30 janeiro 2023

O que aconteceu quando o Brasil experimentou Estado mínimo e economia ultraliberal?



"De acordo com a versão 2020 da base Maddison, de 56 países para os quais há dados em 1930, o Brasil tinha a 4a menor renda per capita daquele ano. 
O Brasil terminou o período da República Velha como um país pobre em termos relativos e absolutos apesar de ser o país mais populoso da América Latina com grande mercado interno potencial. 
Em 1930 [fim da I República, ou República Velha], o Brasil, com cerca de 33,6 milhões de habitantes, respondia por 31% da população da América Latina (107,4 milhões de habitantes), contra 15,4% do México e 11,1% da Argentina."
“De 1889 a 1930, o desempenho da economia brasileira não poderia deixar de decepcionar os que esperavam que as tendências liberalizantes desses anos pudessem acelerar o crescimento do país: o PIB per capita cresceu a uma taxa anual de cerca de 0,9% que contrasta com os cerca de 3% anuais do período 1929-1980 (encadeando Goldsmith para 1890-99 e Haddad para1900- 1930 cf. Bacha e Greenhill, 1992, p. 321 e Maddison, 2006, p. 76). 
Numa comparação direta com outros países, tomando-se em cada ponto de observação o dado para o Brasil como igual a 100, o múltiplo do PIB per capita da Argentina passou de 271 para 377 entre 1890 e 1928-29, enquanto as cifras correspondentes para o México foram 127 e 157 respectivamente. Ou seja, ampliou-se o atraso entre o Brasil e esses países nesses anos. 
Com relação aos EUA, também aumentou a distância, pois os índices foram 427 e 587 para as mesmas datas, enquanto que relativamente ao Reino Unido, o hiato se reduziu com relação aos EUA e ao Reino Unido entre 1913 e 1928-29, mas apenas ligeiramente; só depois de 1930 ocorreram reduções expressivas nessas proporções.” (Gustavo H. B. Franco e Luiz Aranha Correa do Lago, A Economia da República velha, 1889-1930)" 

Felipe Augusto Machado, "Por que abandonamos a mentalidade que nos desenvolvia?" (extrato publicado no site do Paulo Gala): https://rib.ind.br/debate-com-samuel-pessoa-texto-6-por-que-abandonamos-a-mentalidade-que-nos-desenvolvia/














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29 janeiro 2023

"A defesa da independência do banco central, como foi apresentada na literatura econômica na década de 1980, foi uma desgraça acadêmica."

"Isso é ameaçador e, às vezes, aterrador por si só."
James Forder, Balliol College, Oxford, UK, e diretor de pesquisas do Institute of Economic Affairs (IEA),  think tank britânico.

"Foi, antes de tudo, intelectualmente uma desgraça. A tão alardeada teoria da credibilidade nem sequer sustentava a proposta; o "viés legalista" de ler estatutos para descobrir comportamento foi contra a compreensão até mesmo de um aluno do primeiro ano da graduação sobre a importância de incentivos e restrições; as correlações simples em que tais medidas de independência foram usadas para demonstrar seu efeito sobre a inflação seriam rejeitadas de cara em uma banca de mestrado, mesmo sem a circularidade de selecionar medidas conforme sua aderência à correlação com a variável a ser explicada. 
Também foi uma desgraça profissional provocar tão poucos comentários críticos ou contrários. Houve um imenso groupthinking. E não alivia a questão que havia tantos economistas que poderiam ter pensado que tinham algo a ganhar com a aceitação das idéias. A complacência quanto à desejabilidade da independência seguiu-se à quase unanimidade de opinião que se desenvolveu. 
Isso é ameaçador e, às vezes, aterrador por si só."

A análise é de James Forder, do Balliol College, Oxford, UK, e diretor de pesquisas do Institute of Economic Affairs (IEA ),  think tank britânico. (Leia em: Forder, James. "The fallacies of central bank independence." Economic Affairs 42, no. 3 (2022): 549-558. Available at https://onlinelibrary.wiley.com/doi/epdf/10.1111/ecaf.12554) e entrevista em https://iea.org.uk/films/central-bank-independence-time-for-a-rethink/

Até mesmo institutos ultraliberais recomendam bancos centrais independentes mais para países em desenvolvimento do que para si próprios - na linha do faça o que eu digo, mas não faça o que eu faço. A exemplo, o Cato (think tank libertário americano financiado, entre outros, pelas indústrias Koch) avalia: 

"A forte ênfase na ideia de bancos centrais independentes levou a uma visão estreita do papel dos bancos centrais. Como resultado, os bancos centrais desconheciam os riscos para a estabilidade financeira e estavam mal preparados para responder à crise financeira. No mundo dos mercados emergentes menos desenvolvidos, haver bancos centrais independentes melhorou a gestão e a governança de políticas [monetárias]." (Cato).


É bom lembrar que até mesmo Milton Friedman, em um artigo de 1962, intitulado Deve haver uma autoridade monetária independente? (Should There Be an Independent Monetary Authority?), dizia que instituir bancos centrais independentes seria como criar "uma espécie de Constituição monetária" sem qualquer controle democrático sobre suas metas e resultados.

 

"Parece-me altamente duvidoso que os Estados Unidos, ou qualquer outro país, tenha tido na prática um banco central independente no sentido mais amplo do termo. Mesmo quando os bancos centrais supostamente eram totalmente independentes, eles exerceram sua independência apenas enquanto não houve conflito real entre eles e o governo. Sempre que houve um grave conflito, como em tempos de guerra, entre os interesses das autoridades fiscais em captar recursos e os interesses das autoridades monetárias em manter a conversibilidade em espécie, o banco quase sempre cedeu, em detrimento da autoridade fiscal." (Friedman, , M. (1962) “Should There Be an Independent Monetary Authority?” In L. B. Yeager (ed.), In Search of a Monetary Constitution, 219–43. Cambridge, Mass.: Harvard University Press. https://doi.org/10.4159/harvard.9780674434813.c9).

Para Friedman, era inadmissível “em uma democracia haver tanto poder concentrado em um órgão livre de qualquer tipo de controle político direto e efetivo”.






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10 janeiro 2023

Tá na hora de os fascistas já irem embora do serviço público

Servidor público fascista deve ser tratado como fascista, e não como servidor. Deve ser confrontado e destituído pelo Estado democrático de direito com as credenciais legais e democráticas já existentes.

A maioria das pessoas já percebeu que, apesar de todo o espetáculo dantesco de destruição e performances escatológicas, os grandes responsáveis pela vandalização das sedes dos Poderes da República, mais do que as pessoas vestidas de verde e amarelo e os que, de longe, financiaram o caos, foram os homens de preto, ou seja, os responsáveis pelo aparato policial militar que deveria conter os invasores da Terra Plana.


Por sorte, parece que caiu no chão aquela caneta que os homens de preto normalmente usam para apagar a memória recente dos fatos. Ao contrário, o colaboracionismo ficou explícito em selfies usadas para registrar seu êxtase naquele momento.

A destruição aconteceu não apenas porque algumas pessoas apedrejaram, chutaram, cuspiram, urinaram e defecaram nos Palácios. Ficou evidente que os grandes responsáveis foram os que cruzaram os braços diante daquelas cenas.

Para além dos terroristas e dos financiadores do caos, precisamos falar de uma outra categoria que virou pilar do fascismo no país: os sabotadores custeados com dinheiro público. Esses sabotadores estatais são funcionários públicos civis ou militares que, embora pagos regiamente para cumprir a lei e a ordem do Estado democrático de direito, preferem agir como milícias.

O aparato policial que conduziu e facilitou a invasão dos palácios na Praça dos Três Poderes foi escolhido a dedo pelo então secretário e ex-ministro do bolsonarismo, Anderson Torres, mas ele não teve lá tanto trabalho. A PM do DF já havia feito uma "excelente" avant-première em dezembro de 2022, quando não moveu um único dedo para conter a queima de ônibus e carros de passeio após a tentativa de invasão da sede da PF. 

O que se viu, nas duas ocasiões, foi exatamente a polícia se comportar como milícia. Não todos os policiais, mas sobretudo os que comandam a PM mais bem paga do país parecem satisfeitos e se regozijam de achar que fazem o que lhes dá na telha com o dinheiro que recebem para proteger a Capital, as autoridades e os Poderes da República.

Por isso, uma das decisões mais importantes tomadas na esteira da grande destruição do dia 8 não pode passar despercebida. Tanto quanto a intervenção Federal na segurança pública do DF e o afastamento do governador Ibaneis Rocha, é preciso fazer valer a orientação da CGU para que todos os servidores públicos envolvidos nessas manifestações sejam devidamente identificados, processados administrativamente e punidos por terem atentado, "principalmente, contra o Estado Democrático de Direito".

Essa orientação pode e deve ser entendida também como a identificação, processo e punição de todo e qualquer servidor que tenha contribuído com o patrocínio financeiro ou a propagação de mensagens favoráveis ao golpe de Estado frustrado. Independentemente de essa pessoa ter participado ou não e de ter gostado ou não do quebra-quebra, o que importa é o grau de adesão desses servidores ao golpismo; sua indecorosa traição à Constituição; a postura antiética de desprezo à sua função de servidor público.

Servidor público fascista deve ser tratado como fascista, e não como servidor. Deve ser confrontado e destituído pelo Estado democrático de direito com as credenciais legais e democráticas já existentes.

Os fascistas, em especial os libertarianistas deitados eternamente no berço esplêndido de seus empregos públicos, têm a chance de ouro de abandonar a esquizofrenia de serem pagos pelo Estado para serem anti-Estado. O único gasto com dinheiro público que se pode admitir com um golpista é o de custear sua estada na Papuda. 

Eles podem e devem buscar algum emprego, quem sabe, no banco BTG Pactual, que acabou de contratar dois ex-ministros ultrabolsonaristas como sócios. Podem também assumir um cargo de gerente em alguma loja da Havan ou de chapeiro do Madero. 

Parece que as únicas vagas que não estão mais disponíveis são as que o PL ofereceu, com direito a um senhor salário e uma bela mansão com vista para o Lago Paranoá. O STF, em tempo, resolveu poupar esse partido de usar recursos públicos para patrocinar fascistas com um fundo que eles fingiam abominar.

* Antonio Lassance, servidor público, historiador e cientista político.




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