19 abril 2012

O que é o presidencialismo de coalizão?

A explicação de Argelina Figueiredo:
"O presidencialismo de coalizão é uma prática antiga do país. E as coalizões supermajoritárias já existiam na República de 1946. A média de cadeiras da base de apoio era maior do que hoje – e naquela época não havia reforma constitucional. Esta supermaioria dá ao governo flexibilidade. O governo ganha [a votação] e permite aos partidos que eles atendam às suas necessidades, como a do voto pessoal, de alguns parlamentares".

Valor: O PDT votou contra o governo em projetos que são muito caros à sua base eleitoral, parte dela ligada ao sindicalismo, como no salário mínimo e na FUNPRESP. Este seria um exemplo de que a turbulência na base aliada é mais complexa do que a demanda por cargos?


Argelina: Lógico. E isso tudo é confundido com chantagem à presidente. Na verdade, o partido tem a política geral, que seus integrantes apoiam, e o deputado tem que ter uma certa liberdade. E isso é um aspecto que explica por que há uma coalizão tão grande no Brasil. Há uma diferença entre presidencialismo e parlamentarismo. No presidencialismo, como você sabe que a vitória numa votação não é tão importante em termos de possibilidade de um voto de não confiança, o presidente pode se arriscar um pouco mais. Se o presidente tem uma coalizão relativamente grande, ele pode permitir que certos deputados votem contra o governo, porque eles precisam manter o nome em suas bases eleitorais. O Arnaldo Faria de Sá (PTB-SP), que é um cara com base nos aposentados, não pode votar contra aposentado. Agora, isso está relacionado, claro, a quanto o deputado depende ou não do partido para ser eleito. Um deputado que não tem muito voto pessoal não pode fazer isso. Vai ter que ir contra a base dele.

Valor: É o jeito de lidar com um sistema no qual os parlamentares devem seu mandato tanto ao voto pessoal quanto ao partido?

Argelina: A grande característica no conjunto de instituições que se tem no Brasil, principalmente quanto ao sistema eleitoral, sempre defendo isso, é que você pode combinar as duas coisas. A rigor, qualquer coisa que se compare Brasil com Argentina; por exemplo, aqui se combina tudo, se concilia tudo, enquanto na Argentina, você vai pro pau. Em tudo. No Brasil, você mudou de monarquia para República e se mantiveram os membros do Judiciário. Na Argentina, dentro de um governo, há uma mudança radical.

Valor: É uma vantagem para o Brasil?


Argelina: Eu acho que sim. A política está no meio. O centro é o grande fator de estabilidade. Por que você teve a queda [do regime democrático] em 1964? O centro se rompeu. Você teve uma radicalização que foi o principal fator que levou ao golpe. Se você mantém o centro, sem mudar a política, não é bom, óbvio. Mas mudando… Acho que o que as pessoas não veem no Brasil é isso: o quanto o Brasil mudou de 1989 ou de 1985 para cá, em todos os indicadores.

Trechos da entrevista a Cristian Klein, publicada no jornal Valor Econômico, 12 de abril de 2012.


Argelina Figueiredo é pesquisadora do Cebrap. Ph.D. pelo Departamento de Ciência Política da Universidade de Chicago (EUA). Coordenadora da área de Política e Sociedade do CEBRAP e Professora Associada do Instituto Universitário de Pesquisas do Rio de Janeiro (IUPERJ). Co-autora de "Executivo e Legislativo na nova ordem constitucional", junto com Fernando Limongi, um livro obrigatório sobre o presidencialismo de coalizão brasileiro.



 
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