06 janeiro 2012

Revolução no transporte urbano: público tem prioridade sobre carro

Claro que tudo vai depender dos prefeitos a serem eleitos em 2012.

A matéria de André Barrocal (Carta Maior) mostra os avanços da Lei  da Mobilidade Urbana, feita para melhorar as condições de tráfego nas cidades e fortalecer o transporte coletivo de qualidade.

Ressalta também os vetos à proposta original enviada pelo Governo Lula.

A charge desta postagem é de Will Eisner, que retratava como ninguém sua cidade hiperpovoada, Nova York.

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Revolução no transporte urbano: público tem prioridade sobre carro


É o que diz a primeira lei de 2012. Governos podem impor rodízios e taxar uso de carros por razões de tráfego e ambientais. Verba irá para ônibus, trem e metrô. Empresas de ônibus serão escolhidas por licitação, o que dará controle e transparência às tarifas, elevadas 50% além da inflação em 10 anos. Veto de Dilma a texto de Lula impede solução para 'regressividade tarifária'.

André Barrocal, 06/01/2012

BRASÍLIA – O eleitoral ano de 2012 começa com uma pequena revolução numa das áreas mais importantes no cotidiano do cidadão comum, que irá às urnas em outubro escolher o prefeito da cidade em que mora. Uma lei federal publicada quarta-feira (4) inverte uma lógica não escrita mas praticada de que o uso de carro particular orienta políticas públicas em transportes.

A partir de abril, quando a lei entrar em vigor, o transporte coletivo terá de ser o grande protagonista nas decisões governamentais sobre o deslocamento urbano das pessoas.

Para desestimular o uso de carros e arrumar dinheiro para investir mais em ônibus, metrô e trem, estados e municípios poderão taxar a circulação de veículos em determinadas áreas, como fazem cidades como Londres e Estocolmo, por exemplo.

Pela mesma razão – e também por motivos ambientais –, estados e prefeituras estão autorizados a montar um rodízio de carros, algo que, se já existe hoje em São Paulo, carecia de um respaldo jurídico mais firme para sobreviver a contestações na Justiça, como agora acontece com a sanção da lei que cria a Política Nacional de Mobilidade Urbana.

O preço das passagens de transporte público, especialmente de ônibus, também vai sofrer impacto com a nova lei – e para melhor, do ponto de vista dos cidadãos. A empresa que opera as linhas municipais terá de ser escolhida pela prefeitura por licitação, não mais por uma opção individual do prefeito. Vencerá a concorrência quem oferecer o menor preço.

A exigência de licitação vai tornar o processo mais transparente. Hoje, a empresa é escolhida só com base no desejo da prefeitura, que fixa a tarifa periodicamente a partir de estimativas sobre quantidade de passageiros e o custo para transportar cada um.

Essa prática torna o processo mais sujeito a interesses políticos. Em São Paulo, por exemplo, o prefeito Gilberto Kassab, cujo mandato termina este ano e certamente tentará ver um aliado como sucessor, não prevê reajuste da tarifa. Fez o mesmo em 2008, quando se reelegeu, prometendo manter a tarifa congelada em 2009. Mas no ano seguinte subiu-a em 17%.

Esse modelo desregulado permitiu que, nos últimos dez anos, a tarifa de ônibus subisse 50% acima do índice de inflação calculado com base no custo de vida das pessoas de baixa renda, chamado de INPC. E desestimula a eficiência das empresas operadores, porque se o custo de transportar um passageiro cai, a tarifa pode baixar também.

Outro ganho potencial para o usuário com a nova lei é a imposição de que em todos os pontos de ônibus e estações de trem e metrô e trem haja informações gratuitas sobre itinerários, preços, horários e possibilidade de integração com outros meios de transporte.

Problemas
O objetivo da Política Nacional de Mobilidade Urbana é aproximar governo federal, estados e prefeituras no planejamento e execução de ações de transporte público, definindo o que cada um faz e como podem agir em conjunto, tendo em vista que é de interesse da população que as cidades fiquem mais amigáveis.

Pelo texto, o governo federal está agora obrigado por lei a dar suporte a financeiro a investimento em metrô, algo que vinha sendo feito desde o segundo mandato do ex-presidente Lula mas por uma opção do próprio governo.

Mas também há alguns problemas na lei resultante de projeto enviado pelo governo Lula ao Congresso em 2007 e que teve aval dos deputados em agosto de 2010 e dos senadores, em dezembro do ano passado. Alguns estão apontados em estudo do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea).

Segundo o Ipea, a lei erra ao não prever fontes de financiamento estáveis e permanentes para investimento em transporte público, por exemplo. E, graças a uma decisão da presidenta Dilma Rousseff a pedido da equipe econômica do governo, a lei publicada erra ao não atacar o que seria uma distorção do sistema de transporte coletivo atualmente: quem usa e paga subsidia quem usa e não paga.

Essa é uma questão politicamente delicada de ser resolvida. Hoje, as tarifas de ônibus e metrô são definidas com base no fluxo de passageiros, mas há certas categorias de usuários que têm acesso livre (idosos, policiais militares, carteiros) ou com desconto (estudantes).

Consequência: o usuário comum, em geral pessoas de renda menor, paga uma tarifa fixada num valor que também cubra o custo de transportar idosos e estudantes de forma privilegiada. “Isso traz um caráter regressivo à política tarifária”, diz o estudo do Ipea.

A lei votada no Congresso tentou resolver isso definindo que o custo do subsídio deveria ser pago por toda a sociedade, já que é ela, a sociedade em geral, que decidiu tratar de forma diferenciada policiais, carteiros, estudantes, idosos. Para isso, deveria ser aprovada uma lei específica apontando a origem dos recursos que cobririam o subsídio.

Essa proposta já fazia parte do texto original do projeto enviado pelo ex-presidente Lula ao Congresso. Mas acabou vetada da lei, quando sancionada por Dilma - que há quatro anos era chefe da Casa Civil, responsável por formatar todos os projetos do governo – a pedido do ministro da Fazenda, Guido Mantega, que também já era ministro em 2007 e, na ocasião, assinara o projeto junto com o ministro das Cidades de então, Márcio Fortes.
 
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