15 abril 2012

Pressão política da indústria brasileira


Maior beneficiada pelas últimas ações do governo, a indústria está pronta para aumentar a pressão no Congresso, auxiliando a base governista na aprovação de medidas de interesse do setor, como a resolução 72, que acaba com a guerra dos portos.

Extraído da matéria de Vivian Oswald e Martha Beck, "Dilma pode rever incentivo à indústria", publicada em O Globo, 15/04/2012.
 
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O presidente da Confederação Nacional da Indústria (CNI), Robson Andrade, disse que está convocando empresários de subsetores para encontros com senadores e deputados em Brasília e nos estados, com o objetivo de alertá-los da importância de se aprovar projetos que dão competitividade à produção.

- Estamos montando a agenda dos encontros com parlamentares.

Montadoras podem ser primeiro alvo

Enquanto isso, o setor aguarda uma ação concreta do governo para reduzir custos da energia. O alto custo desse insumo é uma das principais queixas da indústria. Estudo da Federação das Indústrias do Rio de Janeiro (Firjan) mostra que a tarifa industrial de consumo de energia chega a uma média de R$ 329 por megawatt-hora (MWh). Trata-se de 53% acima da média global. Nos EUA, é de R$ 117,4 por MWh.

- A presidente está pressionando sua equipe para encontrar soluções que reduzam o custo da energia - disse uma fonte.

Setor tradicionalmente contemplado com pacotes de estímulo, as montadoras ameaçam aumentar os preços de veículos para se adaptar ao novo regime tributário para a concessão de incentivos, o que, para interlocutores, não agradou à presidente, que pode torná-lo o primeiro alvo da reação do governo.

Apesar dos esforços de Dilma, o ex-secretário de Política Econômica do Ministério da Fazenda Julio Gomes de Almeida considera o pacote anunciado bom "para apagar incêndio". Não resolve questões cruciais: câmbio, custo Brasil e produtividade. E, por isso, não descarta uma piora no mercado de trabalho, prevendo até agravamento das demissões em 2012. A queda desde 2009 poderia chegar a 1%:

- O freio nas contratações só não foi pior porque o mercado interno é pujante, tendo crescido em torno de 25% nesses três anos. Já a indústria de bens de consumo declinou 2%. A indústria tem a China no cangote.

- Mal ou bem, houve crescimento na economia, segurando as demissões. Mas o futuro é uma grande incógnita - acrescentou João Saboia, professor da UFRJ.

Outros fatores pesaram na decisão de a indústria cortar menos postos do que o esperado. Gomes cita o custo da demissão com um deles.

- Mesmo com uma indústria retraída, não se pode ignorar o problema de falta de mão de obra. Então, o empresário segura as demissões para não ter que cortar pessoal e mais à frente, com uma retomada, enfrentar dificuldades para contratar.

A maior participação dos países asiáticos na produção global - que saltou de 15% em meados da década de 1970 para mais de 40% atualmente - abocanhou espaços ocupados pela indústria brasileira. Caso dos calçados.

- O país não precisa descartar setores, mas precisa parar de insistir em segmentos que já foram perdidos. Não é para abrir mão de toda uma cadeia produtiva, mas sim elencar onde é possível investir e se diferenciar - disse Gomes.

E a indústria vem perdendo participação no total das vagas criadas no país, mostrou o Caged, do Ministério do Trabalho. As vagas criadas na indústria que, em 2004, eram 30%, em 2011 passaram a ser 11%.

- O setor de serviços avança, abocanhando parte dessas vagas. Mas essas vagas não exigem tanta especialização - disse Abritta, do IBGE

As adversidades levaram o empresário Georges Tomic, dono da Stenville Têxtil, em Jundiaí (SP), a recuar nos planos de expansão. Em 2007, Tomic investiu R$ 3,5 milhões em ampliação e diversificação das atividades de beneficiamento e tingimento de tecidos. A produção saltou de 200 toneladas por mês para 321 mil toneladas em 2011. Mas as medidas para conter o consumo combinadas com a alta do real viraram o jogo dos negócios:

- Não foi um freio de arrumação, mas de parada. Que foi seguida pela forte valorização do real, que expôs todas as mazelas que temos no país.

O câmbio trouxe a invasão dos produtos chineses, os pedidos dos lojistas caíram e a Stanville teve de desativar as atividades de confecção e tecelagem, voltando a concentrar-se no tingimento. Dos 130 empregados no início de 2011, 75 continuam na empresa.

- Tive de encerrar as atividades mais intensivas em mão de obra.

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De acordo com interlocutores da presidente, a estratégia é acompanhar com lupa os setores beneficiados pela segunda etapa do Brasil Maior - que chegou a R$ 60 bilhões, ao reforçar o capital do BNDES e desonerar a folha de pagamento de 11 novos segmentos. Caso as empresas não cumpram o compromisso informal firmado com o Executivo de, por exemplo, investir e não demitir pessoal, o governo poderá rever os incentivos.

- Várias medidas são passíveis de revisão. Sempre se pode retirar algum incentivo - admitiu um técnico.

A indústria, vedete da economia em 2010, teve crescimento minguado em 2011 e retração nos últimos cinco meses. O mercado de trabalho no setor encolheu 0,7% entre 2009 e 2011, mostra levantamento exclusivo feito pelo IBGE para O GLOBO. Câmbio desfavorável e forte concorrência com importados (leia-se: China) foram os principais freios da produção, além da criação de vagas em setores como vestuário (-12,6%), calçados e couro (-8,1%) e madeira (-28,9%). Mas, segundo analistas, poderia ser pior - e ainda pode ser.

Em reunião com a presidente Dilma, no mês passado, 28 pesos-pesados do setor produtivo - metade do Produto Interno Bruto (PIB) do país - reclamaram do câmbio sobrevalorizado, pediram redução da carga tributária, do custo da mão de obra e de encargos financeiros. Também reivindicaram o fim da guerra fiscal nos portos brasileiros e uma solução para os gargalos de logística, com destaque para o alto custo de energia no país.

Nos últimos cincos anos, foram gastos R$ 350 bilhões em incentivos, sendo R$ 310 bilhões em capitalizações do BNDES e R$ 40 bilhões em desonerações tributárias.

 
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