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22 março 2016

No Brasil, quem menos paga imposto proporcionalmente (os ricos e a classe média alta) é quem mais reclama de imposto

Pobres e classe média baixa são os que sofrem o maior arrocho tributário e pagam o pato que a Fiesp só faz inflar.


A exemplo, veja as conclusões do estudo dos pesquisadores Sérgio Gobetti e Rodrigo Orair, do Ipea, que mostram como "medidas adotadas nas décadas de 1980 e 1990, por recomendação do "mainstream", restringiram o papel redistributivo do imposto de renda."

No estudo, "verifica-se elevado grau de concentração de renda no topo da distribuição, baixa progressividade e violação dos princípios da equidade horizontal e vertical."

"A principal razão dessas distorções é a isenção dos dividendos a acionistas, privilégio atípico nos países desenvolvidos. Propõe-se recuperar uma agenda de reforma tributária focada na progressividade, tema que voltou ao debate com Piketty (2014)."

Leia em IPC UNDP (arquivo pdf).
















O Brasil precisa de uma opinião pública melhor informada, atenta e democrática. Ou será um país de Estado ineficiente, capturado por interesses escusos, com governos fracos, oposição golpista, imprensa hipócrita e pessoas egoístas e intolerantes.
 
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TV incentiva desrespeito e assédio à mulher


Informação é de pesquisa do Instituto "Geena Davis" (aquela mesma do já clássico filme "Thelma e Louise").


Leia a matéria da EBC.



A ong de Geena Davis há mais de dez anos se dedica a estudar e discutir a presença da mulher no audiovisual no mundo e está no endereço http://seejane.org/



21 março 2016

Trumpocalipse Now

Uma parábola para todos os que fazem da política um exercício de preconceito, ódio e todo tipo de desrespeito.


As raízes da ascensão meteórica e assustadora de Donald Trump está na desastrosa estratégia deliberada do Partido Republicano de cultivar  o ódio e o preconceito. Deu tão "certo" que, agora, criaram um monstro que o próprio partido é incapaz de controlar.

A avaliação é do prêmio Nobel de economia Paul Krugman, em artigo no New York Times.

Para os chefes da oposição que foram escorraçados das manifestações, a lição é óbvia e ululante.

Desestabilizar um governo é relativamente fácil. Saber o que vem depois é inimaginável.
























O Brasil precisa de uma opinião pública melhor informada, atenta e democrática. Ou será um país de Estado ineficiente, capturado por interesses escusos, com governos fracos, oposição golpista, imprensa hipócrita e pessoas egoístas e intolerantes.
 
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Para entender o maquiavelismo contra as mulheres





“Apesar de parecer exclusivamente masculino, o mundo das obras políticas de Maquiavel, onde os homens competem na arena da história, é, na verdade, dominado, ou pelo menos continuamente ameaçado nos bastidores, por figuras femininas de imenso poder, mal percebidas e espectrais. 

Em aspectos cruciais, a competição entre os homens acaba por ser sua luta comum contra esse poder. O feminino constitui “o outro” de Maquiavel, em oposição à masculinidade e à autonomia em todos os sentidos: às condições de homem, de adulto, de humano, bem como à política.” 




Hanna Pitkin: "Eu não sei se me tornei uma feminista, porque eu não sei se mereço essa classificação laudatória, porque não sou na verdade a favor da libertação das mulheres enquanto tais ou pelos direitos das mulheres. Eu sou a favor do direito de todas as pessoas e de sua libertação.

Pergunta: Bem, uma justa definição de feminismo, embora não uma definição radical, apenas direitos iguais.

Hanna Pitkin: Bom, então, porque chamar isso de “feminismo”? Porque não chamá-los apenas de direitos? Isso é um problema… Eu certamente não sou hostil ao feminismo em geral." 

Leia a entrevista em Cedes. (link arquivo pdf)



Para entender mais como o maquiavelismo eternizou Maquiavel e sobre suas obras: http://antoniolassance.blogspot.com.br/2013/02/o-principe-500-anos.html
















O Brasil precisa de uma opinião pública melhor informada, atenta e democrática. Ou será um país de Estado ineficiente, capturado por interesses escusos, com governos fracos, oposição golpista, imprensa hipócrita e pessoas egoístas e intolerantes.
 
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15 março 2016

Atores, agendas e conjuntura: mapeamento, rasteamento e análise


Curso ministrado na Escola Nacional de Administração Pública 
para servidores públicos federais

Fevereiro de 2017

Programa


Mapas mentais:
FreeMup -  ferramenta online e aberta de mapas mentais
Use o programa de mapas mentais que você prefere ou, alternativamente, baixe o programa Freemind.
Confeccione seu mapa e faça o download em formato pdf para envio ao e-mail da Enap: aperfcarreiras@enap.gov.br   



Exemplo de estrutura do mapa mental: Mindmup.com ou em pdf

Referências básicas:

CAIRNEY, Paul. Policy Concepts in 1000 Words: The Advocacy Coalition Framework  https://paulcairney.wordpress.com/2013/10/30/policy-concepts-in-1000-words-the-advocacy-coalition-framework/ CAPELARI, Mauro G. M., Calmon, Paulo du Pin e ARAÚJO, Suely M. V. G. Coalizões de advocacia: levantamento das teses e dissertações nacionais. Brasília: Centro de Estudos Avançados de Governo e de Administração Pública - Ceag-UnB, 2014. Série Textos de Discussão Ceag-UnB 003/14 Disponível em <http://site.ceag.unb.br/ceagarquivos/public/arquivos/biblioteca/23368586224a 9daa2fd7a82ca9b2e46b.pdf>


KINGDON, John W. Como chega a hora de uma ideia? In: SARAVIA, Enrique e FERRAREZI, Elisabete (org.). Políticas públicas: coletânea. Brasília: ENAP, 2006. V. 1. Disponível em https://drive.google.com/file/d/1M6RBER7GEER_WYmY9ojXkcu-b46I3ZXQIpjOMibnaEBn42g1fDaCtjFTfdDt/view?usp=sharing

KINGDON, John W. Juntando as coisas. In: SARAVIA, Enrique e FERRAREZI, Elisabete (org.). Políticas públicas: coletânea. Brasília: ENAP, 2006. V. 1.  Disponível em <link>


NORTH, Douglass C. Instituciones, cambio institucional y desempeño económico. México: Fondo de Econômica, 1993. <link>




Referências complementares:
BRELÀZ, Gabriela de. Advocacy das organizações da sociedade civil: um estudo comparativo entre Brasil e Estados Unidos. S. Paulo: FGV, 2007. Dissertação de mestrado. Disponível em https://bibliotecadigital.fgv.br/dspace/bitstream/handle/10438/2444/136543.pdf?sequence=2&isAllowed=n


CAIRNEY, Paul Cairney and zahariadis, Nikolaos. Multiple streams analysis: A flexible metaphor presents an opportunity to operationalize agenda setting processes. Forthcoming in Handbook of Public Policy Agenda-Setting, Edited by Nikolaos Zahariadis, Edward Elgar, 2016. Avaiable at:   https://paulcairney.files.wordpress.com/2013/10/cairney-zahariadis-multiple-streams-2016.pdf


CRUZ, Sebastião C. Velasco e. Teoria e método na análise de conjuntura. Educação & Sociedade, ano XXI, n 145 o 72, Agosto 2000. Disponível em http://www.scielo.br/scielo.php?script=sci_arttext&pid=S0101-73302000000300008

GOMIDE, Alexandre Ávila. Agenda Governamental e Formulação de Políticas Públicas: o projeto de lei de diretrizes da política nacional de mobilidade urbana. Brasília: IPEA, 2008. Disponível em http://www.ipea.gov.br/sites/000/2/eventos/982.pdf

INSTITUTO DE PESQUISA ECONÔMICA APLICADA. Carta de Conjuntura. Brasília: IPEA. 14 de maio de 2012. http://www.ipea.gov.br/portal/index.php?option=com_alphacontent&view=alphacontent&Itemid=59

LASSANCE. Temas relevantes da agenda federativa. Brasília: IPEA, outubro de 2012. Disponível em <link>

GALA, Paulo. A Teoria Institucional de Douglass North. Revista de Economia Política, vol. 23, nº 2 (90), abril-junho/2003. Disponível em http://www.rep.org.br/pdf/90-6.pdf

SANTIAGO, Claudia e MORAES, Reginaldo Carmello de Moraes. Como fazer análise de conjuntura. Brasília: CNTE, 2008. http://www.cnte.org.br/images/stories/esforce/pdf/programaformacao_eixo02_fasciculo03_analiseconjuntura.pdf

SANTOS, Fábio Pereira dos. Coalizões de interesses e a configuração política da agricultura familiar no Brasil. S. Paulo: Fundação Getúlio Vargas, 2011. <link>

SARAVIA, E.  e FERRAREZI, E. Políticas públicas: coletânea. (Org.): Brasília: ENAP, 2006. Volumes 1 e 2. Disponível em <link >

SCHMEER, Kammi. Stakeholder analysis guidelines. Washington, D.C.: Center for Democracy and Governance, September 2000. <link>

WEIBLE, Christopher M., SABATIER, Paul A., JENKINS-SMITH, Hank C.; NOHRSTEDT, Daniel; HENRY, Adam Douglas, and DeLEON, Peter. A quarter century of the Advocacy Coalition Framework: an introduction to the special issue. The Policy Studies Journal, Vol. 39, No. 3, 2011, pp. 349-360. Disponível em <link>  

WOLF, Felipe. O comportamento dos deputados na Câmara Federal: uma abordagem de redes sociais. Brasília: Universidade de Brasília, 2008. Dissertação de mestrado Ipol/UnB. Disponível em <link>






03 março 2016

Jessé Souza: "O jeitinho é para quem pode. Mas não é só no Brasil. O jeitinho é universal, só não pode ser muito visível."


"A tese do patrimonialismo brasileiro serve para iludir o povo acerca de quem o está explorando."


Em entrevista ao jornal Zero Hora:

Quem é Jessé Souza
Nascido em Natal (RN), Jessé Souza, 55 anos, é professor na Universidade Federal de Juiz de Fora. Doutor em sociologia pela Universidade de Heidelberg (Alemanha), fez pós-doutorado em filosofia e psicanálise na New School for Social Research, de Nova York, e livre-docência em sociologia na Universidade de Flensburg (Alemanha). É também autor de A Modernização Seletiva: Uma Reinterpretação do Dilema Brasileiro (2000), A Ralé Brasileira: Quem é e Como Vive (2009) e Os Batalhadores Brasileiros: Nova Classe Média ou Nova Classe Trabalhadora? (2010). Desde o ano passado, preside o Ipea.

Seu livro faz uma dura crítica a Gilberto Freyre, Sérgio Buarque de Holanda e Raymundo Faoro. Não há nada desses clássicos que seja válido hoje?
Freyre é um grande historiador, talvez o maior do Brasil, e seus livros podem ser lidos para além de sua própria interpretação teórica. Não é preciso comprar a avaliação do autor sobre si mesmo. Também existem passagens brilhantes em Faoro e em Buarque. O problema é que eles imaginam um "conto de fadas para adultos" para explicar o Brasil, um mito nacional. Em Freyre, este mito ainda é positivo para produzir solidariedade nacional, enquanto em Faoro e Buarque trata-se do típico complexo de vira-latas. De qualquer forma, um mito, que não precisa ser nem é verdadeiro e serve a propósitos políticos, é péssimo para fundamentar uma ciência. Mas foi o que fizemos. É isto que entrou como uma espécie de segunda pele em toda avaliação que os brasileiros fazem de si mesmos. A gente nem reflete sobre isso. Foi naturalizado. E o fizemos engolindo todo o racismo não explicitado que está embutido na oposição entre as noções de espírito, moral e cognitivamente superior, e de corpo (emoção, afeto e sexo), moralmente inferior e com tendência ao logro e à corrupção. É incrível como as pessoas puderam comprar tamanha imagem depreciativa a respeito de si mesmas. Esse racismo contra si mesmo foi obra de um liberalismo _ do qual Buarque e Faoro foram pioneiros e fundadores na versão moderna do século 20 _ que endeusava os EUA como paraíso na terra. Não vejo vantagem alguma continuarmos com isso. Temos é de criticar e fazer melhor.

Por que a tese do patrimonialismo é um "conto de fadas para adultos"? Quando escreveram seus trabalhos, Freyre, Sérgio Buarque e Faoro queriam iludir o brasileiro?É um conto de fadas porque é falso de fio a pavio. A tese do patrimonialismo diz que o Estado é apropriado privadamente por uma elite de Estado, daí as críticas ao inchaço do Estado e ao aparelhamento político. Diz-se que o Estado é apropriado por dentro para tornar invisível que é apropriado por fora, por interesses de mercado. A tese do patrimonialismo brasileiro serve para iludir o povo acerca de quem o está explorando. Se todo governo em todo lugar é apropriado privadamente, o problema fundamental é se é apropriado por poucos ou se o é pela maioria. Entre nós, são alguns milhares de endinheirados que se apropriam tanto do Estado quanto dos mecanismos de mercado. Essa elite não está no Estado. É essa a verdadeira elite que construiu um mercado superfaturado com bens e serviços supercaros e muito ruins – que a privatização só piorou – e que explora a classe média todo dia com o superlucro e o superjuro. É essa elite que não paga imposto sobre a riqueza – deixando a conta para a classe média e os pobres –, já que compra, via financiamento privado de eleições, parte expressiva do parlamento para manter seus interesses representados dentro do Estado e nunca permitir leis impondo imposto sobre riqueza e patrimônio. É essa elite que, finalmente, controla a mídia que produz e distorce a informação de acordo com os interesses desse grupo, perfazendo assim todos os poderes que verdadeiramente importam em uma sociedade moderna. E ainda diz que o culpado de tudo de ruim é o Estado, que manda em tudo para não assumir a responsabilidade por nada. É ou não é um perfeito conto de fadas para transformar adultos inteligentes em tolos? Já a segunda parte da pergunta não tem importância aqui. Não estamos julgando pessoas e sim obras que estão aí para serem melhoradas e criticadas. Os autores podem não ter intencionado iludir os brasileiros, mas o trabalho deles se presta maravilhosamente a isso.


Para combater a hipótese de o Brasil reproduzir uma herança patrimonial ibérica, o senhor diz que Portugal não teve escravidão como o Brasil. Que diferença a escravidão provocou aqui?A escravidão é o nosso DNA. É quem somos por influência de instituições como família, produção econômica e política. Tamanho desprezo e abandono dos mais pobres não podem ser explicados de outro modo. A grande herança da escravidão é a aceitação como natural do abandono de pelo menos 30% da população sem condições de aprendizado real na escola e mais tarde sem chances no mercado de trabalho competitivo, e que vai ter de vender sua energia muscular em trabalhos domésticos, sujos e pesados. É a classe média, por sua vez explorada pelo 1% mais rico, que explora esses excluídos e lhes rouba o tempo que será investido em mais educação e mais trabalho valorizado. Os excluídos são condenados ao abandono eterno. Toda conversa de patrimonialismo e de demonização do Estado serve, antes de tudo, para deixar essas explorações e lutas de classe na sombra para que possam continuar para sempre.

Para o senhor, a ideologia liberal, ao mesmo tempo que ressalta a tese do jeitinho e critica o nosso suposto patrimonialismo, joga o todo o peso da corrupção nos ombros do Estado, propaga a ideia de um mercado virtuoso e convida a sociedade a se sentir pura e ética como o mercado. O brasileiro é menos ou mais corrupto que outros povos?O brasileiro definido como inferior, como guiado por emoções e inclinado à corrupção, é puro complexo de vira-latas. Não existe nem sequer o brasileiro em geral, já que cada classe tem tipos muito próprios. Não somos culturalmente piores ou melhores que ninguém. Na dimensão institucional, no entanto, podemos melhorar muito. No caso da corrupção, precisamos de melhor controle da relação entre política e economia para mitigar a compra da política pelo dinheiro. A compra de políticos e de partidos via financiamento privado é uma corrupção que todos vêm, mas que não choca ninguém. Afinal, é feita em proveito dos endinheirados. Nossa tradição de culturalismo vira-lata e de demonização do Estado quando ocupado pela esquerda distorce o tema da corrupção do nível institucional para o nível pessoal. Em vez de se discutir uma reforma política profunda, prefere-se manipular o povo e dizer que só um partido ou só alguns políticos têm culpa no cartório. É aí que temos a corrupção seletiva quando políticos do PSDB são blindados pela imprensa e outros são perseguidos impiedosamente.

Se a corrupção não é um traço cultural, qual sua origem no Brasil?A mesma origem que tem em todo lugar. Sempre que inexistam mecanismos institucionais efetivos de controle, as pessoas tendem a procurar o próprio benefício à custa dos demais.

Se existe jeitinho brasileiro, ele seria dos ricos, uma vez que o capital social depende antes do capital econômico e do cultural?O jeitinho é para quem pode. Mas não é só no Brasil. O jeitinho é universal, só não pode ser muito visível. Alguém fala da lavagem de dinheiro de grandes empresas multinacionais em paraísos fiscais? Por que ninguém acaba com os paraísos fiscais? A evasão de rendas e a sonegação fiscal são marcas do capitalismo desregulado, um eufemismo para a "corrupção legal". O ponto principal é a manipulação do público de modo a deslocar a atenção para a corrupção seletiva. Como não existe uma delimitação clara da corrupção, posto que está em todo lugar e faz parte do jogo de ganhar dinheiro, então tem de se criar um bode expiatório. Entre nós, é o Estado demonizado quando ocupado por partidos com interesses em inclusão social e redistribuição de riqueza, como em Getúlio, Jango, Lula e Dilma.


Para o senhor, há preconceito contra o Estado fomentado pelo mercado. Mas são evidentes as falhas nos serviços, como educação e transporte público de má qualidade. Como qualificar o Estado sem cair no discurso do Estado mínimo? A agenda da esquerda para o Estado parece sempre capturada pelos interesses das corporações de servidores. Há também preconceito da esquerda contra ferramentas de gestão.
Não sei se o mercado faz um serviço muito melhor que o Estado. Vamos comparar universidades privadas e públicas? A universidade pública é melhor que a privada porque atende aos filhos da classe média. É o serviço para os pobres que é ruim. Os pobres ou não possuem poder de pressão efetivo ou não sabem como exercê-lo. E quem explora a classe média, por exemplo, com um plano de saúde que é muito caro e comparativamente muito ruim são os endinheirados. Exceto o 1% mais rico, todos ganham com bons serviços públicos que precisam de formas alternativas de financiamento. A taxação da riqueza e do patrimônio, por exemplo, poderia garantir melhores serviços a todos. 

Os cartéis formados por grandes empresas para burlar concorrências no metrô de São Paulo e na Petrobras são provas de que a corrupção não é apenas estatal no Brasil?Sem dúvida, mas essas são apenas as formas mais óbvias.

O senhor afirma que os casos de corrupção são impulsionados por interesses privados, alojados no mercado. Mas, aceitando a tese de que tudo é caixa 2, na outra ponta partidos precisam de recursos para se financiar. Como romper esse ciclo?Este é o debate correto e inteligente. Ainda que não seja uma panaceia, acho que o financiamento público é importante se acoplado a medidas que tornem mais transparente a relação entre mercado e Estado. É possível mitigar e controlar a corrupção. Mas são sempre medidas de inovação institucional que melhoram a situação e não a absurda divisão infantil da sociedade entre honestos e corruptos. Tua questão é certeira, uma vez que implica em uma estratégia universal e não seletiva de combate à corrupção.

Escândalos de corrupção jogam a sociedade, a imprensa e o sistema político numa armadilha: um debate estéril para definir quais políticos são limpos e quais são corruptos, em uma troca de acusações sem fim. E o senhor faz uma dura crítica à imprensa nesse aspecto. Mas a imprensa não pode jogar esses escândalos para baixo do tapete. Como o país pode usar esses casos para melhorar e reduzi-los?A verdade é que parte da imprensa joga para baixo do tapete acusações que se referem, por exemplo, a Aécio Neves e Fernando Henrique. Não existe nem sequer a menção ou a menção é menor e atenuada de várias maneiras. A imprensa conservadora é parte vital do jogo de poder que está ganhando. A razão para isso é simples. O Brasil criou desde 1964 uma sociedade exclusiva para 20% da população. Um punhado de endinheirados na ponta e a classe média, que serve a esse grupo no mercado e no Estado. As mudanças recentes foram tímidas, mas desencadearam forte reação. Para o "partido da sociedade para poucos", o grande desafio é evitar o aprofundamento da inclusão social e da redistribuição de recursos. E o único recurso à mão é a corrupção seletiva para demonizar o Estado e partidos de esquerda. Pensemos juntos: como um punhado de poderosos pode legitimar a drenagem constante de recursos de todas as classes para seus bolsos? Tem-se que dizer que se faz algo bom para todos e não apenas visando ao próprio ganho. Tem-se, portanto, que mascarar o interesse egoísta no suposto interesse geral. É aí que entra a corrupção seletiva. Essa turma não tem interesse em um debate sobre reforma política séria. A corrupção tem de continuar dirigida a alvos escolhidos politicamente por interesses de ocasião. Minha tese é de que essa é a única estratégia de permanência no poder de uma classe de endinheirados que compra parte do Congresso e parte da imprensa para continuar a rapina secular da sociedade brasileira.


O livro classifica o mercado como uma forma de corrupção organizada. O capitalismo é por essência corrupto? Qual seria a alternativa?A manipulação da corrupção vive de sua vagueza e imprecisão. Até bem pouco tempo atrás, corrupto só podia ser o agente público no Brasil. Tamanha seletividade prova que a corrupção é um terreno de luta acerca do que é legítimo e do que é ilegítimo. As definições são fluidas de propósito para que se possa manipular. As agências de risco que maquiaram os balanços de empresas e de países na crise de 2008, a Volkswagen que engana seus clientes ou os bancos que vendem e ganham muito com títulos podres, isso tudo é ou não corrupção? E os bancos no Brasil, com seu lucro excepcional apenas fazendo intermediação financeira, sem nenhum risco e sem dinamizar a produção, isso é negócio ou privilégio? Qual a fronteira entre privilégio e corrupção? Quem define isso? É um bálsamo para o mercado ver que ninguém discute nada disso, mas apenas a corrupção pessoal dos políticos e da política. A atenção do público é desviada da real exploração e espoliação e dramatizada em um terreno em que os endinheirados e seus aliados podem decidir, inclusive, quem fritar e quem salvar. É a dominação perfeita e ainda com boa consciência. A alternativa é uma sociedade participativa e consciente, que não se deixe fazer de tola. Temos de ter debates e opiniões alternativas com direito à fala, senão o que temos é a lei do mais forte e o poder do dinheiro nu e cru.

O senhor chama a classe média de tola por acreditar no discurso liberal de que o mal está no Estado. Mas, se a classe média é o grupo com acesso ao estudo e à informação, como pode ser tão tola? Mais de 10 anos de governos de esquerda não seriam suficientes para mostrar o outro lado para a classe média?
Primeiro, a classe média é muito diversa. Temos a classe média moralista que é a tropa de choque dos endinheirados, posto que o moralismo produz uma satisfação real. O máximo para essa fração de classe é se ver como campeã da moralidade e, portanto, melhor que os outros. É uma satisfação infantil, mas é real. A demonização do Estado serve como uma luva para isso. Mas essa fração da classe média é enganada. Troca uma satisfação fabricada para ela por uma exploração total de seu trabalho e de suas rendas que vão para o bolso dos endinheirados. É uma classe média mais pelo capital econômico e menos pelo capital cultural. Lê e se informa pouco a não ser pela dose diária de veneno midiático. Existem outras frações, como a mais crítica e com mais leitura e reflexão. É minoritária, mas existe. Entre as duas, há uma classe média que se imagina morando em Oslo e desenvolve uma sensibilidade norueguesa se preocupando mais com plantas e caça às baleias do que com a pobreza e a miséria que a cercam. E existem combinações mais complexas entre elas. Esse é um terreno sobre o qual uma pesquisa empírica abrangente nos informaria melhor. Na verdade, pretendo estudar esse ponto em breve.

O PT sempre teve o apoio da classe média, e o Rio Grande do Sul é um exemplo disso. Por que o partido perdeu esse eleitor?Porque cometeu erros de estratégia e de avaliação. O eleitor típico do PT deveria ser o pobre em ascensão social e não a classe média manipulada pelo tema da corrupção seletiva desde Getúlio. O PT perdeu esse eleitor em ascensão porque não teve discurso para ele. O mote da nova classe média não ajudou em nada a construção de um discurso mais sóbrio e confiável.  Seu lugar foi tomado pela religiosidade evangélica. Teria sido possível, eventualmente, até uma aliança com este discurso mais religioso e ter consolidado seu lugar na base da sociedade. Outro erro foi imaginar que a mídia dominante ficaria com quem tivesse o poder de Estado. Erro grave. A mídia, que são empresas e não entidades públicas, fica sempre com quem tem o dinheiro. Por conta disso, as verdadeiras democracias precisam sempre garantir, por meios legais, a controvérsia pública, a opinião alternativa, a informação efetiva do cidadão. Sem isso, não existe democracia real, nem cidadão consciente e autônomo. Senão, ele vai ser formado apenas pelo interesse de quem tem dinheiro, como acontece entre nós.

A ideia de uma nova classe média surgida daqueles que melhoraram de renda nos governos petistas não é avalizada pelo senhor. Por sua tese, não basta aumentar a renda porque o diferencial da classe média tradicional é o capital cultural. Pode explicar essa distinção e indicar como a diferença entre as duas classes pode ser reduzida?
Capital cultural é uma forma de capital tão importante quanto o econômico. Capital cultural não é apenas escola e títulos universitários. É também e principalmente os privilégios invisíveis da socialização familiar. São esses estímulos que criam a capacidade de concentração – que não é natural, mas privilégio de classe –, a disposição ao pensamento abstrato e ao cálculo prospectivo. Quem tem isso é um pequeno vencedor quando chega aos cinco anos na escola. A classe média real tem isso. As classes baixas não têm e chegam como perdedoras à escola e, depois, ao mercado. Isso é privilégio passado de pai para filho e não tem nada a ver com mérito. Os pobres que ascenderam tiveram de lutar contra a ausência de privilégios e, por exemplo, trabalhar e estudar ao mesmo tempo, com 11 ou 12 anos de idade. Classe média é privilégio de nascença. Daí essas classes não serem médias de fato.

O senhor fala em racismo de classe, discorda de que há apenas resíduos da escravidão na sociedade moderna e sustenta que há mecanismos atuais de exclusão. Pode dar exemplos?
O mecanismo da pergunta anterior é, talvez, o mais importante. O capital cultural no Brasil é muito concentrado. Em outros lugares, 70% ou 80% da população tem formação sólida. Aqui, temos 20% ou 30%. E existe uma reação violentíssima para políticas que procurem, timidamente que seja, reverter esse quadro. É isso que é racismo de classe. É achar que existem pessoas apenas para servir e para serem humilhadas.

Um trecho do livro aponta que os ricos não conseguem lidar com a ascensão dos mais pobres e que expressam a "raiva ancestral de uma sociedade escravocrata". O senhor, nesse ponto, não repete o erro das explicações culturalistas?
O vício do culturalismo é imaginar que o comportamento das pessoas pode ser definido por ideias nas nuvens, sem ancoramento institucional. As pessoas se comportam, na realidade, obedecendo a estímulos institucionais de prêmio ou castigo. Pensemos na família, na escola ou no ambiente de trabalho para vermos claramente como isso se dá. A raiva ancestral foi mantida por instituições como trabalho doméstico desqualificado, uma polícia assassina dos pobres com a conivência da classe média, uma Justiça de classe que só condena os pobres e os adversários políticos e uma economia construída sob o monopólio e o privilégio. Tudo isso é continuação institucionalizada de uma sociedade excludente e para poucos.

Politicamente, para onde vão os batalhadores?
A classe trabalhadora precária em ascensão recente é a grande incógnita da política brasileira. Para onde eles se alinharem lá estará o grosso do povo brasileiro. Mas não acredito em alinhamento nacional e geral como ocorre com a classe média. Vai ser uma luta corpo a corpo definida localmente.

O senhor critica a linguagem rebuscada dos intelectuais, fala em ciência colonizada no Brasil e em ausência de debate na academia. Qual o erro da ciência no Brasil e o que deveria mudar?
O erro da ciência social brasileira – obviamente com exceções importantes _ é ser uma imitação rasteira e exterior dos modos universitários europeus e americanos e produzir um contexto avesso à inovação e ao debate crítico. Existem os prédios, as publicações e as instituições de fomento, mas não se tem o principal: o espírito científico que é constante inovação e crítica. Tem-se reverência religiosa aos cânones, o que explica sua continuação até hoje com pouquíssimas críticas. Foi isso que possibilitou uma ciência social dominante servil ao poder do dinheiro. Tenho sempre grande confiança nas novas gerações. Mas podem e devem se construir em terreno novo e mais crítico.

A TOLICE DA INTELIGÊNCIA BRASILEIRAJessé Souza
Leya, 256 páginas,
R$ 39, 90 impresso e
R$ 26,99 em e-book


















O Brasil precisa de uma opinião pública melhor informada, atenta e democrática. Ou será um país de Estado ineficiente, capturado por interesses escusos, com governos fracos, oposição golpista, imprensa hipócrita e pessoas egoístas e intolerantes.
 
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