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08 setembro 2011

Política de segurança pública: para além do Bope e das UPPs

"Dois projetos de lei aprovados no Congresso e, recentemente, sancionados pela presidente da República, merecem destaque: um que institui diversas medidas cautelares alternativas à prisão provisória, tais como pagamento de fiança, recolhimento domiciliar no período noturno, proibição de viajar, frequentar alguns lugares e de ter contato com determinadas pessoas e suspensão do exercício de função pública ou de atividade econômica; e outro que cria a possibilidade de remição da pena pelo estudo, ou seja, que autoriza o desconto de horas estudadas do tempo de pena".

Fábio de Sá e Silva
Mestre em direito pela UnB, técnico de planejamento e pesquisa e chefe de gabinete da presidência do Ipea. Foi consultor da Unesco e do PNUD em projetos de melhoria do sistema prisional e da política pública de segurança.
Correio Braziliense,  Seg, 05 de Setembro de 2011.

Apesar das mudanças ocorridas no governo e no parlamento, a primeira sessão legislativa deste ano ficarará marcada por intensa atividade em matéria de política criminal e penitenciária. Dois projetos de lei aprovados no Congresso e, recentemente, sancionados pela presidente da República, merecem destaque: um que institui diversas medidas cautelares alternativas à prisão provisória, tais como pagamento de fiança, recolhimento domiciliar no período noturno, proibição de viajar, frequentar alguns lugares e de ter contato com determinadas pessoas e suspensão do exercício de função pública ou de atividade econômica; e outro que cria a possibilidade de remição da pena pelo estudo, ou seja, que autoriza o desconto de horas estudadas do tempo de pena.

Essas inovações retomam o sentido das reformas penais de 1984 e da própria Constituição Federal, distorcido pela legislação de emergência editada a partir da década de 1990. Trata-se, agora, como se tratava já no Código Penal e na Lei de Execução Penal, de estabelecer um pacto pelo qual: i) o Estado não deve oferecer o encarceramento como única resposta à violência e à criminalidade; e ii) nas várias respostas que oferece, mas especialmente no caso do encarceramento, o Estado deve trabalhar para a formação de novos e mais harmônicos vínculos entre os presos e a comunidade, contribuindo, assim, para a diminuição da reincidência e para a construção de uma sociedade mais segura.

Mas essas origens não podem ser resgatadas sem a devida crítica.
 

Um dos grandes equívocos dos reformadores dos anos 1980, típico da inspiração garantista que prevalecia à época, foi acreditar que o problema estaria resolvido com a edição de leis e o estabelecimento de direitos e garantias.

 
O tempo cuidou de mostrar que o sistema jurídico-penal funciona como uma espécie de tubo de pasta de dentes. Pode-se espremer uma das pontas com uma legislação progressista, mas o conteúdo escorre por outro lado, no qual discursos como o da "periculosidade do agente" e o da "ordem pública" são frequentemente mobilizados para reproduzir a exclusão e o retributivismo.

Quase três décadas depois, esses equívocos não podem ser mais repetidos. É imprescindível um esforço para a elaboração de políticas e programas que ofereçam aos operadores do sistema jurídico-penal o respaldo institucional de que necessitam para dar aplicabilidade às inovações legislativas. Sob indução e coordenação do Ministério da Justiça, estados e municípios devem formar sólidas redes de fiscalização, acompanhamento e monitoramento, no caso da lei que institui medidas cautelares alternativas à prisão provisória; bem como garantir a oferta de atividades educativas a condenados e condenadas mediante a extensão da rede pública de ensino a presídios e cadeias públicas, no caso da lei que institui a remição da pena pelo estudo. Pois, como disse Drummond, "(os) homens pedem carne. Fogo. Sapatos/ A lei não basta. Os lírios não nascem/ Da lei". 

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