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28 dezembro 2012

Mais uma conquista histórica: pobreza extrema pode ser reduzida a quase zero no Brasil

Número de brasileiros em condições de extrema pobreza pode diminuir do índice atual (3,4%) para 0,8%, de acordo com estudo do Ipea.  
Taxa de pobreza pode cair ainda mais entre crianças e adolescentes: de 5,9% para 0,6%.

"Trata-se de uma revolução de nossa política social” (Rafael Guerreiro Osorio, diretor de Estudos e Políticas Sociais do Ipea).
Brasileiros em condições de extrema pobreza: aqueles que recebem uma renda mensal per capita inferior a R$ 70.

Brasil Carinhoso pode baixar pobreza extrema infantil a 0,6%

Dados são de Nota Técnica lançada pelo Ipea (links ao final).
 
 
O Programa Brasil Carinhoso tem a capacidade de reduzir a pobreza extrema entre crianças de 0 a 15 anos a um patamar residual, segundo estudo lançado hoje pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). 
 
A Nota Técnica nº 14 da Diretoria de Estudos e Políticas Sociais (Disoc), intitulada O Bolsa Família depois do Brasil Carinhoso: uma análise do potencial de redução da pobreza extrema, revela que, se o desenho atual do programa tivesse sido implementado em 2011, a taxa de pobreza extrema entre a população de 0 a 15 poderia ter caído para apenas 0,6%.

A Nota Técnica explica as mudanças pelas quais o desenho do Programa Bolsa Família (PBF) passou de 2003 a 2011. Durante esse período, constatou-se que a iniciativa era mais efetiva entre famílias que contavam com renda própria mais próxima de R$ 70, mas não conseguia resgatar da pobreza extrema famílias sem renda, ou com renda muito baixa.

“As famílias que eram extremamente pobres e que tinham crianças de 0 a 5 anos, mesmo recebendo o benefício, continuavam extremamente pobres. Agora, o benefício deixa de ser pago em função da composição familiar e passa a ser pago em função do hiato de pobreza, ou seja, do quanto falta para a família deixar de ser extremamente pobre”, afirmou Rafael Guerreiro Osorio, diretor de Estudos e Políticas Sociais do Ipea, ao explicar de que forma o Programa Brasil Carinhoso, implementado em 2012, impactou o desenho do PBF.
De acordo com Osorio, que detalhou a Nota Técnica, já durante o primeiro reajuste do PBF em 2011, primeiro ano do governo atual, ficou patente a determinação de se privilegiar as crianças. 

“De 2011 para 2012, ao contrário dos demais benefícios básicos por criança e jovem, a transferência média por beneficiário aumentou. Isso já é efeito do Brasil Carinhoso”, declarou o diretor de Estudos e Políticas Sociais.

Mesmo com o desenho antigo, em 2011, o PBF conseguiu reduzir a taxa de pobreza extrema da população de 5,3 para 3,4%, e a taxa de pobreza da população de zero a 15 anos de 9,7 para 5,9%. Contudo, segundo a simulação presente no estudo – que não tem valor de previsão –, se implantado no ano passado, o Brasil Carinhoso poderia ter levado essas taxas a, respectivamente, 0,8% e 0,6%. 

“Teríamos a conquista histórica de atingir uma taxa de pobreza extrema entre a população de 0 a 15 anos menor ou igual à taxa registrada entre a população total. Trata-se de uma revolução de nossa política social”, ressaltou Osorio.

O diretor do Ipea disse, ainda, que “a redução de pobreza em 2013 será muito maior com o Brasil Carinhoso, sem dúvida, do que seria sem o programa, ou se permanecêssemos com o desenho antigo do Bolsa Família”. Ele sugeriu, também, que esse desenho mais racional e efetivo proporcionado pelo Brasil Carinhoso seja estendido progressivamente às demais famílias do PBF, considerando o espaço fiscal disponível para isso.

Década das crianças
 
O lançamento do estudo, às 11h, contou com uma contextualização apresentada pelo presidente do Ipea, Marcelo Neri. Ele lembrou que a taxa de pobreza infantil é superior à de outros grupos da sociedade brasileira. “Se você quer atacar os mais pobres dos pobres, as crianças são um alvo privilegiado dentro desse objetivo”, afirmou Neri. Segundo ele, a década de 1990 foi mais devotada à melhoria de condições dos idosos, e a última década – com os programas de transferência de renda condicionada que visam às crianças e utilizam as mães como canal – teve como foco as crianças.

O presidente do Ipea apresentou números que deixam clara a melhoria da situação das crianças no país durante os últimos anos. 

“Em 10 anos, a mortalidade infantil caiu 10% no Brasil. Entre as crianças de 0 a 4 anos, houve redução de 21 pontos percentuais na pobreza de 2001 a 2011. Algo está acontecendo, e não é mais do mesmo. O jogo mudou”, disse Neri.

O Programa Bolsa Família é uma transferência de renda mensal do governo federal para famílias pobres e extremamente pobres inscritas no Cadastro Único dos Programas Sociais. O estudo lançado nesta quarta-feira, com transmissão ao vivo pelo Portal Ipea, é assinado por Osorio e por Pedro H. G. Ferreira da Souza, técnico de Planejamento e Pesquisa do Ipea.

Leia a Nota Técnica "O Bolsa Família depois do Brasil Carinhoso: uma análise do potencial de redução da pobreza extrema"
Veja os gráficos da apresentação de Marcelo Neri, presidente do Ipea
Vídeo: íntegra da coletiva de lançamento da Nota Técnica "O Bolsa Família depois do Brasil Carinhoso"
Vídeo: entrevista com Rafael Osório, diretor de Estudos e Políticas Sociais do Ipea

Fonte: Ipea
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27 dezembro 2012

Daniel Shays' Revolt: old times, same problems

"Shays and his followers protested against the conduct of creditors in foreclosing mortgages upon the debt-burdened farmers, against the lawyers for increasing the costs of legal proceedings, against the senate of the state the members of which were apportioned among the towns on the basis of the amount of taxes paid, against heavy taxes [...]" 

"In Massachusetts the malcontents, under the leadership of Daniel Shays, a captain in the Revolutionary army, organized that same year open resistance to the government of the state. 

Shays and his followers protested against the conduct of creditors in foreclosing mortgages upon the debt-burdened farmers, against the lawyers for increasing the costs of legal proceedings, against the senate of the state the members of which were apportioned among the towns on the basis of the amount of taxes paid, against heavy taxes, and against the refusal of the legislature to issue paper money.

They seized the towns of Worcester and Springfield and broke up the courts of justice. All through the western part of the state the revolt spread, sending a shock of alarm to every center and section of the young republic. Only by the most vigorous action was Governor Bowdoin able to quell the uprising; and when that task was accomplished, the state government did not dare to execute any of the prisoners because they had so many sympathizers.

Moreover, Bowdoin and several members of the legislature who had been most zealous in their attacks on the insurgents were defeated at the ensuing election. The need of national assistance for state governments in times of domestic violence was everywhere emphasized by men who were opposed to revolutionary acts".

From the History of the United States, by Charles A. Beard and Mary R. Beard. Read more...

Controle de armas e a 2ª Emenda à Constituição dos EUA


O que a direita armamentista não conta e não sabe.

A resistência da direita em reconhecer a necessidade do controle de armas é comandada, em parte, por uma falsa noção de que os Pais Fundadores aprovaram a 2ª Emenda porque queriam uma população armada que pudesse combater o governo dos EUA. A verdade é o oposto. Os legisladores redigiram a Constituição e a 2ª Emenda para criar um governo central forte, com uma força militar capaz de pôr fim às insurreições. 

O artigo é de Robert Parry *.


Um grande obstáculo ao tratamento da defesa do controle de armas como algo do senso comum é a falsa narrativa histórica do direito, segundo a qual os fundadores da América queriam uma população armada que pudesse combater seu próprio governo. A verdade é que George Washington buscava milícias de cidadãos para pôr fim às revoltas e para manter a ordem.

A resistência da direita em reconhecer a necessidade do controle de armas é comandada, em parte, por uma falsa noção de que os Pais Fundadores aprovaram a Segunda Emenda porque queriam uma população armada que pudesse combater o governo dos EUA. A verdade é o oposto, mas muitos americanos parecem ter abraçado essa narrativa anti-histórica e absurda.

O fato é que os legisladores redigiram a Constituição e acrescentaram a Segunda Emenda com o objetivo de criar um governo central forte, com uma força militar cidadã capaz de pôr fim às insurreições, e não para viabilizar ou encorajar levantes. Os legisladores originários eram, afinal, majoritariamente homens de propriedades com muito em jogo numa sociedade ordenada, como era o caso de George Washington e James Madison.

Os homens que se reuniram na Filadélfia em 1787 não foram os precursores do Robespierre da França ou do Leon Trotsky da Rússia, que acreditavam em revoluções permanentes. Na verdade, seu trabalho na Constituição foi influenciado pela experiência da Rebelião de Shays, no oeste de Massachusetts, em 1786, um levante popular que o fraco governo federal, sob os Artigos da Confederação, careceu de armas para derrotar.

Daniel Shays, o líder da revolta, era um ex-capitão do Exército Continental que se juntou a outros veteranos e a fazendeiros para pegar em armas contra o governo que não atendeu às suas queixas.

A rebelião alarmou o general da reserva George Washington, que recebeu informes sobre o desenrolar dos acontecimentos dos veteranos da Guerra Revolucionária em Massachusetts, como os generais Henry Knox e Benjamin Lincoln. Washington estava particularmente preocupado com que a desordem pudesse estar a serviço dos interesses da Inglaterra, que apenas recentemente havia aceitado a existência dos Estados Unidos.

Em 22 de outubro de 1786, numa carta à procura de informações de um amigo em Connecticut, Washington escreveu: “Estou mortificado além da conta com o fato de que, no momento do reconhecimento de nossa independência estejamos, por nossa própria conduta, confirmando as expectativas de nosso inimigo transatlântico e nos tornando ridículos aos olhos de toda a Europa”.

Numa outra carta, em 7 de novembro de 1786, Washington questionou o general Lincoln a respeito da inquietação disseminada. “Qual é a causa de todos esses tumultos? Quando e como terão um fim?”. Lincoln responde: “Muitos deles parecem mesmo estar absolutamente loucos, se a tentativa de aniquilar nossa atual Constituição e dissolver o atual governo puder se considerada como evidência de insanidade”.

No entanto, o governo dos EUA careceu de meios para restaurar a ordem, e assim, cidadãos ricos de Boston financiaram sua própria força armada sob o comando do general Lincoln, para enfrentar o levante de fevereiro de 1787. Washington, no fim das contas, expressou satisfação no começo desse movimento de contenção, embora tenha permanecido preocupado que a rebelião pudesse se tornar um sinal de que as previsões da Europa a respeito do caos americano se confirmassem.

“Se há três anos [no fim da Revolução Americana] alguém tivesse me falado a respeito deste dia, eu teria visto uma rebelião formidável dessas, contra a lei e a constituição que nós mesmos fizemos, como a que agora acontece e teria pensado que se trata de uma insanidade – uma coisa apropriada a uma casa de loucos”, escreveu Washington a Knox, em 3 de fevereiro de 1787, acrescentando que, se o governo “vacilar ou for incapaz de reforçar suas leis...a anarquia e a confusão vão prevalecer”.

O alerta de Washington a respeito da Rebelião de Shays foi um fator chave na sua decisão de tomar parte – e presidir – a Convenção Constitucional, organizada para que se apresentasse revisões aos Artigos da Confederação, mas em vez disso jogou fora inteiramente a velha estrutura e a substituiu pela Constituição dos EUA, a qual alterou a soberania nacional dos 13 estados pelo “Nós, o Povo” e fortaleceu o poder do governo central.

Um aspecto crucial da constituição foi o estabelecimento de meios pacíficos para que os EUA criasse políticas em benefício da população, no interior mesmo da uma estrutura de freios e contrapesos, para evitar mudanças radicais consideradas perturbadoras para a sociedade estabelecida. Por exemplo, o mandado de dois anos para a Casa dos Representantes [Congresso] visava a refletir a vontade geral, mas o de seis anos para o Senado foi designado para temperar as paixões do momento.

No interior deste quadro de uma república democrática, os legisladores criminalizaram a pegada em armas contra o governo. O Artigo IV, seção 4 obriga o governo federal a proteger cada estado não apenas de invasão, mas de “violência doméstica”, e a traição é um dos poucos crimes definidos na constituição como “recrutamento para a guerra contra” os Estados Unidos, assim como fornecer “Ajuda e Conforto” ao inimigo (Artigo III, seção 3).

Mas foi a drástica expansão do poder do governo federal que provocou forte oposição de algumas figuras da Guerra Revolucionária, como Patrick Henry da Virgínia, que denunciou a Constituição e organizou um movimento conhecido como os Anti-Federalistas. As perspectivas para a ratificação da Constituição estavam de tal maneira em questão que seu principal arquiteto, James Madison, lançou-se numa campanha que ficou conhecida como a campanha dos Autos Federalistas, com a qual tentava minimizar o quanto suas mudanças eram, na verdade.

Para vencer os céticos, Madison concordou em apoiar a Carta de Direitos, que seria apresentada como as primeiras dez emendas à Constituição. A manobra política de Madison saiu vencedora por uma pequena margem, em estados chave, como Virgínia, Nova York e Massachusetts. O Primeiro Congresso, então aprovou a Carta de Direitos, que foi ratificada em 1791. [Para mais detalhes, ver, de Robert Parry, America’s Stolen Narrative, algo como A Narrativa roubada da América].

Por trás da Segunda Emenda
O acordo da Segunda Emenda lidava com preocupações com “a segurança” e a necessidade de milícias treinadas para garantirem a Constituição chamada de “tranquilidade doméstica”. Também havia hesitação dentre muitos dos legisladores, quanto aos custos e aos riscos da formação de um grande e forte exército, que tornasse a organização de milícias compostas de cidadãos uma alternativa atraente.

Assim, a Segunda Emenda diz: “Sendo necessária para a segurança de um Estado livre, uma milícia bem regulamentada, o direito do povo a manter e adquirir armas não deve ser infringido”. Ao contrário de algumas fantasias da direita a respeito dos legisladores pretendendo encorajar levantes populares com base em reivindicações, a linguagem da emenda está claramente voltada à manutenção da ordem interna do país.

Esse ponto foi posto em prática pelas ações do Segundo Congresso, em meio a um outro levante, que eclodiu em 1791, no oeste da Pensilvânia. Essa revolta anti-taxação, conhecida como a Rebelião Whiskey, instigou o Congresso em 1792 a expandir a ideia de “uma milícia bem regulamentada”, ao aprovar o Milicia Acts [algo como Lei das Milícias], o qual requeria de todos os militares adultos e brancos que obtivessem seus próprios rifles e equipamentos para uso nas milícias.

Em 1794, o Presidente Washington, que estava determinado a demonstrar a competência do jovem governo, comandou uma força combinada de milícias estaduais contra os rebeldes de Whiskey. Essa revolta rapidamente colapsou e a ordem foi restaurada, evidenciando como a Segunda Emenda ajudou o governo a manter a “segurança”, como a Emenda diz.

Além dessa clara lembrança histórica – de que a intenção dos legisladores era criar segurança para a nova República, não promover rebeliões armadas – também há a lógica simples que os legisladores constitucionais representavam a jovem aristocracia da nação. Muitos, como Washington, tinham grandes propriedades de terras. Eles reconheciam que um governo central forte e a tranquilidade doméstica atendiam os seus interesses econômicos.

Assim, seria contraintuitivo – bem como anti-histórico – acreditar que Madison e Washington queriam armar a população para que os descontentes resistissem ao governo constitucionalmente eleito. Na realidade, os legisladores queriam armar o povo – ao menos os homens brancos – de modo que levantes, sejam eles de natureza econômica, como a Rebelião de Shays e protestos anti-taxações, como a Rebelião Whiskey, e como os ataques dos americanos nativos ou as revoltas de escravos fossem reprimidas.

No entanto, a Direita tem investido pesadamente ao longo das últimas décadas na fabricação de uma narrativa nacional diferente, que ignora tanto a lógica como o registro histórico. Nessa fantasia da direita, os legisladores queriam que todos tivessem uma arma, de modo que poderiam violentamente resistir contra o seu próprio governo. Para esse fim, uma pequena lista de citações incendiárias são pinçadas e usadas fora do contexto.

Essa “história” tem sido amplificada por meio do poderoso aparato de propaganda da direita – Fox News, rádios, a internet e publicações ideológicas – para persuadir milhões de americanos de que a posse de rifles de caliber semi-automático e outras ponderosas armas de fogo era o que os legisladores pretendiam, que os proprietários de armas de hoje estão cumprindo com um dever americano de alguns séculos.

A mitologia a respeito dos legisladores e da Segunda Emenda é, é claro, só parte da falsa história que a Direita criou para persuadir os desavisados do Tea Party de que eles devem se vestir com a indumentária da Guerra Revolucionária e canalizarem os espíritos de homens como Washington e Madison.

Mas essa fábula das armas é particularmente insidiosa, porque obscurece os esforços do atual governo de tornar intuitiva para o senso comum leis que controlem as armas, então as falsas narrativas tornam possível certos massacres que irrompem periodicamente ao redor dos Estados Unidos, mais recentemente em Newtown, Connecticut, onde 20 crianças e seis professores foram assassinados em minutos por um jovem desequilibrado com uma versão civil de um rifle de combate M-16.

Soa absurdo pensar que os Fundadores dos EUA pudessem sequer ter contemplado um ato como esses – com suas baionetas do século XVIII que demandavam tempo para serem recarregadas -, mas os militantes pró-armamento afastaram essa obviedade, ao postularem que Washington, Madison e outros legisladores teriam desejado uma população altamente armada para cometer o que a Constituição definia como traição contra os Estados Unidos.

A direita americana está hoje embriagada de uma história muito ruim, que é tão perigosa como falsa.

(*) Robert Parry é um jornalista que cobriu o escândalo do Irã-Contras, em 1980, para a Associated Press e a Newsweek. Atua na Commondreams.org

Tradução de Katarina Peixoto,  publicada em Carta Maior.
http://www.cartamaior.com.br/templates/materiaMostrar.cfm?materia_id=21442

 
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The Right’s Second Amendment Lies

A big obstacle to commonsense gun control is the Right’s false historical narrative that the Founders wanted an armed American public that could fight its own government. The truth is that George Washington looked to citizens militias to put down revolts and maintain order, says Robert Parry *.
The Right’s Second Amendment Lies
By Robert Parry

Right-wing resistance to meaningful gun control is driven, in part, by a false notion that America’s Founders adopted the Second Amendment because they wanted an armed population that could battle the U.S. government. The opposite is the truth, but many Americans seem to have embraced this absurd, anti-historical narrative.
The reality was that the Framers wrote the Constitution and added the Second Amendment with the goal of creating a strong central government with a citizens-based military force capable of putting down insurrections, not to enable or encourage uprisings. The key Framers, after all, were mostly men of means with a huge stake in an orderly society, the likes of George Washington and James Madison.

President George Washington, as Commander-in-Chief, leading a combined force of state militias against the Whiskey Rebellion in 1794.

The men who gathered in Philadelphia in 1787 weren’t precursors to France’s Robespierre or Russia’s Leon Trotsky, believers in perpetual revolutions. In fact, their work on the Constitution was influenced by the experience of Shays’ Rebellion in western Massachusetts in 1786, a populist uprising that the weak federal government, under the Articles of Confederation, lacked an army to defeat.
Daniel Shays, the leader of the revolt, was a former Continental Army captain who joined with other veterans and farmers to take up arms against the government for failing to address their economic grievances.
The rebellion alarmed retired Gen. George Washington who received reports on the developments from old Revolutionary War associates in Massachusetts, such as Gen. Henry Knox and Gen. Benjamin Lincoln. Washington was particularly concerned that the disorder might serve the interests of the British, who had only recently accepted the existence of the United States.
On Oct. 22, 1786, in a letter seeking more information from a friend in Connecticut, Washington wrote: “I am mortified beyond expression that in the moment of our acknowledged independence we should by our conduct verify the predictions of our transatlantic foe, and render ourselves ridiculous and contemptible in the eyes of all Europe.”
In another letter on Nov. 7, 1786, Washington questioned Gen. Lincoln about the spreading unrest. “What is the cause of all these commotions? When and how will they end?” Lincoln responded: “Many of them appear to be absolutely so [mad] if an attempt to annihilate our present constitution and dissolve the present government can be considered as evidence of insanity.”
However, the U.S. government lacked the means to restore order, so wealthy Bostonians financed their own force under Gen. Lincoln to crush the uprising in February 1787. Afterwards, Washington expressed satisfaction at the outcome but remained concerned the rebellion might be a sign that European predictions about American chaos were coming true.
“If three years ago [at the end of the American Revolution] any person had told me that at this day, I should see such a formidable rebellion against the laws & constitutions of our own making as now appears I should have thought him a bedlamite – a fit subject for a mad house,” Washington wrote to Knox on Feb. 3, 1787, adding that if the government “shrinks, or is unable to enforce its laws … anarchy & confusion must prevail.”
Washington’s alarm about Shays’ Rebellion was a key factor in his decision to take part in – and preside over – the Constitutional Convention, which was supposed to offer revisions to the Articles of Confederation but instead threw out the old structure entirely and replaced it with the U.S. Constitution, which shifted national sovereignty from the 13 states to “We the People” and dramatically enhanced the power of the central government.
A central point of the Constitution was to create a peaceful means for the United States to implement policies favored by the people but within a structure of checks and balances to prevent radical changes deemed too disruptive to the established society. For instance, the two-year terms of the House of Representatives were meant to reflect the popular will but the six-year terms of the Senate were designed to temper the passions of the moment.
Within this framework of a democratic Republic, the Framers criminalized taking up arms against the government. Article IV, Section 4 committed the federal government to protect each state from not only invasion but “domestic Violence,” and treason is one of the few crimes defined in the Constitution as “levying war against” the United States as well as giving “Aid and Comfort” to the enemy (Article III, Section 3).
But it was the Constitution’s drastic expansion of federal power that prompted strong opposition from some Revolutionary War figures, such as Virginia’s Patrick Henry who denounced the Constitution and rallied a movement known as the Anti-Federalists. Prospects for the Constitution’s ratification were in such doubt that its principal architect James Madison joined in a sales campaign known as the Federalist Papers in which he tried to play down how radical his changes actually were.
To win over other skeptics, Madison agreed to support a Bill of Rights, which would be proposed as the first ten amendments to the Constitution. Madison’s political maneuvering succeeded as the Constitution narrowly won approval in key states, such as Virginia, New York and Massachusetts. The First Congress then approved the Bill of Rights which were ratified in 1791. [For details, see Robert Parry’s America’s Stolen Narrative.]

Behind the Second Amendment
The Second Amendment dealt with concerns about “security” and the need for trained militias to ensure what the Constitution called “domestic Tranquility.” There was also hesitancy among many Framers about the costs and risks from a large standing army, thus making militias composed of citizens an attractive alternative.
So, the Second Amendment read:  “A well-regulated Militia, being necessary to the security of a free State, the right of the people to keep and bear Arms, shall not be infringed.” Contrary to some current right-wing fantasies about the Framers wanting to encourage popular uprisings over grievances, the language of the amendment is clearly aimed at maintaining order within the country.
That point was driven home by the actions of the Second Congress amid another uprising which erupted in 1791 in western Pennsylvania. This anti-tax revolt, known as the Whiskey Rebellion, prompted Congress in 1792 to expand on the idea of “a well-regulated militia” by passing the Militia Acts which required all military-age white males to obtain their own muskets and equipment for service in militias.
In 1794, President Washington, who was determined to demonstrate the young government’s resolve, led a combined force of state militias against the Whiskey rebels. Their revolt soon collapsed and order was restored, demonstrating how the Second Amendment helped serve the government in maintaining “security,” as the Amendment says.
Beyond this clear historical record – that the Framers’ intent was to create security for the new Republic, not promote armed rebellions – there is also the simple logic that the Framers represented the young nation’s aristocracy. Many, like Washington, owned vast tracts of land. They recognized that a strong central government and domestic tranquility were in their economic interests.
So, it would be counterintuitive – as well as anti-historical – to believe that Madison and Washington wanted to arm the population so the discontented could resist the constitutionally elected government. In reality, the Framers wanted to arm the people – at least the white males – so uprisings, whether economic clashes like Shays’ Rebellion, anti-tax protests like the Whiskey Rebellion, attacks by Native Americans or slave revolts, could be repulsed.
However, the Right has invested heavily during the last several decades in fabricating a different national narrative, one that ignores both logic and the historical record. In this right-wing fantasy, the Framers wanted everyone to have a gun so they could violently resist their own government. To that end, a few incendiary quotes are cherry-picked or taken out of context.
This “history” has then been amplified through the Right’s powerful propaganda apparatus – Fox News, talk radio, the Internet and ideological publications – to persuade millions of Americans that their possession of semi-automatic assault rifles and other powerful firearms is what the Framers intended, that today’s gun-owners are fulfilling some centuries-old American duty.
The mythology about the Framers and the Second Amendment is, of course, only part of the fake history that the Right has created to persuade ill-informed Tea Partiers that they should dress up in Revolutionary War costumes and channel the spirits of men like Washington and Madison.
But this gun fable is particularly insidious because it obstructs efforts by today’s government to enact commonsense gun-control laws and thus the false narrative makes possible the kinds of slaughters that erupt periodically across the United States, most recently in Newtown, Connecticut, where 20 schoolchildren and six teachers were murdered in minutes by an unstable young man with a civilian version of the M-16 combat rifle.
While it’s absurd to think that the Founders could have even contemplated such an act – in their 18th Century world of single-fire muskets that required time-consuming reloading – right-wing gun advocates have evaded that obvious reality by postulating that Washington, Madison and other Framers would have wanted a highly armed population to commit what the Constitution defined as treason against the United States.
Today’s American Right is drunk on some very bad history, which is as dangerous as it is false.

Investigative reporter Robert Parry broke many of the Iran-Contra stories for The Associated Press and Newsweek in the 1980s. You can buy his new book, America’s Stolen Narrative, either in print here or as an e-book (from Amazon and barnesandnoble.com).

From http://consortiumnews.com/2012/12/21/the-rights-second-amendment-lies/
 

25 dezembro 2012

Nina Simone

My Baby Just Cares For Me (1957)




#Jazz The great voices


Duke Ellington desfila sua orquestra

VIP's Boogie / Jam with Sam #Jazz 
Duke Ellington & His Orchestra




Ouça mais Duke.

 

Please Don't Talk About Me When I'm Gone

Mills Brothers




Ou na voz de Billie Holiday:



The history of this music.

And the Lyrics:

Please don't talk about me when I'm gone
Honey, though our friendship ceases from now on
And if you can't say anything uptight
It's better not to talk at all, is my advice

We're parting, you'll go your way, I'll go mine
I have just this to do
Give a little kiss and hope that it brings
Lots of love to you
Makes no difference how Jerry carries on (but I'll make it, baby!)
Please don't talk about me when I'm gone

Please don't talk about me, honey, when I'm gone
Though our friendship ceases from now on
And if you can't say anything real nice
You better not talk at all, is Jerry's advice

We're parting, you'll go your way, I'll go mine
I have just this to do
Here's a little kiss, I hope it brings
Lots and lots of love to you
Makes no difference how I carry on
Please don't talk about me
Please don't talk about me
Please don't talk about me
Please don't talk about me
Please don't talk about me
Please don't talk about me, honey
Please don't talk about me when I'm gone

By: Vagalume.

#Jazz
 

24 dezembro 2012

Uma hora de música com Billie Holiday, Lady Day

Billie Holiday - Songs for Distingué Lovers (1957) Full Album


#Jazz
From the Youtube
 
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23 dezembro 2012

O mundo cão do trânsito

Seus vilões e seus sobreviventes.
Importante de ver e de divulgar.


Feliz Natal

The Nutcracker Suite - Les Brown Orchestra #Jazz #MerryChristmas


 
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A favor da regulamentação da profissão de historiador





"Defendemos sim que os professores de história realizem alguma etapa de sua formação em história (na graduação ou na pós-graduação), já que acreditamos que nossos alunos do ensino básico devem ter o direito de aprender com docentes qualificados e possuidores de conhecimentos e habilidades específicas nas áreas que lecionam". 
PAULO PAIM e BENITO BISSO SCHMIDT

A recente aprovação do projeto de regulamentação da profissão de historiador no Senado Federal, no último dia 7, tem gerado algumas controvérsias que, do nosso ponto de vista, derivam de certas incompreensões e até mesmo do desconhecimento do texto do projeto.

Alguns têm alegado que a regulamentação conduzirá ao cerceamento da liberdade de expressão daqueles que, mesmo não sendo historiadores de formação, escrevem sobre o passado.

Neste sentido, citam, inclusive, nomes de grandes intelectuais que produziram e continuam produzindo verdadeiros clássicos da historiografia brasileira.

Outros afirmam que a necessidade de formação específica levará à falta de professores de história no ensino fundamental, já que hoje muitos ministrantes desta disciplina realizaram outros cursos de graduação, como pedagogia, ciências sociais e filosofia.

Sobre o primeiro argumento contra o projeto, ele só é manifestado por quem não conhece o seu teor. Em nenhum momento foi proposto que historiadores profissionais tenham exclusividade na formulação e divulgação de narrativas históricas.

Jornalistas, cientistas sociais, diplomatas, juristas, economistas e todos os cidadãos poderão continuar a produzir conhecimento histórico --e esperamos que isso aconteça, pois só a partir de perspectivas diferentes e multidisciplinares conseguiremos fazer avançar a historiografia brasileira que, por sinal, é bastante consistente e tem grande reconhecimento internacional.

Além disso, advogar esta exclusividade aos historiadores profissionais seria atentar contra as liberdades democráticas, o que não é o caso aqui. Prova disso é que o projeto foi apoiado por todas as lideranças partidárias do Senado, demonstrando que ele não tem um viés político-partidário específico.

Quanto ao segundo argumento, defendemos sim que os professores de história realizem alguma etapa de sua formação em história (na graduação ou na pós-graduação), já que acreditamos que nossos alunos do ensino básico devem ter o direito de aprender com docentes qualificados e possuidores de conhecimentos e habilidades específicas nas áreas que lecionam.

Isso não é desmerecer professores de outras disciplinas, mas reconhecer que cada campo disciplinar implica a aquisição de saberes específicos, mesmo que em diálogo com outros âmbitos de conhecimento.

(No caso dos professores de história, por exemplo, a atenção às múltiplas temporalidades, a crítica e a interpretação dos documentos, a atualização historiográfica, a atenção às relações entre história acadêmica e história ensinada etc.)

De qualquer forma, esta especialização do corpo docente não se dará de uma hora para outra. Afinal, a própria Lei das Diretrizes e Bases da Educação prevê que, quando não há professores formados nas disciplinas específicas, devem ser aproveitados professores com outras formações e só, em último caso, professor sem nenhum formação.

Isso não impede, contudo, que, a médio e longo prazo, continuemos lutando pela qualificação e especialização de nossos professores, sem deixar de estimular, é claro, o saudável diálogo interdisciplinar.

Ou seja, o projeto não veda a ninguém o direito de escrever sobre história nem pretende impor de uma hora para outra a especialização a todos os docentes. Apenas quer assegurar a presença de historiadores profissionais em espaços dedicados ao ensino e à pesquisa científica em história, para que esses possam, em colaboração com outros estudiosos, contribuir para o avanço da área.

PAULO PAIM, 62, é senador pelo PT-RS, presidente da Comissão de Direitos Humanos do Senado e autor do projeto de lei citado no artigo e BENITO BISSO SCHMIDT, 42, é professor de história da Universidade Federal do Rio Grande do Sul e presidente da Associação Nacional de História (ANPUH-Brasil).

Artigo publicado em Tendências/Debates, 30/11/2012.


 
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22 dezembro 2012

Anita O'day

I'm Going Mad for a Pad (1944)



#Jazz

 
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Como você conseguiu viver tanto tempo sem ouvir isto?

Mahalia Jackson, "Go tell it on the mountain"



Ouça mais Mahalia Jackson.
 

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21 dezembro 2012

20 dezembro 2012

Carta de Conjuntura do Ipea

O país passou por uma distribuição de renda sem igual no passado recente e isto resultou em um forte crescimento, que arrefeceu na segunda metade de 2011.
"Sabemos que esta desaceleração não afetou o mercado de trabalho e nem foi uniforme. Alguns setores sofreram mais que outros, como é o caso da indústria. Ainda assim, hoje temos uma economia em recuperação”.
Claudio Hamilton Santos, Ipea.

No acumulado do ano, crescimento do PIB ficou a cargo do setor de serviços

O Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) lançou a Carta de Conjuntura Econômica de dezembro nesta quarta-feira (19), no Rio de Janeiro. O documento foi apresentado pelo coordenador do Grupo de Análise e Previsões (GAP) do Ipea, Fernando Ribeiro. Os técnicos de Planejamento e Pesquisa Marco Antonio Cavalcanti e Claudio Hamilton Santos também estavam à mesa para responder perguntas dos jornalistas.

Na fala de abertura, Claudio Hamilton disse que o esforço de conjuntura é muito mais de sistematizar o momento atual que fazer previsões para 2013. Segundo ele, o país passou por uma distribuição de renda sem igual no passado recente e isto resultou em um forte crescimento, que arrefeceu na segunda metade de 2011.

“Sabemos que esta desaceleração não afetou o mercado de trabalho e nem foi uniforme. Alguns setores sofreram mais que outros, como é o caso da indústria. Ainda assim, hoje temos uma economia em recuperação”, completou.

Os números comprovam a afirmação. O PIB (Produto Interno Bruto) cresceu 0,6% no terceiro trimestre em relação ao segundo, o melhor resultado desde o início de 2011. Quanto à indústria, em outubro a produção teve alta de 0,9% com relação a setembro e, pela primeira vez desde 2011, houve expansão do setor na comparação com o mesmo mês do ano anterior (+2,3%).

Retomada do investimentoApesar da recente recuperação, o retrospecto está aquém do desejado, sobretudo no setor industrial, que acumula queda de 2,7% na produção em doze meses. Mesmo assim, os efeitos negativos dessa baixa no PIB e no mercado de trabalho foram contrapostos pelo crescimento do setor de serviços ao longo de 2012 (+1,5%).

Em outubro, a taxa de desemprego ficou em 5,3%, a mais baixa para o mês desde 2002. Isso se deve ao fato de quase 80% dos empregos formais gerados neste ano estarem ligados às atividades de comércio e serviços. Estas áreas, que já acumulam naturalmente um maior número de trabalhadores, ainda foram beneficiadas pela continua expansão da renda e consumo.

Contudo, um quadro ideal apontaria crescimento bom e nivelado em todos os setores da economia, de acordo com Fernando Ribeiro. “Uma retomada mais vigorosa e sustentada do crescimento pressupõe a recuperação do setor industrial”, defendeu. Para isso, no entanto, é necessário acelerar o investimento sem pressionar ainda mais o setor de serviços, sem acelerar a inflação ou induzir um aumento do déficit externo, defendeu o coordenador do GAP.


Leia a Carta de Conjuntura de dezembro

Veja a apresentação da Carta de Conjuntura (PDF)



 
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Os Sentidos do Lulismo, 3ª parte

A intenção dos críticos foi, desde sempre, separar Lula e o PT, autonomizar um de outro, para melhor combatê-los.


O “lulismo” como  operador de interpretação

No título do livro de André Singer comparece o conceito de “lulismo”, em geral utilizado por motivos críticos à cultura do PT para nomear o caráter sebastianista, carismático, populista, salvacionista, personalista ou, em uma linguagem mais marxizante, cesarista ou bonapartista dos governos Lula e de sua liderança pública. A intenção desses críticos foi, desde sempre, separar Lula e o PT, autonomizar um de outro, para melhor combatê-los.
Será válido, a partir de uma perspectiva de esquerda, utilizar o conceito de “lulismo” como operador para a compreensão de nossa experiência? Defenderíamos aqui um uso condicionado desse conceito.
De um lado, deve se reconhecer que a liderança pública de Lula atingiu um grau histórico de cristalização inédito na história brasileira. Apenas Vargas gozaria de tal impregnação ou assemelhada no plano histórico. Além disso, a liderança de Lula não parece acompanhada até agora pela liderança ou simpatia do PT na mesma amplitude social. O fenômeno da popularidade de Lula extravasa certamente a simpatia pelo PT. Por isso, subsumir a liderança pública de Lula na cultura petista poderia esconder ou desvalorizar sua singularidade e seu raio próprio de ação.
De outro lado, a liderança pública de Lula nunca foi apartidária ou personalista: é seguramente um homem de partido, um construtor de partido, uma liderança vincada à história do partido de esquerda mais influente da história brasileira. Trata-se de uma liderança carismática mas “progressiva”, e não “regressiva”, para utilizar uma boa distinção de Gramsci: ela não cria vazio a seu redor, não se faz valer por sua excepcionalidade,  mas transmite e forma novas lideranças.
Além disso, Lula foi e é cada vez mais uma liderança de mediações: por sua personalidade histórica passam hoje milhares de fios de ligação com as consciências múltiplas do povo brasileiro, das classes trabalhadoras e dos setores populares. Daí que seu poder de arbitragem é, em geral, de sentido democrático e não opera no sentido unívoco da acumulação solitária de poder.
A liderança de Lula é ainda certamente dinâmica. Cristalizá-la em uma certa correlação de forças seria, de certa forma, aprisioná-la ao contexto. Mas o título do livro foge a esse risco perguntando-se sobre seu “sentido”, sobre sua direção, sobre seu caminho. A questão, posta assim, é aventurosa: lancemo-nos, pois, a ela. 

Juarez Guimarães é cientista político, professor da Universidade Federal de Minas Gerais e membro do Conselho de Redação de Teoria e Debate



Fonte: Teoria e Debate


 
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19 dezembro 2012

Massacre do Carandiru

Vinte anos sem responsabilização

Passados vinte anos, nenhuma autoridade competente foi capaz de atribuir responsabilidades pelo Massacre do Carandiru. Apesar de diversos esforços da sociedade civil, os processos de responsabilização disciplinar, criminal, civil e internacional iniciados após o massacre foram interrompidos ou permanecem sem conclusão. No Brasil, os órgãos do sistema de justiça nem sequer chegaram a declarar formalmente que o episódio que levou (pelo menos) 111 cidadãos sob a custódia do Estado à morte se tratou de um massacre.
Leia o artigo de Luisa Moraes Abreu Ferreira, Maíra Rocha Machado, Marta Rodriguez de Assis Machado na revista Novos Estudos do Cebrap.

 
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Os Sentidos do Lulismo, 2ª parte

Há no esforço de reflexão de André Singer [sobre o Lulismo] três questões de método decisivas.

Três conquistas de método e uma falta
Juarez Guimarães * cientista político, professor da Universidade Federal de Minas Gerais e membro do Conselho de Redação de Teoria e Debate

Há no esforço de reflexão de André Singer três questões de método decisivas.
Em primeiro lugar, a opção por combinar as tradições de estudo eleitorais – fortemente quantitativas e herdeiras principalmente da bibliografia anglo-saxã de estudos da ciência política – com um viés classista de interpretação que dialoga com os clássicos do marxismo. Não se trata no livro de um empreendimento eclético: as grandes tendências eleitorais de voto no Brasil são interpretadas conceitualmente através do movimento ascensional do chamado subproletariado, pessoas que vivem do seu trabalho mas, pela formação social brasileira, não compõem organicamente o proletariado industrial ou do setor de serviços de forma estável.
Ora, a identificação da importância concedida a esse setor por dois clássicos de interpretação do Brasil – Caio Prado Júnior e Celso Furtado – permite ao autor avaliar a dimensão histórica do fenômeno que estamos vivendo. Mais do que uma tendência eleitoral, mais do que um fato acontecido na dinâmica da disputa partidária, estamos diante de um “movimento nas estruturas”, do qual “a polarização na sociedade é sintoma”.
Na ciência política acadêmica brasileira, em geral os estudos eleitorais são “desfiliados” das tradições interpretativas dos clássicos do Brasil. Fruto da autonomia departamental  da disciplina e sua ambição de cientificização, os estudos de interpretação eleitoral desprezam na maioria das vezes a rica arca de acúmulos de estudos interpretativos do Brasil. André Singer vai em direção contrária: o conceito de “realinhamento eleitoral”, definido como “mudanças de clivagens fundamentais do eleitorado, que definem um ciclo político longo”, procura em seu argumento exatamente amarrar tendências de voto às dinâmicas históricas de classe.

Em segundo lugar, é um grande mérito desse trabalho dialogar, acolhendo inclusive parte das razões, com intelectuais que, a partir de um referente marxista ou de esquerda, denunciam a experiência do “lulismo”. No campo hoje fraturadíssimo do marxismo brasileiro, essa opção por escutar e acolher criticamente as vozes que vêm de fora da cultura do PT – como a voz rouca e nordestina de Francisco de Oliveira, aquela outra historicamente adversária ao PT de Luiz Werneck Vianna, a de Leda Paulani, além de muitas outras – deve ser defendida com ênfase. Se discordamos dos juízos às vezes até insultantes contidos nessas razões adversárias e autointituladas de esquerda, não é o caso de desqualificá-las de partida.
O pensamento ensimesmado sempre se empobrece. O pluralismo das vozes, inclusive à esquerda e para além dela, tem um valor heurístico. Se o lugar social de quem diz é importante, o lugar político de quem critica também o é: se apenas acolhemos as razões de quem defende o PT e nossas experiências de governo, o risco que se corre é encerrar nossas razões em uma lógica da autojustificação. Alternativas, limites, erros podem ser descartados em nome da autodefesa de um partido submetido a uma guerra permanente de desgastes pelas grandes empresas de mídia.
É uma terceira conquista do livro Os Sentidos do Lulismo pensar na escala das longas temporalidades. Atravessamos mais claramente no Brasil desde 2002 uma conjuntura crítica, de alta dramaticidade histórica e violentíssima tensão política. Conjunturas críticas são aquelas que definem os paradigmas de largas temporalidades, interrompem continuidades e abrem novas perspectivas: não se pode pensá-las a partir de análises de conjuntura, estrito senso.
De certo modo, as experiências recentes de transformação na América Latina têm estado às voltas com seu passado: o bolivarismo, o retorno atualizado das tradições do peronismo, a ascensão das culturas indígenas na Bolívia, o experimento uruguaio da Frente Ampla. No Brasil, também não é diferente: o passado represado está vindo à tona, como, por exemplo, as políticas de reparação das heranças escravocratas. Pensar através das largas temporalidades é fugir dos erros do impressionismo, o maior risco de quem se mete a compreender um processo em curso e na vertigem dele. 
Talvez o grande limite da reflexão de alta complexidade empreendida por André Singer é não conferir à questão democrática – mais além das tendências de voto – uma centralidade para o entendimento da evolução recente do Brasil. A sociedade brasileira está vivendo fortes movimentos, a correlação de forças entre os partidos também, igualmente a economia, mas em que medida o poder do Estado está sendo transformado? Em que medida, onde e como o Estado brasileiro tem se alterado?
A correlação de forças para mudar leis fundamentais, para reorientar estruturalmente gastos orçamentários, para realizar alterações profundas no sistema tributário ou no sistema de propriedade rural, para permitir a democratização das relações de trabalho, e assim por diante, interfere no ritmo possível das mudanças. A concentração e a propriedade dos meios de comunicação de massa interferem fortemente na formação das legitimidades e na formação da opinião pública. As regras eleitorais e de organização de partidos, bem como o modo de financiamento, interferem diretamente nas dinâmicas partidárias.
Se não há acúmulo suficiente para mudar leis fundamentais, como fazer, o que fazer, se o que se quer é o caminho legitimado e democrático das mudanças? Como o chamado fenômeno do lulismo se relaciona com uma larga conjuntura na qual se governa adversativamente em meio a um Estado profundamente marcado por heranças conservadoras e burguesas? Como superar os impasses que daí resultam?


Fonte: Teoria e Debate

Leia a 3a. parte do artigo.

 
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O escracho e os comitês de memória dentro das universidades estão dando uma contribuição extraordinária

Entrevista de Paulo Sérgio Pinheiro a Bia Barbosa para a revista Desafios do Desenvolvimento, do IPEA, Edição Nº 74.

“Na ditadura, o Presidente, os generais e os executores dos crimes estavam inteirados dos excessos”


Desde maio de 2012, o Brasil tem uma Comissão da Verdade em funcionamento. Seus objetivos são analisar violações de direitos humanos ocorridas entre 1946 e 1988. No entanto, o foco principal está no exame dos crimes de Estado cometidos no período da ditadura militar (1964-1985).
 
Paulo Sérgio Pinheiro, intelectual com larga trajetória na academia e na diplomacia, é um dos integrantes do novo órgão. Nesta entrevista ele fala de seu funcionamento, do exame dos crimes e da necessidade da sociedade conhecer os excessos para que eles não se repitam

Depois de muita polêmica, a Presidenta Dilma Rousseff sancionou, em novembro de 2011, a lei que cria a Comissão Nacional da Verdade. Formada para examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas por agentes do Estado entre 1946 e 1988, a Comissão foi instalada oficialmente em maio de 2012.

O acadêmico e diplomata Paulo Sérgio Pinheiro, reconhecido por sua idoneidade e identificação com a defesa da democracia e dos direitos humanos, é um dos sete integrantes da Comissão. Até maio de 2014, ele e seus colegas têm a missão de identificar e tornar públicos as estruturas, os locais, as instituições e as circunstâncias em que foi praticada a repressão de Estado durante a ditadura militar.

Para isso, poderão requisitar informações e documentos de órgãos do Poder Público, independentemente de seu grau de sigilo, convocar para testemunho pessoas que possam guardar qualquer relação com os eventos examinados e até determinar a realização de perícias e diligências para coleta de informações.

Ao final do trabalho, devem apresentar um relatório com conclusões e recomendações de medidas e políticas públicas para assegurar a não repetição de tais violações.

Nesta entrevista, Paulo Sérgio Pinheiro detalha como anda o trabalho e os principais desafios que a Comissão Nacional da Verdade tem pela frente.
Perfil
Paulo Sérgio Pinheiro é membro da Comissão Nacional da Verdade, nomeado pela presidenta Dilma Rousseff. Foi professor titular do Departamento de Ciência Política e coordenador do Núcleo de Estudos da Violência (NEV) da USP, do qual hoje é pesquisador associado. Fora do país, foi professor das universidades de Columbia e Notre Dame, nos EUA; de Oxford, na Grã-Bretanha; e da École des Hautes Études en Sciences Sociales, em Paris. Atualmente, é professor adjunto de Relações Internacionais na Brown University, nos EUA.

No governo, Pinheiro foi relator dos I e II Programas Nacionais de Direitos Humanos (1996 e 2002) e ministro da Secretaria de Estado de Direitos Humanos no governo Fernando Henrique Cardoso, entre 2001 e 2003.

Entre 2004 e 2011, integrou a Comissão Interamericana de Direitos Humanos da OEA (Organização dos Estados Americanos), como relator dos direitos das crianças.

Na ONU, foi relator especial de direitos humanos para o Burundi e, mais tarde, para Mianmar (antiga Birmânia); e membro das Comissões Especiais de Investigação sobre o Timor Leste e o Togo. Exerceu também a função de Expert Independente do Secretário-Geral da ONU para o Relatório Mundial sobre Violência contra a Criança, publicado em 2006. Hoje, preside a Comissão de Investigação da ONU sobre a Síria.

Paulo Sérgio Pinheiro nasceu no Rio de Janeiro e hoje vive entre São Paulo, Brasília e Genebra.

Desafios do Desenvolvimento - Como está sendo realizado o trabalho da Comissão?

Paulo Sérgio Pinheiro - Das quarenta Comissões da Verdade que conheço, a maioria levou seis meses para decolar. Talvez aqui no Brasil devêssemos ter estipulado um prazo para organizá-la. Mas já há muita coisa acumulada, não partimos do zero. Somos sete membros e 15 assessores, mais consultores e secretária. Há várias equipes trabalhando, fundamentalmente com arquivos. Os do Itamaraty, por exemplo, têm quatro toneladas de documentos. Nada foi queimado. Também há a tentativa de se ter acesso a documentos das Forças Armadas. O ministro Celso Amorim [da Defesa] tem dialogado e dado apoio, da mesma maneira que o ministro [Antonio] Patriota [Relações Exteriores). Teremos ainda acesso aos documentos da Funai [Fundação Nacional do Índio], pois muitas violações foram cometidas em ações contra indígenas, ou que tiveram relação com conflitos agrários. Uma subcomissão importante, é a que analisará o papel do Judiciário na ditadura. Aquele poder sofreu e também colaborou intensamente com a aplicação da legislação autoritária. Além disso, estamos preocupados com os milhares de membros das Forças Armadas reprimidos e punidos internamente durante o período, algo que pouco se tem falado. Por fim, uma das preocupações fundamentais é completar as informações sobre os desaparecidos - 475 foram analisados pela Comissão de Mortos e Desaparecidos - e os exterminados, como os 42 sobreviventes da guerrilha do Araguaia que foram assassinados na última “Operação Limpeza”, em 1974.

Acho da maior validade o movimento do Levante Popular, feito pelos estudantes. Isso politiza o tema. O escracho e os comitês de memória dentro das universidades estão dando uma contribuição extraordinária

Desenvolvimento - O senhor está trabalhando em qual das subcomissões?
Pinheiro - Eu trabalho com a questão dos sistemas de informações externas, numa rede que existiu dentro do Ministério das Relações Exteriores e que teve colaboração bastante estreita com os órgãos de repressão. Também tenho um interesse especial pela reconstituição dos vários crimes que estão na lei, como os assassinatos, desaparecimentos forçados e prisões arbitrárias, como configurando uma política de Estado dos governos da ditadura. Quer dizer, é preciso superar aquela noção de que tivemos práticas e excessos cometidos por alguns poucos. Na verdade, desde o Presidente da República, os generais e até os que executaram cometeram esses crimes, todos estavam absolutamente inteirados. Mas isso resta ser documentado.

Desenvolvimento - No caso dos desaparecimentos forçados e assassinatos já comprovados, há uma perspectiva de a Comissão fazer um estudo caso a caso?

Pinheiro - Refazer os 400 casos e mais as centenas de outras ocorrências individuais é uma tarefa impossível. Mas estamos começando a reexaminar laudos de necropsia utilizados nas informações sobre esses desaparecimentos.

Desenvolvimento - Uma das polêmicas sobre o funcionamento da Comissão Nacional da Verdade tem sido o sigilo de seu trabalho. Qual a sua opinião sobre isso? A ideia é que, ao final, tudo se torne público?

Pinheiro - Por trás dessa polêmica há uma enorme desinformação. Recentemente tivemos um seminário sobre comissões da verdade na América Latina e todas, também a da África do Sul, trabalharam com confidencialidade. Trata-se de uma investigação sobre crimes cometidos. Então não dá para fazer audiências com torturadores ou suspeitos envolvidos nos desaparecimentos na frente da televisão! Se considerarmos que há possibilidade de obter informações que não teríamos, podemos conceder o anonimato. Do mesmo modo que a imprensa trabalha com sigilo de fontes, nós também trabalhamos com sigilo dos depoimentos. Isso é assim, foi assim e vai continuar sendo assim. Mas também há uma dimensão pública do trabalho, que são as audiências coletivas, em que se ouvem depoimentos específicos. É evidente que a informação sobre o que se faz tem que ser pública. O nosso site ainda é muito insatisfatório, vai ser aperfeiçoado, mas vamos informar minuciosamente tudo o que se faz: as correspondências trocadas com as autoridades, que tipo de arquivo consultamos etc. Agora, depoimentos no curso de uma investigação, não vamos publicar. Se vamos publicar depois, é outro problema.
Foto: José Geraldo de Oliveira


Desenvolvimento - Há também um objetivo de estabelecer um diálogo com a sociedade através dessas audiências?
Pinheiro - Para mim, a audiência pública ideal é a que trata de um caso concreto: o depoente, acompanhado de um advogado, com o relato sendo televisionado de modo que os que sofreram os crimes possam testemunhar. Isso nos dá informações, mas também tem um papel em relação às vítimas, que podem participar publicamente do processo. Vamos visitar todos os Estados. No Pará, o governador Simão Jatene disse que vai propor a todas as correntes políticas a criação de uma Comissão estadual. Em Alagoas, ela já foi formada. Na OAB de São Paulo, do Rio de Janeiro e do Rio Grande do Sul também.
 Foto: José Geraldo de Oliveira

Nossa comissão tem mais poderes do que qualquer outra da América
do Sul e Central no século XXI, porque temos o poder de convocar qualquer cidadão ou cidadã. Funcionários civis e militares então, nem se fala! E os que não vierem, denunciaremos ao Ministério Público Federal
 
Desenvolvimento - Estão surgindo também comissões nas Assembléias Legislativas e em universidades. Qual o papel desses espaços?
Pinheiro - A Comissão Nacional da Verdade não é coordenadora desses movimentos. Ela tem um estatuto especial, é uma comissão do Estado, produto de uma lei, nomeada pela Presidenta da República para apresentar um relatório final do seu trabalho. Mas é evidente que vamos colaborar com essas comissões. Acho da maior validade, por exemplo, o movimento do Levante Popular, feito pelos estudantes. Isso politiza o tema. O escracho e os comitês de memória dentro das universidades estão dando uma contribuição extraordinária.
Desenvolvimento - Essas ações dialogam com um dos objetivos da Comissão, que é sensibilizar a sociedade para o que aconteceu neste período?
Pinheiro - Não precisamos ter grandes ilusões de que uma sociedade profundamente autoritária e fundada no racismo estrutural vá se mobilizar de um dia pra outro e sustentar a Comissão da Verdade. Mas é evidente que a diferença entre silêncio e mobilização pode melhorar, inclusive com a ajuda da mídia. Nossa comissão é a única da América Latina que está acontecendo no século XXI. No funcionamento das Comissões da Verdade na Guatemala e de El Salvador não havia internet, twitter, facebook, nem toda a digitalização de arquivos. O atraso da criação da Comissão assim é altamente compensado pelo que foi realizado e pelos novos meios de comunicação.

Desenvolvimento - O senhor falou da colaboração entre Comissão e Ministério da Defesa. Mas o ministro anterior, Nelson Jobim, chegou a afirmar que todos os documentos haviam sido destruídos. Como está esse processo agora?

Pinheiro - O ministro Jobim é meu amigo, fez o primeiro Programa Nacional de Direitos Humanos, mas a posição oficial da Comissão, que já foi publicada, é que julgamos ilegais esses atos de destruição de documentos. Minha opinião é que só quem acredita em fadas acha que não existe nenhum arquivo. A própria Aeronáutica cedeu vários deles para o Arquivo Nacional.
Foto: José Geraldo de Oliveira


Desenvolvimento - Pessoalmente, como o senhor se vê neste processo?
Pinheiro - Somos um grupo muito integrado, de grande coesão. Todos já trabalhamos, em algum momento, um com o outro. E temos uma equipe extraordinária de assessores e consultores, além do apoio da Presidenta Dilma, sem interferência de nenhum ministro. O apoio material do governo também é muito maior do que eu podia supor.
Foto: José Geraldo de Oliveira
 
Tenho a maior alegria em ver o resultado de casos como o Ustra, especialmente pelo que isso significa para as famílias dos que foram torturados e assassinados. Essa manifestação dos tribunais brasileiros é algo que dá grande conforto e esperança às famílias


Desenvolvimento - Como o senhor analisa as críticas feitas às funções e formato da Comissão antes da aprovação da lei?

Pinheiro - Essas críticas vieram de setores que desejavam uma Comissão da Verdade com funcionamento de tribunal. Ora, nenhuma das quarenta Comissões da Verdade, inclusive a da África do Sul, teve poder judicial. O importante é que nossa comissão tem mais poderes do que qualquer outra da América do Sul e Central no século XXI, porque temos o poder de convocar qualquer cidadão ou cidadã.
Funcionários civis e militares então, nem se fala! E os que não vierem, denunciaremos ao Ministério Público Federal. Em segundo lugar, temos acesso a qualquer arquivo, não importa seu grau de sigilo. Nos ministérios, já temos acesso a documentos secretos e ultrassecretos. Em terceiro, ao contrário do Poder Judicial, por causa da Lei da Anistia e do acórdão do Supremo Tribunal Federal, temos o mandato de indicar a autoria e as circunstâncias em que foram cometidos os assassinatos, as torturas, os desaparecimentos forçados e a detenção arbitrária.

Desenvolvimento - Houve afirmações também de que a Comissão não conseguiria trabalhar por conta da decisão do STF sobre a Lei de Anistia.

Pinheiro - Foi outra choradeira. Não tem nada a ver uma coisa com a outra. A Lei da Anistia não nos atrapalha nem ajuda, é algo que não nos impede de fazer o que a Comissão nasceu para fazer. O relatório final vai indicar a autoria e as circunstâncias em que esses crimes foram cometidos pela ditadura.

Desenvolvimento - Considerando sua experiência em direito internacional e o conflito entre a decisão do STF sobre a Lei de Anistia e a decisão da Corte Interamericana no caso Araguaia, existe a possibilidade de, no relatório final da Comissão, haver uma recomendação para que a Justiça de responsabilize os responsáveis pelas violações de direitos humanos durante a ditadura?

Pinheiro - Não sei. Felizmente ainda temos vinte meses para resolver essa questão das recomendações. A posição de todos os membros da Comissão da Verdade, inclusive a minha, que fui membro por oito anos da Comissão Interamericana de Direitos Humanos e apoiei a decisão do presidente Fernando Henrique, em 1998, de reconhecer a competência da Corte Interamericana, é que uma decisão da Corte deve ser cumprida pelo Estado brasileiro. A doutrina do direito internacional interamericano diz que as autoanistias não são válidas, e a anistia no Brasil, como já falei muitas vezes, foi uma autoanistia. O Supremo não entendeu assim, mas não cabe a mim nem à Comissão da Verdade ficar contestando essa decisão. É algo que cabe ao Estado brasileiro, e isso não nos atrapalha.

 
Enquanto não tivermos bem encaminhados na reconstrução da verdade, é muito cedo para se discutir reconciliação nacional. As vítimas querem antes saber sobre a autoria, as circunstâncias e a responsabilidade do Estado, para então fazer esse trajeto da reconciliação

Desenvolvimento - O senhor concorda com a estratégia do Ministério Público de abordar judicialmente crimes como o desaparecimento e a ocultação de cadáveres como crimes não prescritos, para poder responsabilizar os perpetradores?

Pinheiro - Não tenho competência para avaliar se é uma boa ou uma má estratégia. Só posso dizer da minha satisfação em ver o Ministério Público Federal e o Sistema Judiciário brasileiro assumindo seu papel dentro dos ditames da lei, que dão a eles alguma possibilidade de ação. Digo a mesma coisa sobre outras condenações que estão surgindo. Tenho a maior alegria em ver o resultado de casos como o [do coronel Carlos Alberto Brilhante] Ustra [declarado torturador pelo Tribunal de Justiça de São Paulo, em agosto último], especialmente pelo que isso significa para as famílias dos que foram torturados e assassinados. Essa manifestação dos tribunais brasileiros é algo que dá grande conforto e esperança às famílias.

Desenvolvimento - Por outro lado, há setores que ainda reagem aos avanços. O Grupo Tortura Nunca Mais, do Rio de Janeiro, teve sua sede invadida. É de se esperar que, com o funcionamento da Comissão da Verdade, conflitos sociais venham à tona para disputar diferentes visões sobre este período na sociedade?

Pinheiro - Nós estamos numa democracia. No Brasil vigora a liberdade de opinião, as pessoas e a imprensa são livres para se expressar. Mas evidentemente não se pode cometer crimes, como essa invasão da sede do Tortura Nunca Mais, que deve ser investigada. Desde que a expressão dessas opiniões não seja traduzida em crimes, as pessoas são livres para pensar o que quiserem sobre a Comissão da Verdade. Não espero unanimidade.

Desenvolvimento - Um dos objetivos da Comissão da Verdade é a promoção da reconciliação nacional. Qual a sua leitura sobre esse conceito?
Pinheiro - Este termo está presente na lei que criou a Comissão e na denominação de várias outras comissões da verdade pelo mundo. Mas enquanto não tivermos bem encaminhados na reconstrução da verdade, é muito cedo para se discutir reconciliação. Também depende do que vamos encontrar; a reconciliação pode ocorrer na dinâmica do processo. As vítimas querem antes saber sobre a autoria, as circunstâncias e a responsabilidade do Estado, para então fazer esse trajeto da reconciliação. Mas não somos nós que vamos guiá-las. Este é um tema para o Estado brasileiro.
 Foto: José Geraldo de Oliveira

Uma subcomissão  importante é a que analisará o papel do Judiciário na ditadura. Aquele poder sofreu e também colaborou intensamente com a aplicação da legislação autoritária

 
Desenvolvimento - Quando a lei que cria a Comissão aponta no sentido da reconciliação, ela sinaliza uma preocupação com o legado da ditadura nos dias de hoje. Na sua avaliação, esse legado persiste?

Pinheiro - O entulho autoritário continua, por exemplo, na parte da tortura. Não tem jornalista ou preso político torturado, mas é um vexame que isso ainda continue. Execuções sumárias pelas polícias militares do Rio de Janeiro e de São Paulo também são intoleráveis. A democracia não pode continuar a conviver com isso. Também não pode conviver com o ensino nas Forças Armadas ainda passar uma visão da ditadura militar totalmente positiva, como se não existissem os crimes que estamos discutindo. O processo, dinâmica e as recomendações da Comissão podem contribuir para superar esse legado autoritário. Por outro lado, uma das minhas tarefas na Comissão é reconhecer onde que progredimos. Senão, nos daríamos um atestado de incompetência total.

Desenvolvimento - Quais os grandes gargalos que o país ainda enfrenta na garantia dos direitos humanos?

Pinheiro - Ainda que tenhamos caminhado na luta contra a pobreza extrema, além dos direitos econômicos e sociais, o gargalo são os direitos civis e a defesa dos direitos das minorias. A situação subalterna ainda prevalece nos direitos econômicos e sociais, por exemplo, para a maioria afro-descendente. É importante reconhecer que o Brasil teve uma continuidade na política de direitos humanos. As violações continuam, mas não são mais uma política de Estado.

Desenvolvimento - Apesar de a violação de direitos humanos não ser mais política de Estado, ainda há políticas de Estado que possibilitam a violação?

Pinheiro - Mas não é o Estado que organiza os crimes cometidos por seus agentes. As violações hoje cometidas por agentes do Estado nos estados da Federação não são coordenadas como foram durante o regime militar, o que já é uma diferença extraordinária. Continuará a haver problemas, porque a caminhada dos direitos humanos nunca termina. Temos uma porção de problemas, mas é preciso olhar para o que avançou para reexaminar em que falhamos e o que deu certo.


Fonte: Desafios do Desenvolvimento, revista do IPEA, Edição Nº 74.
 
 
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18 dezembro 2012

Brasileiro é um dos povos mais felizes do mundo

Numa escala de 0 a 10, os brasileiros dão, em média, nota 7,1 para suas vidas. Esse nível coloca o país em 16º lugar entre 147 países pesquisados no Gallup World Poll.
 
Resultados são de pesquisa divulgada pelo Ipea

A queda da desigualdade se acelera em 2012 e as rendas seguem em forte alta segundo informam as famílias brasileiras, que se declaram altamente satisfeitas. O Ipea aplicou em outubro perguntas padronizadas de questionários internacionais em 3.800 domicílios e confirmou o alto grau de felicidade prevalecente no país. Intitulado 2012: Desenvolvimento Inclusivo Sustentável?, o Comunicado do Ipea nº 158 revela que, numa escala de 0 a 10, os brasileiros dão, em média, nota 7,1 para suas vidas. Esse nível colocaria o país em 16º lugar entre 147 países pesquisados no Gallup World Poll, que apontava uma felicidade média de 6,8 no Brasil em 2010.
“Os padrões de vida estão mais sustentáveis do que antes, não só pelo aumento da renda individual do trabalho, mas também pela sua estabilidade”, pontuou Neri.
O bem-estar percebido em 2012 pode encontrar razões na Pesquisa Mensal de Emprego (PME) do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), que registra desemprego nos menores níveis da série iniciada em 2002 e rendas crescendo bem mais que o PIB per capita. A renda individual média da população de 15 a 60 anos de idade sobe 4,89% de 2011 para 2012, contra taxa média de 4,35% ao ano entre 2003 e 2012 (veja o gráfico ao lado). Já a desigualdade de renda domiciliar per capita cai em 2012, segundo a PME, a uma velocidade 40,5% maior que a observada de 2003 a 2011 na Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios (PNAD), também do IBGE. As rendas que mais crescem são as dos mais pobres e as de grupos tradicionalmente excluídos, como mulheres, negros e analfabetos.
Mais dinheiro no bolso talvez traga alguma felicidade. A nota média de satisfação com a vida de quem recebe mais de 10 salários mínimos é 8,4, contra 6,5 de quem vive apenas com o mínimo e 3,7 dos sem renda. Por outro lado, nem tudo é dinheiro. Embora pobre, a região mais feliz do país é o Nordeste, com nota média de 7,38 (veja o gráfico abaixo). Se fosse um país, o Nordeste estaria em 9º lugar no ranking global, entre a Finlândia e a Bélgica. As médias das demais regiões são 7,37 no Centro-Oeste, 7,2 no Sul, 7,13 no Norte e 6,68 no Sudeste.
Desigualdade
O índice de Gini fica, em 2012, em 0,522, de acordo com os dados da PME que vão até setembro. A redução dessa taxa segue a linha de queda iniciada na década de 1990. De 2003 a 2011, o índice caiu em média 1,2% ao ano. Entre o ano passado e este, de outubro a outubro, a queda está registrada em 1,69%.
"A desigualdade continua caindo, e a permanência desse movimento é um componente fundamental para avaliarmos o crescimento, Apesar da crise financeira mundial e do baixo crescimento do PIB".
Lançado nesta terça-feira no Ipea, o Comunicado teve alguns de seus resultados apresentados em primeira mão na sexta-feira passada, durante o XL Encontro Nacional de Economia, realizado em Porto de Galinhas (PE) pela Associação Nacional dos Centros de Pós-Graduação em Economia (Anpec). A divulgação desta terça-feira ocorreu na sede do Ipea, em Brasília (Setor Bancário Sul, Quadra 1, Ed. BNDES, 15º andar), às 10h, com transmissão ao vivo pela internet.


Leia o "Comunicado do Ipea nº 158 - 2012: Desenvolvimento Inclusivo Sustentável?"
Veja os gráficos da apresentação "2012: Desenvolvimento Inclusivo Sustentável?"
Vídeo: assista à apresentação do Comunicado do Ipea nº 158
Fonte: Ipea, dezembro de 2012.
 
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"Americans Kill People"

Michael Moore on Newtown, Mass Shootings, and the U.S. Culture of Violence.




http://www.democracynow.org/
 
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Os Sentidos do Lulismo, 1ª parte

Resenha do livro de André Singer, "a reflexão mais sistemática e com perspectivas de totalidade sobre o curso da história recente do Brasil a partir do momento em que Lula foi eleito presidente do país, em 2002". 

Quem somos e para onde vamos? (1)

Juarez Guimarães

O livro de André Singer Os Sentidos do Lulismo: Reforma Gradual e Pacto Conservador (São Paulo, Companhia das Letras, 2012) é certamente a reflexão mais sistemática e com perspectivas de totalidade sobre o curso da história recente do Brasil a partir do momento em que Lula foi eleito presidente do país, em 2002. Essa reflexão é centrada em um fenômeno político novo – “o lulismo” – mas, de fato, analisa seus sentidos a partir de uma visão que combina dinâmica eleitoral, economia e sociedade em um enquadramento de longas temporalidades.
Exatamente por ser um investimento prodigioso de entendimento, desses que se abrem à aventura da indeterminação pela amplitude da pergunta e pelas complexidades em movimento das relações aí formuladas em resposta, optamos por dialogar com ele em cinco pequenos ensaios. É tal a riqueza das interrogações e respostas formuladas no livro que um ensaio apenas transbordaria de seu conteúdo possível.
Desde já, formulamos uma relação simpática com as grandes teses expostas na obra. A primeira delas é que a combinação dos fenômenos de deslocamento social na base da pirâmide brasileira, fruto das políticas do primeiro governo Lula e consolidadas no segundo governo, mais o episódio equivocamente chamado de “mensalão”, provocou um realinhamento eleitoral a partir das eleições presidenciais de 2006. As eleições de 2010 e também as realizadas em 2012, com as singularidades e mediações municipais, parecem confirmar essa hipótese que vincula setores populares tendencialmente ao voto nos candidatos do PT e certos setores médios tendencialmente votantes do PSDB ou do antipetismo.
A segunda grande tese de interpretação é que “o lulismo” representaria até agora um reformismo fraco, apesar da amplitude histórica das mudanças sociais que foi capaz de promover. Essa noção de “reformismo fraco” se oporia tanto à hipótese sectária de identificar no lulismo um fenômeno regressivo quanto à expectativa de mudanças estruturais nas relações de poder e propriedade do capitalismo brasileiro condensadas no tempo.
A terceira tese de interpretação é que “o lulismo” teria realizado um caminho de despolarização política entre esquerda e direita, no sentido classista e dos valores do socialismo, e de repolarização política entre “povo” e “ricos”, baseada em uma aliança política com setores de centro-esquerda, do centro e mesmo conservadores do espectro político-partidário, dando feição a uma vasta “coalizão produtivista” versus uma “coalizão rentista”, liderada pelo PSDB. Nessa hipótese, a liderança de Lula cumpriria o papel de arbitrar entre extremos, institucionalizando conflitos abertos de classes em uma dinâmica de permanente negociação.
A quarta tese de interpretação é que o PT, com uma temporalidade própria, teria acompanhado a estratégia e o modo de operar do “lulismo”, alterando suas bases sociais e, principalmente, abrigando em seu peito duas almas, uma pragmática alinhada às mudanças possíveis no contexto e outra que continua a marcar, ao fundo, seus princípios e identidades socialistas de origem. Como se verá, os objetivos dialogais desse e dos próximos ensaios vão no sentido de discutir, ponderar, qualificar e completar esses diagnósticos.

Fonte: Teoria e Debate

Leia a 2. parte do artigo.

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17 dezembro 2012

Uma ideia teimosa

O regionalismo desenvolvimentista da América Latina.

Texto para Discussão do Ipea:
"A Recuperação do Desenvolvimento no Regionalismo Latino - Americano", 
de Rodrigo Alves Teixeira e Walter Antonio Desiderá Neto.
 
 
O artigo demonstra que, no debate atual sobre a integração latino-americana, há um resgate das ideias cepalinas dos anos 1950 e 1960 quanto ao caráter que deve ter esta integração.
Nos escritos originais da Cepal, esse regionalismo deveria assumir feições de um regionalismo desenvolvimentista, em oposição a um regionalismo liberal. 
 
Conheça mais da história deste debate. Palavras-chave: integração regional; Cepal; desenvolvimentismo; integração latino-americana; pensamento econômico.

This article aims to show that, by analyzing both the historical development of regional integration processes in Latin America and the political and economic ideas behind them, ECLAC`s ideas, from the 1950`s and 1960`s, about what features Latin American integration should present - a developmental regionalism in opposition to a liberal one - have been recovered today. Thus, the article also intends to show the tension between these two kinds of regionalism in Latin American regional integration history. Keywords: regional integration; ECLAC; developmentalism; Latin American integration; economic thought.
 
  acesseBaixe e leia o documento (pdf 700KB)   


 
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"O Judiciário condena, mas quem cassa é o Congresso"

"Se o Supremo decidir que os mensaleiros devem perder o mandato, cria-se um desequilíbrio entre os Poderes da República".

"Joaquim Barbosa foi a um paralelo: "Na vida política dos Estados Unidos, essa discussão sequer chega a ocorrer. Um parlamentar envolvido em crimes tão graves como esses renuncia imediatamente, não permanece na Câmara à espera de uma proteção". Barbosa acertou quanto aos costumes, mas a Constituição americana não dá ao Judiciário o poder de cassar mandatos".
(Elio Gaspari).


O STF deve se lembrar de Adauto Lúcio Cardoso
Elio Gaspari


Se não prevalecerem as almas de bom-senso, o Supremo Tribunal Federal irá para um conflito de poderes com o Congresso por causa dos mensaleiros condenados pela Corte. Por quatro votos contra quatro, está empatada a votação que poderá determinar a cassação dos mandatos de parlamentares delinquentes. O desempate virá do ministro Celso de Mello.

Os juízes do Supremo são os guardiães da Constituição e suas decisões projetam-se sobre o funcionamento das instituições. Se a votação está empatada, é porque a Corte dividiu-se quanto ao nó da questão: o mandato dos mensaleiros é deles ou encarna a vontade de seus eleitores? Se é deles, uma vez condenados pelo Judiciário, é razoável que o percam, como perderia o emprego um motorista. Se o mandato é dos eleitores, paciência, a decisão é do Legislativo. Essa posição foi serenamente exposta pela ministra Rosa Weber.

Uma trapaça da História jogou em cima do ministro Celso de Mello a questão maior. Seu voto decidirá se o Judiciário pode cassar mandatos a partir de condenações criminais. Interpretando a legislação da ditadura, o STF mandou para a cadeia o deputado Francisco Pinto por ter chamado o general Augusto Pinochet de ditador. Apequenou-se. Já o Congresso foi fechado em duas ocasiões porque defendeu a sua prerrogativa de julgar parlamentares. Engrandeceu-se.

Hoje, o Supremo está na gloriosa situação que Luiz de Camões chamou de "outro valor mais alto (que) se alevanta". Fez o que muita gente gostaria que se fizesse e esperava por isso há tempo. Mesmo assim, a poética camoniana pode ser tóxica para as instituições. Os três Poderes da República são independentes. O Judiciário condena, mas quem cassa é o Congresso. Se o Supremo decidir que os mensaleiros devem perder o mandato, cria-se um desequilíbrio entre os Poderes da República que só tem a ver com as delinquências dos mensaleiros num aspecto pontual. Estabelece-se uma norma: 11 magistrados escolhidos monocraticamente pelo presidente da República podem cassar mandatos de parlamentares eleitos pelo povo. Essa responsabilidade é temerária e excessiva. Hoje, se um larápio continua na Câmara ou no Senado, a responsabilidade é do Legislativo. Amanhã, outro Supremo poderá encarcerar outro Chico Pinto.

Ressalvada a diferença entre o regime democrático de hoje e a ditadura envergonhada do governo do marechal Castello Branco, vale relembrar um episódio no qual havia um poder mais alto alevantado. Em 1966, mesmo tendo garantido que não cassaria mandatos de parlamentares, o Executivo passou a faca em seis deputados. O presidente da Câmara, Adauto Lúcio Cardoso, recusou-se a aceitar a decisão. Ele não era maluco, era apenas um liberal valente. Enfrentara a esquerda no governo João Goulart e apanhara da polícia de Carlos Lacerda defendendo-a. O marechal chamou a tropa e Adauto teve o seguinte diálogo com o coronel Meira Mattos, que comandou o sítio:

"Estou admirado de vê-lo aqui, coronel, não para cumprir um decreto, para o cerco ao Congresso".

"E eu, admirado por sua atitude antirrevolucionária", respondeu Meira Mattos.

"Eu sou, antes de mais nada, um servidor do poder civil".

"E eu, deputado, um servidor do poder militar".

Mais tarde, Castello nomeou Adauto para o Supremo Tribunal e lá ele abandonou a Corte quando seus pares legitimaram a censura à imprensa.

O Poder Judiciário de hoje nada tem a ver com o poder revolucionário do coronel. Sua tropa é a da opinião pública. Hoje, como em 1966, o que está em questão é a independência do Congresso, em cuja defesa Adauto foi a um extremo simbólico. Ele sabia que os seis deputados estavam fritos. Se a decisão de cassar os mensaleiros ficar com a Câmara, é quase certo que eles perderão os mandatos. Admita-se, contudo, que isso não aconteça. Dois ministros levantaram essa hipótese. Gilmar Mendes expôs o absurdo que seria a situação de um deputado ter mandato com hora para se apresentar na cadeia. Joaquim Barbosa foi a um paralelo: "Na vida política dos Estados Unidos, essa discussão sequer chega a ocorrer. Um parlamentar envolvido em crimes tão graves como esses renuncia imediatamente, não permanece na Câmara à espera de uma proteção".

Barbosa acertou quanto aos costumes, mas a Constituição americana não dá ao Judiciário o poder de cassar mandatos. É comum que os mensaleiros americanos renunciem para não serem expelidos pelas Casas legislativas. Contudo, indo-se ao cenário extremo do caso brasileiro, nos Estados Unidos ocorre o contrário. Três deputados condenados mantiveram-se nos mandatos. Dois foram reeleitos enquanto estavam na cadeia. O terceiro, Jay Kim, em 1998, foi condenado a um ano de prisão domiciliar por ter embolsado US$ 250 mil pelo caixa dois. Como era deputado, o juiz colocou-lhe uma pulseira eletrônica no tornozelo e ele só podia sair de casa para ir ao Congresso. Foi cassado pelos eleitores, nas prévias de seu partido.

* Artigo publicado em O Globo, 16/12/2012.

 
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