da ONU, desrespeitando do Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos que o Brasil assinou soberanamente.

Por ação, omissão e protelação, o Judiciário brasileiro privou o país de um processo eleitoral com a presença de todas as forças políticas. Cassaram o direito do povo de votar livremente. Agora querem me proibir de falar ao povo e até de aparecer na televisão. Me censuram, como na época da ditadura.


Talvez nada disso tivesse acontecido se eu não liderasse todas as pesquisas de intenção de votos. Talvez eu não estivesse preso se aceitasse abrir mão da minha candidatura. Mas eu jamais trocaria a minha dignidade pela minha liberdade, pelo compromisso que tenho com o povo brasileiro.

Fui incluído artificialmente na Lei da Ficha Limpa para ser arbitrariamente arrancado da disputa eleitoral, mas não deixarei que façam disto pretexto para aprisionar o futuro do Brasil.

É diante dessas circunstâncias que tenho de tomar uma decisão, no prazo que foi imposto de forma arbitrária. 


Estou indicando ao PT e à Coligação “O Povo Feliz de Novo” a substituição da minha candidatura pela do companheiro Fernando Haddad, que até este momento desempenhou com extrema lealdade a posição de candidato a vice-presidente.


Fernando Haddad, ministro da Educação em meu governo, foi responsável por uma das mais importantes transformações em nosso país. Juntos, abrimos as portas da Universidade para quase 4 milhões de alunos de escolas públicas, negros, indígenas, filhos de trabalhadores que nunca tiveram antes esta oportunidade. Juntos criamos o Prouni, o novo Fies, as cotas, o Fundeb, o Enem, o Plano Nacional de Educação, o Pronatec e fizemos quatro vezes mais escolas técnicas do que fizeram antes em cem anos. Criamos o futuro.

Haddad é o coordenador do nosso Plano de Governo para tirar o país da crise, recebendo contribuições de milhares de pessoas e discutindo cada ponto comigo. Ele será meu representante nessa batalha para retomarmos o rumo do desenvolvimento e da justiça social.

Se querem calar nossa voz e derrotar nosso projeto para o País, estão muito enganados. Nós continuamos vivos, no coração e na memória do povo. E o nosso nome agora é Haddad.

Ao lado dele, como candidata a vice-presidente, teremos a companheira Manuela D’Ávila, confirmando nossa aliança histórica com o PCdoB, e que também conta com outras forças, como o PROS, setores do PSB, lideranças de outros partidos e, principalmente, com os movimentos sociais, trabalhadores da cidade e do campo, expoentes das forças democráticas e populares.

A nossa lealdade, minha, do Haddad e da Manuela, é com o povo em primeiro lugar. É com os sonhos de quem quer viver outra vez num país em que todos tenham comida na mesa, em que haja emprego, salário digno e proteção da lei para quem trabalha; em que as crianças tenham escola e os jovens tenham futuro; em que as famílias possam comprar o carro, a casa e continuar sonhando e realizando cada vez mais. Um país em que todos tenham oportunidades e ninguém tenha privilégios.

Eu sei que um dia a verdadeira Justiça será feita e será reconhecida minha inocência. E nesse dia eu estarei junto com o Haddad para fazer o governo do povo e da esperança. Nós todos estaremos lá, juntos, para fazer o Brasil feliz de novo.

Quero agradecer a solidariedade dos que me enviam mensagens e cartas, fazem orações e atos públicos pela minha liberdade, que protestam no mundo inteiro contra a perseguição e pela democracia, e especialmente aos que me acompanham diariamente na vigília em frente ao lugar onde estou.

Um homem pode ser injustamente preso, mas as suas ideias, não. Nenhum opressor pode ser maior que o povo. Por isso, nossas ideias vão chegar a todo mundo pela voz do povo, mais alta e mais forte que as mentiras da Globo.


Por isso, quero pedir, de coração, a todos que votariam em mim, que votem no companheiro Fernando Haddad para Presidente da República. 

E peço que votem nos nossos candidatos a governador, deputado e senador para construirmos um país mais democrático, com soberania, sem a privatização das empresas públicas, com mais justiça social, mais educação, cultura, ciência e tecnologia, com mais segurança, moradia e saúde, com mais emprego, salário digno e reforma agrária.


Nós já somos milhões de Lulas e, de hoje em diante, Fernando Haddad será Lula para milhões de brasileiros.

Até breve, meus amigos e minhas amigas. Até a vitória!

Um abraço do companheiro de sempre,

Luiz Inácio Lula da Silva










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06 setembro 2018

Governança Pública: uma visão aplicada


Contribuição ao seminário sobre Governança Pública e Desenvolvimento Social realizado pelo Ministério do Desenvolvimento Social - MDS.





Realizada em Brasília, 5 de setembro de 2018, no auditório do Instituto Nacional do Seguro Social - INSS.


As opiniões do autor não representam necessariamente as do Ipea ou do MDS.





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03 setembro 2018

Você não conhece este cara, mas deveria


Ele é autor da explicação mais didática que você já viu sobre austeridade.







O nome dele é Richard D Wolff. 

Economista, foi professor das prestigiadas universidades de Yale e Massachusetts. 

É autor de vários livros, tem um programa de rádio, um canal no Youtube.

Foi considerado pelo jornal The New York Times como "o mais proeminente economista marxista dos Estados Unidos. 



Richard David Wolff (born April 1, 1942) is an American Marxian economist, well known for his work on Marxian economics, economic methodology, and class analysis. He is Professor of Economics Emeritus, University of Massachusetts, Amherst, and currently a Visiting Professor in the Graduate Program in International Affairs of the New School University in New York. Wolff has also taught economics at Yale University, City University of New York, University of Utah, University of Paris I (Sorbonne), and The Brecht Forum in New York City. In 1988 he co-founded the journal Rethinking Marxism. In 2010, Wolff published Capitalism Hits the Fan: The Global Economic Meltdown and What to Do About It, also released as a DVD. He released three new books in 2012: Occupy the Economy: Challenging Capitalism, with David Barsamian (San Francisco: City Lights Books), Contending Economic Theories: Neoclassical, Keynesian, and Marxian, with Stephen Resnick (Cambridge, Massachusetts, and London: MIT University Press), and Democracy at Work (Chicago: Haymarket Books). Wolff hosts the weekly hour-long radio program Economic Update on WBAI, 99.5 FM, New York City (Pacifica Radio) and is featured regularly in television, print, and internet media. The New York Times Magazine has named him "America's most prominent Marxist economist". The National Debt Explained(port)

Sources:
https://en.wikipedia.org/wiki/Richard_D._Wolff
https://www.youtube.com/user/RichardD...











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