06 março 2012

No federalismo, Estados sempre fazem guerra fiscal

A diferença é quanto tempo elas duram. O cessar fogo depende do papel das supremas cortes.
É a opinião do professor de Direito da USP, Fernando Zilveti.


Supremo não cumpre papel de defesa da Constituição ao não resolver guerra fiscal
Fernando Zilveti *


A disputa entre Estados brasileiros por contribuintes investidores acirrou-se nos últimos anos. A Federação brasileira e seu mercado se tornaram praças de guerra, palcos de medidas normativas desencontradas.

Nesse teatro político encontramos espectadores pagantes e não pagantes. Nos camarotes blindados se encontram os não pagantes, os ministros do STF, que a tudo assistem impávidos.

Na incômoda plateia estão os pagantes, os contribuintes brasileiros que pouco entendem sobre o que se passa.

Os países organizados republicanamente em federações têm histórico de desentendimentos competitivos entre seus entes federados.


Não há federação fiscalmente uniforme, porque é da autonomia de Estados e municípios determinar os tributos sob sua competência.

A federação alemã, conhecida por seu rigor fiscal, há muito tempo tratou de federalizar os impostos sobre o consumo. Nem por isso desapareceram os conflitos entre seus Estados e comunas.

É o caso dos impostos comunais sobre o consumo de entretenimento. A corte tem reprimido os abusos.

Nos EUA não se encontra registro da expressão "guerra fiscal". Nem por isso a tensão entre os Estados tributantes deixa de existir.

O comércio eletrônico tem protagonizado disputas entre os Estados americanos e as empresas. A Suprema Corte está sendo acionada para pôr fim nessa disputa.

No Brasil, a superposição de tributos sobre mesmas riquezas levou a Constituição de 1988 a descrever competências tributárias, denominando os impostos um a um.

No que diz respeito ao ICMS, o convênio 66/88 entre os Estados procurou na unanimidade uma solução para a falta de consenso.

Com efeito, tão logo foi criado o malfadado convênio, ato contínuo se deu o descumprimento sistemático por parte dos Estados que se julgaram prejudicados.

Por diversas vezes o Supremo Tribunal Federal foi chamado a resolver a questão. Decide sem resolver. Alega falta de remédios constitucionais adequados. A ação de descumprimento de preceito fundamental poderia solucionar. Por que, então, ninguém propõe tal medida?

A desobediência pública da Constituição seria, afinal, problema ou tensão comum das federações? A questão, enfim, não está na desobediência pública. Está na corte que não cumpre seu papel de guardiã da Constituição.

* Livre-docente pela Faculdade de Direito da USP e professor de finanças da EAESP-FGV. Artigo publicado na Folha de S. Paulo em 04/03/2012.


 
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